Terror é um dos meus gêneros cinematográficos favoritos e o filme feito com qualidade te envolve do começo ao fim, mexe com o seu psicológico e faz você pensar naquela história por mais de uma semana. Sabe aquele medinho de ver o tal fantasma do filme no final do corredor do seu quarto? É assim que eu me sinto quando vejo um filme de terror bom!
Desta vez, o cinema brasileiro está investindo neste gênero e eu simplesmente estou adorando isso! Para abrir o ano de 2017, o cinema traz O Rastro, um filme com estilo terror tropical e psicológico que chega com ótima produção e boas interpretações. A trama se passa em um hospital decadente, cujo cenário traz momentos de tensão e medo. Prestes a ser fechado, João Rocha (Rafael Cardoso) fica com a responsabilidade de executar a transferência dos últimos pacientes da UTI, mas o desespero se instala com o sumiço da última paciente do hospital, a menina Júlia (Natalia Guedes). O médico inicia uma investigação que o leve até a garota, ao mesmo tempo em que precisa ajudar e cuidar de sua esposa grávida, Leila (Leandra Leal). Para buscar a verdade o mais rápido possível, João confronta os seus chefes, antigos colegas de trabalho como Olívia Coutinho (Claudia Abreu) e Heitor Almeida (Jonas Bloch), bate de frente com a burocracia do sistema público de saúde e descobre locais abandonados do hospital, repletos de escuridão e mistérios. A cada passo que João dá, ele fica mais perto da verdade, mas também mergulha ainda mais em um mundo obscuro em que não se sabe o que é real ou fruto de sua imaginação beirando à loucura.
Acerto na produção
Vamos falar de coisas boas? O grande acerto de O Rastro é sua produção que, na minha opinião, está muito bem feita. A locação, a iluminação (ou a falta dela), fotografia e a paleta de cores foram bem escolhidas e, todas elas juntas nas cenas trazem aquela harmonia perfeita ao terror. O hospital abandonado é um ótimo cenário e o público fica com medo de andar pelas alas hospitalares abandonadas. Não é qualquer um que teria coragem de caminhar por aqueles corredores escuros e imundos. Durante a coletiva de imprensa, o diretor J.C Feyer explicou que a produção fez questão de abusar da falta de iluminação para trazer mais obscuridade ao ambiente e acredito que essa escolha foi bem feita. O público irá se deparar com várias cenas escuras a ponto de não conseguir enxergar direito os rostos dos personagens, o que chega até incomodar. Aliás, outra coisa traz incômodo ao espectador é o som. O filme é recheado de barulhos e gritos, principalmente da menina Julia, que perturba e até irrita um pouco. Segundo o diretor, essa técnica foi usada propositalmente, mas, nesse quesito, acredito que cabe a cada um ver se isso vai perturbar de forma positiva ou negativa. Em alguns momentos achei isso bom, mas em outros me irritou bastante. Outra coisa que os espectadores podem perguntar é: “por que os personagens soam tanto?”. Sim, eu também fiz essa pergunta enquanto assistia ao filme e, na coletiva, o diretor contou que deixar os atores suados também foi algo proposital para aumentar o incômodo em que estiver assistindo, além trazer a tropicalidade ao filme, afinal a trama se passa no calor do Rio de Janeiro. Não é a toa que é chamado de “terror tropical”. Para dar o toque final à obscuridade, a paleta de cores caminha entre o azul, verde e preto trazendo um resultado positivo ao filme.
E o roteiro? É bom?
É aqui que o problema começa. Mas calma, nem tudo está perdido! O roteiro de O Rastro começa bem, não há monotonia e a história não se arrasta, pelo contrário, os acontecimentos são jogados na tela um atrás do outro para o público não perder o fio da meada. O primeiro e segundo atos imergem no terror fazendo o espectador comprar a loucura do protagonista e se perguntar: será que a história é real ou é tudo fruto de uma possível loucura do personagem? Há certo abuso de jump scares e até desnecessário em alguns momentos. Tudo caminha bem até o GRANDE PLOT TWIST DO FILME. A grande virada do filme é boa e achei muito ousada. Gosto quando a produção e o diretor arriscam e trazem essas viradas na história fazendo o público se assustar e dizer “nossa, não acredito que eles fizeram isso”. Tudo estaria bom se não fosse a justificativa para essa virada. Ao caminhar para temas como corrupção e falhas nos sistemas político e público de saúde, a justificativa para esse plot twist não se encaixa direito. Sabe quando a peça do quebra-cabeça não encaixa e, mesmo assim, você força para que ela fique no lugar? Foi isso que eu senti no momento em que me deparei com essa justificativa que, além de me desapontar um pouco, ela foge do gênero de todo aquele terror que vemos no começo do filme. Não posso falar o que acontece, pois seria um grande SPOILER e estragaria todo o filme, mas cabe a cada um tirar suas próprias conclusões a respeito dessa tal justificativa.
Personagens
Rafael Cardoso está muito bem na pele de João. Ele entrega um personagem intrigado e muito curioso para saber o que aconteceu com Julia. Por não desistir de buscar a verdade sobre o que se passa no hospital abandonado, o ator consegue mergulhar na loucura, fazendo a gente comprar essa ideia, por isso nos perguntamos até que ponto aquilo é real ou não. O que tira o tempero dessa loucura que aproveitamos é a tal da justificativa do plot twist.
Leandra Leal também está bem como Leila e o interessante é que a personagem fica de fora da situação do hospital quase que o tempo todo, ficando naquela posição de como ajudar sem saber exatamente o que fazer. Ela se preocupa com o estado psicológico do marido e teme que algo de ruim possa acontecer com ele. Mas é na virada do filme que a personagem entra em ação e coloca tudo em jogo. Não vou dizer mais do que isso para não dá spoiler. Assista e confira.
Claudia Abreu também está bem em seu papel, mas a personagem poderia ter ganhado um toque mais sombrio para aumentar ainda mais o mistério que rodeia o hospital. O nome da Olívia aparece muitas vezes em laudos e exames (quem for assistir vai entender), mas em alguns momentos isso fica meio que jogado na trama. Poderiam ter dado um pouco mais ênfase para esta personagem, colocando-a como uma espécie de obstáculo a mais para o protagonista enfrentar.
Considerações finais
A cena final até que surpreende e o desfecho da trama fica em aberto propositalmente para que cada espectador tire suas próprias conclusões e crie suas teorias a respeito de tudo o que viu no filme.
O Rastro pode ser considerado como bilhete de entrada do cinema brasileiro para o gênero terror. O filme tem ótima produção, iluminação, fotografia e boas interpretações. Mas é aquela coisa: a justificativa da virada do filme até a sua resolução pode dividir a opinião do público. Para mim, o filme começa bem e declina após o plot twist, deixando algumas coisas no ar. Mesmo com esses probleminhas, vale a pena assistir e dar uma chance a essa nova produção do cinema nacional.
E aí, o que acharam do filme? Deixem nos comentários!
Ficha Técnica
O Rastro
Direção: J.C Feyer
Elenco: Rafael Cardoso, Leandra Leal, Natalia Guedes, Claudia Abreu, Alice Wegmann, Felipe Camargo, Jonas Bloch, Érico Brás, Gustavo Novaes e Domingos Montagner.
Nota: 7,0