Trainspotting é um filme de 1996, dirigido por Danny Boyle, com roteiro baseado no livro dramático escrito por Irvine Welsh, três anos antes. Situado na Escócia, o filme retrata o ‘boom’ da heroína na década de 80, mais precisamente contando a estória de cinco adolescentes, pelo olhar e ponto de vista de Renton, muito bem atuado por Ewan McGregor.
Com a película já frenética, é visível os cortes rápidos logo no começo do filme e, nos primeiros minutos, os personagens são apresentados e suas caricaturas, marcantes e chamativas, são logo postas em tela, tendo seus nomes sobrepostos diante da cena. A crítica social fica visível, embora não seja o foco da trama, também a possui (”escolha viver”, ”escolha um emprego”).
Tudo apresentado no filme possui um significado. A personalidade dos personagens é exteriorizada diante de um cenário caótico, sujo, anárquico e bagunçado. A fotografia tem cores vibrantes e a montagem e edição fazem jus à proposta, criando uma metalinguagem essencial ao filme (tendo também muitos diálogos sobre a cultura da época em filmes e bandas) como em cenas de uso de drogas, que são constantes (não fazendo o filme ser banal). Ao usarem heroína em certo momento, a câmera se torna lenta, mostrando Renton caindo no chão, dopado, uma analogia ao efeito da mesma, possivelmente, dando essa sensação dos personagens ao telespectador, como o desligamento das coisas, a lentidão e alienação do mundo a fora. Em outra cena e contexto, um dos personagens usa ‘Speed’, um componente químico que acelera o corpo de diversos modos e, com isso, o filme, novamente, nos transporta para a percepção que tal personagem esta tendo, como uma entrevista de emprego, em que ele fala desesperadamente e loucamente, em um conjunto de zooms de câmera (embora não bruscos) sem parar. Essa linguagem é constante em todos os aspectos.
Se o movimento de câmera (como esta) se encontra em criativos e diferentes lugares (plongée, contra plongée, ‘de nuca’, travelling etc) passa a ideia dos efeitos e percepções das personagens, a trilha sonora, psicodélica e agitada, nos transmite uma inquietação, às vezes, irritante (no bom sentido), como se escutássemos os pensamentos perturbados das personagens. Em uma cena em que Renton está passando mal na cama, uma batida constante acompanha suas alucinações, e isso causa um tremendo desconforto.
Dentro de tudo isso, utilizando um roteiro não extremamente complexo, mas muito bem construído, Trainspotting nos entrega uma ”viagem” (no duplo sentido mesmo), em que todos os atores são consistentes e possuem características próprias, apesar de serem um bando: o briguento malvado Begbie (Robert Carlyle) ‘quebra’ o ritmo do longa, uma cena que não passa de uma simples conversa de bar se transforma em algo absurdo e violento; o até então livre das drogas Tommy (Kevin McKidd); Sick Boy (Johnny Lee Miller), que nos doa umas doses de seus pensamentos confusos e filosóficos; Spud (Ewen Bremmer), o idiota, cômico e até um pouco inocente da estória; e o protagonista e citado Renton (Ewan McGregor).
Passando por várias vertentes, o filme nos faz rir e pensar, entrega momentos que achamos cômicos e outros absurdos e até chocantes, numa produção digna de um filme polêmico e que se tornou ”cult” (filme que não necessariamente arrecadou fama mas conseguiu ‘seguidores’/fãs assíduos), se tornando um clássico dos anos 80, viciando vários telespectadores diante de sua filmagem, história e construção.
Vince Gilligan pelo menos aprova (diretor de Breaking Bad), pois na mesma há uma referência, da qual Jesse usa a principal droga do longa metragem (heroína), e flutua sobre a cama (cena do tapete afundando no filme). Fora a cena da privada, que dispensa comentários, o filme vale a visualização de quem ainda não deu a chance.
Ficha Técnica
Trainspotting
Direção: Danny Boyle
Elenco: Ewan McGregor, Robert Carlyle, Ewen Bremmer, Jonny Lee Miller, Kevin McKidd, Kelly Macdonald, Shirley Henderson e Peter Mullan
Duração: 1h33min