La Casa de Papel, a produção espanhola de grande sucesso da Netflix e que conquistou o coração de milhares de fãs finalmente chegou ao fim. O maior assalto que entrou para a história da televisão – mesmo com falhas, momentos previsíveis e convenientes – provou que é imperfeito sim, mas obteve o seu final excelente. Como toda série, La Casa de Papel teve os seus altos e baixos, assim como levantou dúvidas quanto ao seu retorno, voltando de cabeça erguida e finalizando a sua trama com sucesso que, muito em breve, o público verá o seu legado se estender com novas versões e spin-offs.
Razão vs Emoção
Se na parte anterior de La Casa de Papel a série entregou episódios movimentados pela emoção dos personagens que, consequentemente, mexeram com os sentimentos dos espectadores, a parte final, sem dúvida, teve a razão como prioridade neste enredo em que vemos toda ‘La Banda’ desviar dos contratempos com o coração controlado, por mais que a emoção estivesse sempre viva. O criador Aléx Pina já havia avisado que a reta final seria dividida desta forma e foi exatamente isso que aconteceu.
Os cinco episódios finais tinham a responsabilidade de encaixar as últimas peças deste jogo ilusório e cumpriu como o prometido, entregando ação e reação entre a gangue e as autoridades, raciocínios improvisados e rápidos em meio ao plano em execução levando em consideração os percalços durante o caminho, como perdas, alianças improváveis e funcionais, traições inesperadas e revertidas, trocas, segredos e homenagens que vão sensibilizar os fãs desta história.
Novos planos, guerra e despedida marcam a parte 5 da série
Tudo isso descrito é visto em uma nova leva de ótimas cenas de ação, perseguição, fuga na qual vemos a execução no presente enquanto toda a ação é contada ao público em flashbacks que permitiram matar as saudades de personagens queridos como Tóquio e Nairóbi. Agora é hora de seguir em frente e usar a cabeça para saírem vivos deste segundo assalto. Será que tudo deu certo?
Dupla improvável
Quem achou que Alicia Sierra poderia destruir os planos da gangue e dar a volta por cima, ficou surpreso com tal equívoco. Mas tudo bem se sentir enganado, pois a surpresa se torna gratificante ao ver ela e o Professor trabalhando juntos em que a química de polícia e ladrão é ótima, envolvente, sagaz e intimista cujos pequenos momentos validam a razão para a série ter formado esta dupla improvável e excelente. Quem diria que veríamos Alicia ajudando a executar os planos, quem dirá assistir o grupo retirar todo o ouro do banco? Todos os momentos desses dois personagens são ótimos, mas o ápice se encontra no instante em que a dupla se une para recuperar o ouro roubado pelo próprio sobrinho do Professor, um momento que faz o público sentir o impacto da traição e temer pelo pior, mas as reviravoltas fazem tudo se encaixar novamente graças a todos, especialmente a genialidade do líder.
Professor
Todos os personagens tiveram os seus momentos únicos e um bom destaque em La Casa de Papel, mas o Professor é o grande fio condutor de toda a série na qual teve um destaque triunfante nesta reta final. Impossível não sentir agonia, desespero e medo do que possa acontecer com o líder da gangue, assim como é impossível não se emocionar quando o roteiro dá espaço para mergulhar no lado intimista do personagem, resgatando memórias afetivas, lembranças dolorosas que alimentam uma ideia ilusória.
Confira a crítica da parte 4 de La Casa de Papel
Toda a ilusão do Professor foi (e ainda é) baseada em um sentimento transitório de pai para filhos. O personagem admite que o resgate do Rio foi apenas o gatilho perfeito para dar início a uma nova ilusão possivelmente narcisista, mas que se modificou em meio ao turbilhão de emoções, conceitos, visões e pensamentos que se modificaram ao longo do assalto. O roubo não era mais do Professor e, sim, de cada um que arriscou a pele para executá-lo. A prova está quando o líder se entrega às autoridades quando a gangue é pega em uma armadilha arquitetada pelos soldados sobreviventes (Sagasta e Archete), mas tal passo não é dado de forma passional, afinal, toda ação tem um plano por trás, e se você ainda não entendeu isso, talvez não tenha captado direito o estilo de La Casa de Papel.
O ator Álvaro Morte nos dá um xeque-mate no quesito atuação, uma vez que o público se sente completamente atraído ao charme inteligente do personagem que sabe esbanjar confiança e afeto, assim como também sabe dar a cartada certa, mesmo quando lhe falta cartas no baralho. Assim como os demais personagens (Alicia, Raquel e Tamayo), o próprio espectador se dispõe a confiar no Professor, mesmo com medo de que tudo possa dar errado e, acredite, isso fica prestes a se concretizar. Um fato é: não se pode negar que, entre altos e baixos, erros e acertos, o Professor é um dos melhores personagens desta série e o ponto final da sua história é contemplativo.
Mais flashbacks?
Outro ponto forte no roteiro desta nova leva de episódios de La Casa de Papel, desde de que o novo assalto começou, são os flashbacks com Berlim. Agora que sabemos que estas cenas não foram só para matar as saudades e, sim, para concretizar o já confirmado spin-off que teremos do personagem em 2023 na Netflix, fica o questionamento: realmente era necessário ter mais flashbacks nesta reta final da série?
Não era necessário, mas não se pode julgar antes de assistir todo o conteúdo e, no geral, juntando as últimas duas partes, as cenas do passado conseguiram se conectar com o presente, fazendo o público entender a origem de ambos os roubos e o significado de família para o Professor, Berlim e Rafael, uma vez que o “DNA ladrão” corre pelo sangue deste trio, movendo o ideal ilusório alimentado em cada um.
Além disso, o público se deparou com mais detalhes do plano do assalto que seriam aplicados no arco atual da narrativa, juntamente com o arco final de Berlim que, infelizmente, se vê traído pela esposa Tatiana e o filho Rafael. Caso não tenha percebido, esta traição já era prevista, uma vez que foi possível ver a química de madrasta e enteado no assalto realizado por Berlim na parte anterior de La Casa de Papel, mais precisamente na cena do barco. Lembram disso? A troca de olhares dos dois personagens gerou uma desconfiança que foi concretizada com o coração partido de Berlim que, consequentemente, usa da sua dor para engrenar de vez no plano do assalto ao lado do irmão. Se você reparar, as cenas se conectam formando um ciclo condizente ao que vimos desde o início.
Ladrão que rouba ladrão…
O ditado “Ladrão que rouba ladrão tem cem anos de perdão” nunca foi tão bem usado como em La Casa de Papel, trazendo uma reviravolta sarcástica, inesperada e que, possivelmente vai causar certa irritação e desgosto temporariamente, sentimentos aceitáveis enquanto estiver assistindo aos episódios finais.
Depois de roubar e extrair todo o ouro do Banco da Espanha, o Professor e o grupo veem uma luz no fim do túnel tendo como última missão retirar a gangue com vida do local. Mas nem tudo pode ser tão perfeito assim, não é mesmo? Eis que o grupo é preso pela suposta polícia, uma vez que o coronel Tamayo também está no percalço do ouro, o que faz o espectador acreditar que as autoridades finalmente conseguiram colocar as mãos no alvo.
Porém, o feitiço vira contra o feiticeiro, já que o Professor é roubado por Rafael e Tatiana que usam das mesmas artimanhas para fazer o personagem cair em suas próprias armadilhas. Mas aquele quem cria sabe como reagir diante do plagiador, certo?
Como disse, mesmo não sendo necessário, os flashbacks ajudam o espectador a compreender que a traição de Tatiana e Rafael rende ao ponto de estarem cientes de todo o plano do roubo para, assim, colocar o plano de ambos em prática enquanto tudo acontecia dentro do banco. Deu certo? Sim, mas iniciar uma guerra de genialidade com o Professor é dar um tiro no próprio pé. Além disso, Rafael também compreende o peso de sua família e todo o legado de Berlim, um ponto que reflete nas decisões finais deste personagem que culmina em um desfecho justo e satisfatório.
Roubo perfeito?
O último episódio de La Casa de Papel traz os momentos mais decisivos da série e os questionamentos mais acalorados: Professor será preso? Todos irão para a cadeia? Mais alguém vai morrer? Ou os sobreviventes sairão ilesos deste assalto?
O conflito entre Professor e o coronel Tamayo é denso e intenso que, de um lado, vemos um agir com genialidade, raciocínio e certa frieza enquanto, do outro lado, vemos a autoridade ser conduzida pela emoção acalorada e a impulsividade aflita.
Com o ouro roubado, o que será da economia espanhola? Apelando para o possível estado de falência do país, o Professor dá o ultimato nas autoridades em que, ora os dois lados ganham, ora os dois perdem. E perder renderá um valor muito alto a se pagar. A reta final dá angústia e medo, afinal, a gangue é capturada restando apenas a última cartada do Professor dar certo, o que ditará o final da série para sempre.
E qual é o final de assalto histórico? Mais uma vez, o Professor tem tudo arquitetado em sua mente com alguns planos deixados em segredo e colocados em jogo na hora certa, em que ele negocia com Tamayo e faz o coronel aceitar a leva de ouro falso para salvar a economia do país, tornando este o maior segredo de estado que ninguém poderá descobrir. Como desfecho, Tamayo decreta o fim do assalto e anuncia a “morte” de todos os integrantes da gangue, afinal, morto não pode falar, não é mesmo? Tal momento assusta Denver, que já havia sido preso, porém, a famosa dobradura vermelha dada ao personagem indica que é apenas mais um truque e tudo ficará bem.
Enquanto Professor e Tamayo encerram o assalto, Alicia encontra o esconderijo do ouro e negocia com Rafael e Tatiana, que aceitam a proposta honrando o legado que Berlim e o Professor construíram por anos.
Assim, sob escolta militar e proteção do governo, Professor, Lisboa, Denver, Rio, Estocolmo, Helsinki, Palermo, Bogotá, Marselha, Pamplona, Manilha e os demais participantes vão embora ilesos e em segurança. A despedida de Alicia e Professor também é um momento marcante, já que a dupla roubou a cena nesta temporada final.
La Casa de Papel encerra sua jornada com emoções afloradas em meio a ações bem arquitetadas sob o efeito da razão sóbria. Mais uma vez, temos um assalto imperfeito com um final contemplativo. La Casa de Papel deixa um legado forte na história da televisão e da Netflix abrindo portas para o seu universo que ganhará versões afora como já foi confirmado.
Se você nunca assistiu La Casa de Papel, aperte o play e dê uma chance para conhecer a melhor e mais fascinante história de assalto.
Ficha Técnica
La Casa de Papel – Parte 5 – vol. 2
Criador: Aléx Pina
Direção: Jesús Colmenar, Koldo Serra e Álex Rodrigo
Elenco: Álvaro Morte, Pedro Alonso, Najwa Nimri, Úrsula Corberó, Jaime Lorente, Alba Flores, Miguel Herran, Esther Acebo, Ituño Itziar, Darko Peric, Rodrigo de la Serna, Hovik Keuchkerian, Luka Peros, Henrique Arce, Kiti Mánver, Juan Fernández, Mario de la Rosa, José Manuel Poga, Fernando Cayo, Patrick Criado e José Manuel Seda.
Duração: 5 episódios (50 a 60min. aprox)
Nota: 9,0