Crítica: Garra de Ferro

Garra de Ferro (The Iron Claw) é um filme que pode te enganar, caso desconheça sobre a história real na qual é inspirado. O longa retrata a vida e trajetória da família Von Erich que, a princípio, faz o espectador acreditar que verá uma história de superação, determinação e força. Sim, há muitos desses elementos, no entanto, o público se depara com um retrato trágico que assola cada integrante, trazendo uma narrativa nua e crua, destrinchando qualidades e problemas em meio a vitórias e grandes derrotas dentro e fora do ringue. Um ótimo filme para assistir e se impactar.

Com direção e roteiro de Sean Durkin, Garra de Ferro acompanha a vida e carreira dos irmãos Von Erich, que fizeram sucesso no mundo da luta livre no início dos anos 1980. Ao longo do tempo, a família foi marcada por muitos triunfos no ringue que, consequentemente, trouxeram tragédias em uma espiral marcada por desafios, decepções, pressão, exigências, saúde mental e a ausência de uma rede de apoio mais forte por parte dos pais.

O filme inicia revelando que a história de amor e triunfo no universo da luta livre começou pelo patriarca Fritz Von Erich criando a ‘garra de ferro’ usado em seus oponentes, tornando-se marca registrada da família no ringue. Tal devoção e talento passou de pai aos filhos, mais especificamente para Kevin, David e Kerry, enquanto Mike tinha o sonho de seguir outra carreira.

A princípio, Garra de Ferro mostra uma história de esforço e dedicação total dos irmãos em busca de se tornar o melhor na luta livre, tendo o pai como um treinador dominador e controlador, que apenas enxergava o objetivo de tornar os filhos em grandes vencedores. Por um lado, isso soa positivo inicialmente, até vermos como tal pressão os levam para circunstâncias trágicas culminadas por uma saúde mental e emocional abalada.

As sequências de lutas no ringue são bem coreografadas e teatrais, desde a apresentação dos lutadores até os movimentos de cada golpe, o que soa engraçado e até falso, mesmo não sendo, afinal, tal esporte é realizado desta forma. E cada irmão Von Erich se dedica integralmente a dar o melhor de si, mas a pressão constante e a busca por vitória e o famoso cinturão desencadeiam uma sucessão de erros, conflitos e um destino infeliz.

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Seria mesmo uma maldição em torno do sobrenome da família, ou decisões, falhas e ausências que acarretaram nas tragédias que se sucederam? O público tem estas respostas a partir do desenvolvimento dos personagens e suas relações.

O ator Zac Efron está incrível no papel de Kevin Von Erich, segundo irmão mais velho da família (o primeiro é Jack Jr.) e o primeiro a acompanharmos sua trajetória no ringue. Para mim, de todos, ele é quem sofre mais pressão, mas também quem consegue bifurcar o caminho, focando na vida pessoal, além da profissional. Kevin constrói uma família ao lado de Pam (Lily James), seu grande pedestal que não o faz cair ou desistir quando testemunha todas as tragédias acometerem sua família.

Entre altos e baixos e focado em sua família ao lado da esposa, Kevin vai da escuridão à clareza com relação à luta livre, especialmente quando questiona as atitudes do pai sobre sua ausência, quando os irmãos mais necessitavam de uma figura paterna e não de um treinador sugador. Mas até aí, fora necessário Kevin viver anos marcados por dores e perdas.

Aliás, a atuação de Zac Efron está ótima, trazendo um lado cru de tantos impactos, culminando em uma dor dilacerante e solitária por se sentir incapaz de ter feito algo a mais para impedir o pior. A última cena dele assistindo aos filhos brincando no jardim é de partir o coração. Junto a ele, Lily James também entrega uma personagem de grande apoio emocional, especialmente nos momentos em que poderia jogar tudo para o alto.

Os irmãos David, Kerry e Mike ganham uma ótima intepretação dos atores Harris Dickinson, Jeremy Allen White e Stanley Simons. A química entre os quatro irmãos é de pura cumplicidade dentro e fora dos ringues, que faz o espectador se divertir e até dar risadas com as típicas cenas de irmãos sendo irmãos. Mas também, o espectador fica devastado com o que acontece com cada um deles.

Cada um tem um destino injusto, mas que, às vezes, a vida traça desta forma mesmo. No entanto, é possível pensar que uma intervenção e um olhar maternal e paternal poderia, talvez, ter impedido que alguns caminhos fossem feitos. À medida que a história é desenvolvida, fica claro que os irmãos Von Erich necessitavam de ajuda psicológica e uma rede de apoio emocional que, infelizmente, fora construída entre eles, cabendo apenas a Kevin segurar sozinho ao final.

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Em Garra de Ferro, dos quatro irmãos, o final mais injusto é o de Mike que seguiu o caminho da luta livre a contragosto, uma vez que seu talento e objetivos eram outros, o que o levou a uma tragédia que poderia ter sido revertida.

O ator Holt McCallany é Fritz, um pai que se dedicou totalmente a levar os filhos ao mundo da luta livre, dedicando a vida e o tempo a treiná-los e mostrar todo o talento e potencial no ringue. Mas ao longo da história, vemos a frieza do personagem em não ter um olhar mais terno, carecendo aos filhos de ter a figura do pai em momentos cruciais. É clara a falta de apoio emocional, o que culmina em uma saúde mental abaladíssima para todos.

A atriz Maura Tierney é a mãe Doris, uma personagem que o público já nota o cansaço e o seu limite, deixando de lado o seu papel e tornando-se completamente ausente em quase tudo, já que o pai é quem toma as rédeas. A cena em que Doris se recusa a conversar com Kevin, dizendo que tem os irmãos para isso, é chocantemente hilário, mas esta pequena cena diz muito sobre uma mãe apática, invisível e podada, em que as tragédias a colocam no fundo poço, saindo de lá quando finalmente se impõe. A cena final dela com Fritz é simples e curta, mas é um basta a tudo.

Com relação a figurinos e maquiagem, a caraterização de todos os personagens, especialmente dos irmãos, é ótima. Lembro que quando saíram fotos dos bastidores de Garra de Ferro, muitos implicaram com a imagem de Zac Efron por conta do porte físico e o corte de cabelo que, na verdade, fazia parte do look da época, mais precisamente dos lutadores.

******CONTÊM SPOILERS******

História real

Na história real, a família Von Erich é composta por seis irmãos, mas Garra de Ferro optou em apenas falar de cinco irmãos, na qual quatro são os maiores destaques. Segundo o diretor Sean Durkin, a ideia de excluir o irmão Chris Von Erich veio, pois o filme já estava com uma carga muito triste e pesada. E colocar mais um irmão, apenas acrescentaria mais uma tragédia que o filme não ia suportar.

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A história real mostra a família Von Erich, que ficou muito conhecida no ramo da luta livre nos EUA. Ao longo dos anos, o termo ‘maldição Von Erich’ virou destaque por conta de uma série de eventos que marcaram fortemente os integrantes.

Segundo o site Oxygen, o pai Fritz Von Erich foi o 1º membro da família a entrar na luta livre, construiu fama e prestígio e passou o amor ao esporte para os filhos.

Ele se casou com Doris e tiveram seis filhos: Jack Jr, Kevin, David, Kerry, Mike e Chris. Jack foi o primeiro filho Von Erich a morrer aos seis anos eletrocutado e afogado em uma poça em 1959.

David é o 3º filho e teve sucesso na carreira de lutador livre. Ele se casou com Candy e tiveram uma filha, que faleceu após o nascimento. Os dois se separaram e David casou-se novamente com Patricia.

David faleceu em 1984, aos 25 anos, em um hotel em Tóquio, Japão, em decorrência de uma enterite aguda, doença intestinal. Mas boatos chegaram a apontar que ele teria sofrido uma overdose de medicamentos.

Mike, o 5º filho, substituiu David no ringue. Ele tinha o sonho de seguir outra carreira, mas foi induzido a seguir os passos dos irmãos.

Em 1985, Mike lesionou o ombro e, durante a cirurgia, ele sofreu um choque tóxico, o que afetou seus movimentos e a fala.

Sem conseguir voltar ao ringue e com o fardo de substituir David, Mike é encontrado morto após sofrer uma overdose de medicamentos, em 1987, aos 23 anos.

Kerry, o 4º filho, tornou-se o maior lutador da família. Em 1986, ele sofreu um acidente de moto e teve o pé direito amputado. No entanto, ele nunca deixou que pessoas de fora da família soubessem sobre o seu pé, ganhando conhecimento do público depois de sua morte.

Kerry se casou, teve duas filhas e se divorciou. Depois de vencer e ganhar um campeonato intercontinental, ser preso, sofrer com a separação e o segredo da amputação, Kerry tirou a vida em 1993. A família encontrou o corpo debaixo de uma árvore do rancho onde os irmãos brincavam.

Em 1991, Chris tirou a vida aos 21 anos. A causa é um mistério, mas acredita-se que ele estava frustrado por não conseguir ter sucesso como lutador igual os irmãos.

O pai Fritz foi diagnosticado com câncer no cérebro e pulmão e faleceu em 1997.

Kevin é o 2º filho e o último irmão sobrevivente e um dos mais bem-sucedidos do mundo da luta livre.

Ele se casou com Pamela May e tiveram 4 filhos (2 meninos e 2 meninas) e 13 netos. Kevin se aposentou em 1995, com alguns retornos à luta em 2005 e 2017. Os filhos Ross e Marshall foram treinados pelo pai.

Kevin e Pam compraram um rancho no Texas para viver com toda a família.

Obviamente, há algumas mudanças na adaptação, como fato do David e Kerry não se casarem e terem filhos no filme. Já Kevin, no longa, teve dois meninos, com a esposa grávida do terceiro.

Considerações finais

A reta final de Garra de Ferro mostra o reencontro dos irmãos em outro plano, aliviados e em paz, uma cena extremamente linda e sensível na qual não se espera e se torna um ótimo acerto do filme. Enquanto isso, Kevin segue em frente ao lado da esposa e dos filhos e corta os últimos laços com o pai, não só deixando de falar com ele, como também vende a empresa que cuida dos lutadores de luta livre.

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Ao final, o filme traz informações sobre a história real, revelando o status de Kevin e toda a família Von Erich.

Garra de Ferro retrata uma história real nua e crua, com vitórias e derrotas, alegrias e dores, perdas e superação, triunfos e tragédias de uma família marcada para lutar no ringue chamado vida. O elenco é formidável com destaque para o quarteto de irmãos liderado pela incrível atuação de Zac Efron. Um excelente filme que vai impactar e devastar o espectador.