Christopher Nolan retorna aos cinemas em um filme grandioso. Oppenheimer é a nova aposta do diretor ao trazer um recorte histórico ao retratar a vida, carreira e passos importantíssimos da figura que ficou conhecida como o ‘pai da bomba atômica’.
É um longa que apresenta uma narrativa bem explicativa, cenários impecáveis e efeitos sem o uso do CGI, um elenco formidável cujas atuações são emolduradas por um texto excelente e uma edição de som que tornam a experiência sonora do espectador imersiva e intensa. É um filme belo, trágico, denso e tenso em seus ápices de reviravoltas. Tem muitos pontos positivos e outros a serem observados, mas, no geral, vale a pena assistir e vou te dizer o porquê.
Baseado no livro Prometeu Americano: O Triunfo e a Tragédia de J. Robert Oppenheimer, escrito por Kai Bird e Martin J. Sherwin, Oppenheimer é ambientado durante a Segunda Guerra Mundial e acompanha a vida e carreira do físico teórico da Universidade da Califórnia, que fora convidado a se tornar o diretor do Laboratório de Los Alamos para liderar o Projeto Manhattan ao lado de um grupo formado por outros cientistas renomados e autoridades do governo americano. A grande missão era projetar e construir as primeiras bombas atômicas dos Estados Unidos, arma nuclear responsável pelas tragédias nas cidades de Hiroshima e Nagasaki, no Japão, em 1945, afim de forçar a rendição japonesa no contexto da Segunda Guerra.
Este é apenas uma parte da premissa que é a base fundamental da narrativa de Oppenheimer. Assim, é importante que o espectador tenha um conhecimento básico sobre estes acontecimentos históricos, como a Segunda Guerra Mundial, Projeto Manhattan, Pearl Harbor, as tragédias de Hiroshima e Nagasaki e, é claro, saber quem é a figura responsável por criar a bomba atômica. Uma pesquisa no Google irá facilitar a compreensão entre filme e os fatos.
Oppenheimer tem 3 horas de duração, um tempo extenso, mas que, na minha opinião, não é sentido e nem cansativo pela forma como conjunto da obra funciona com maestria. Mas acredito que esta experiência será diferente para cada um, em que alguns vão sentir o tempo e se cansar em alguns momentos.
O primeiro ponto positivo é a narrativa que mesmo não sendo 100% linear, uma vez que a trama passeia entre passado e presente, a construção narrativa é contínua e menos trabalhosa para entender, se comparada à narrativa de Tenet. A compreensão ganha uma carga menos pesada, uma vez que o filme ganha muitos diálogos explicativos, justamente ao retratar de momentos históricos, enquanto os termos específicos em torno de tudo o que acontece e o que está por vir, afim de ser melhor absorvido, ganham explicações fáceis, mas não tão leigas. Acredito que o conhecimento básico do espectador juntamente à narrativa esmiuçada é a combinação ideal para entender o filme.
Sendo assim, o espectador acompanha a vida do físico Oppenheimer, desde os estudos e formação, o desenvolvimento da carreira passando por universidades renomadas nos EUA e a formação de sua família ao lado da esposa Kitty. Mas é nos bastidores que descobrimos outros pontos sobre a vida do protagonista, como relações extraconjugais e seus apoios e ideais dentro da política americana, na qual o comunismo era um dos grandes destaques mal vistos.
Juntamente à vida pessoal, ideais, pensamentos e dedicação à carreira, o público acompanha o protagonista se juntar ao governo dos EUA para liderar o Projeto Manhattan que desenvolveria a bomba atômica, desde as primeiras ideias, discussões, opiniões divergentes, testes, corrida contra o tempo até o fatídico teste comprovar o funcionamento de uma das armas mais perigosas do mundo.
Paralelamente, o espectador também acompanha o desenrolar de um ‘julgamento’ não oficial e interrogatório sobre o envolvimento de Oppenheimer na construção da bomba atômica e quem, possivelmente, estaria por trás de uma acusação misteriosa.
Ao acompanhar estes três paralelos narrativos que se conectam perfeitamente (sem ficar bagunçando), Oppenheimer consegue criar uma atmosfera de intensidade e tensão diante da explosão de reviravolta que acontece no terceiro ato, o que deixa o público angustiado em saber a verdade por trás de tudo.
Outro ponto excelente que emoldura a trama de Oppenheimer são as imagens abstratas que ilustram os pensamentos do protagonista diante de determinada situação, seja durante o interrogatório, como tal arma será usada, como irá refletir no mundo e, é claro, o resultado de toda a tragédia, cujo gatilho foi criado por ele mesmo.
Além disso, temos a aguardada cena do primeiro teste da bomba atômica, uma sequência magnífica e deslumbrante, que combina uma explosão futuramente catastrófica emoldurada em um silêncio temporário assim que o botão é apertado. O clarão deixa toda a tela do cinema em branco, causando aflição em meio a um vazio por não sabermos o que aconteceu, até o instante em que o público é surpreendido pelo som forte da explosão e o estrago em volta, recebendo aplausos de quem comemora o resultado de um extensivo trabalho, que viria se tornar mortal para milhares de pessoas.
E não, Christopher Nolan não usou CGI. A ideia era deixar esta técnica de lado e utilizar de metodologias do mundo real para produzir o efeito desejado ao representar a primeira explosão atômica. E deu certo.
Outra técnica que complementa os efeitos visuais e as ilustrações do imaginativo do protagonista é a edição de som que, sem dúvidas, é um trabalho primoroso em Oppenheimer que faz o espectador passar por uma experiência sonora surreal e muito boa. Tal imersão do som dá a sensação de que estamos dentro do filme e sentindo exatamente o que cada personagem está sentindo.
Personagens
Além da narrativa e dos elementos técnicos, o elenco e suas atuações deixam o filme ainda melhor. Aliás, digo que as relações entre os personagens são a chave principal da narrativa, em que conexões cruciais são construídas a fim de que a tensão pela descoberta da verdade seja sentida com força em torno de toda a história, que segue crescente constantemente.
Cillian Murphy está excelente no papel de Oppenheimer que firma seus conceitos, ideais e propósitos, defende o que acredita, está mais do que determinado em ir até o fim para a construção da arma nuclear, mesmo com divergências pairando sobre ele o tempo todo. Ao mesmo tempo, o protagonista mostra certo cinismo e desonestidade quando se trata da vida pessoal, balançando o casamento e a rotina familiar.
Junto a Murphy, outros dois grandes destaques são Emily Blunt e Robert Downey Jr. Blunt é Kitty, esposa de Oppenheimer, que demonstra cansaço e tédio na vida de mãe e dona de casa; apoia e defende o marido nas horas cruciais, ao mesmo tempo que mostra decepção e frustração diante das escolhas feitas por ele.
Downey Jr é Lewis Strauss, um forte aliado a Oppenheimer, cujas camadas deste personagem são excelentes, uma vez que não sabemos o que esperar exatamente dele. O ator está excelente neste papel que te deixará de queixo caído especialmente no terceiro ato do filme, o que deixa o público fascinado pela atuação e o personagem. Não darei mais detalhes, muito menos adentrar na questão de AME ou ODEIE tal personagem. Apenas assistam.
Crítica: Missão Impossível: Acerto de Contas – Parte 1
Oppenheimer surpreende pelo vasto e forte elenco com rostos bastante conhecidos que ora surgem em momentos específicos, ora discorrem juntamente com toda a trama, como Matt Damon, Jason Clarke, Kenneth Branagh, Josh Zuckerman, Dylan Arnold, Matthew Modine, David Dastmalchian, Dane DeHaan, Jack Quaid, entre outros. Aliás, tiro o chapéu para o ator Tom Conti que vive o gênio Albert Einstein e Rami Malek que abre a boca apenas uma vez em uma cena reveladora.
Outro ponto formidável é a maquiagem especialmente quando mostra os personagens no futuro, o que está deslumbrante. Se o filme concorrer às premiações, não ficarei surpresa se entrar em todas as categorias técnicas.
Agora, precisamos falar sobre a participação da atriz Florence Pugh, que interpreta Jean Tatlock. Como o seu papel entrega um spoiler do filme, não irei falar qual é. No entanto, a personagem aparece nua em quase todas as cenas que está (e são poucas), o que pode dividir opiniões.
Há uma cena cuja nudez da personagem é apropriada ao que está sendo retratado. Porém, será que havia necessidade em colocá-la nua nos outros momentos? Fica a dúvida. Não sei até que ponto a atriz sabia sobre tais cenas, e se para ela estava tudo bem. Talvez isso gere desconforto, ao mesmo tempo que Florence demonstra ser uma mulher segura e confortável em seu corpo, justamente por trazer uma imagem linda da mulher real.
Considerações finais
O terceiro ato até o final de Oppenheimer leva a atmosfera de tensão ao ápice, que deixa o espectador angustiado até o momento em que a verdade por trás do julgamento/interrogatório é revelada, criando uma fofoca explosiva sobre este mistério, em que o ‘exposed’ é a última explosão que encerra uma história triste e trágica no fim das contas.
Oppenheimer é um retrato grandioso de um recorte trágico da história da humanidade. Um filme belo, denso, intenso, angustiante e impactante desde a narrativa, atuações até a experiência sonora e visual proporcionadas. Um filme para ser comtemplado na maior tela do cinema, se for possível.
Ficha Técnica
Oppenheimer
Direção: Christopher Nolan
Elenco: Cillian Murphy, Robert Downey Jr, Emily Blunt, Florence Pugh, Matt Damon, Alden Ehrenreich, Jason Clarke, Kenneth Branagh, Rami Malek, Dane DeHaan, Tony Goldwyn, Kurt Koehler, James D’Arcy, Tom Conti, Matthias Schweighofer, Josh Hartnett, Alex Wolff, Josh Zuckerman, Michael Angarano, Dylan Arnold, Matthew Modine, Tom Jenkins, Casey Affleck, David Dastmalchian, Guy Burnet, Josh Peck, Gustaf Skarsgard, e Olivia Thirlby.
Duração: 3 horas
Nota: 4,5/5,0