Nos embalos das premiações, um dos filmes que vem chamando a atenção desde o final do ano passado é Lady Bird – A Hora de Voar. O longa mal apareceu e ganhou quase 100% de aprovação pela crítica estrangeira, o que aguçou bastante a minha curiosidade, afinal, qual é o tema e porque este nome? Agora que chegou ao Brasil e tive a oportunidade de conferir, posso dizer que Lady Bird é um filme bom, legal, divertido em algumas cenas, pontua bem as situações cotidianas nas quais podemos nos identificar rapidamente, mas não é tudo isso que eu esperava.
Dirigido por Greta Gerwig, o filme conta a história de Christine McPherson (Saoirse Ronan), uma adolescente que está no último ano do ensino médio e deseja loucamente ir para uma universidade longe de Sacramento, Califórnia, uma ideia firmemente rejeitada por sua mãe (Laurie Metcalf). Lady Bird, como a garota de forte personalidade exige ser chamada, não se dá por vencida e leva o plano de ir embora mesmo assim. Enquanto sua hora não chega, ela se divide entre as obrigações estudantis no colégio católico, o primeiro namoro, típicos rituais de passagem para a vida adulta e inúmeros desentendimentos com a mãe.
Antes de mais nada, tenho que reconhecer que o trabalho de Greta é singelo e bem verdadeiro, pois a diretora entra no quesito ‘coming of age’ para mostrar o crescimento e a transição que todos passam na adolescência: brigas constantes com familiares, o árduo trabalho de lidar com as responsabilidades escolares, o primeiro beijo, o primeiro amor, a primeira transa, as amizades verdadeiras, as primeiras e difíceis decisões a serem tomadas, qual profissão seguir, qual faculdade fazer e o que a vida reserva após o fim da jornada escolar. É impossível não se identificar com esses elementos que são desenvolvidos em uma rotina bem comum no filme, assim como é ou foi em nossas vidas. Quem nunca brigou com a mãe a ponto de não se falarem por dias? Quem nunca sentiu borboletas no estômago quando se apaixonou? Quem não ficou nervoso (ou nervosa) na primeira vez? Quem nunca ficou na dúvida (nem que seja por pouco tempo) na hora de escolher a faculdade ou a profissão que cursaria? Greta desliza naturalmente na jornada do adolescente/jovem adulto que faz você mergulhar de cabeça na história.
Mas, mesmo com boas pontuações, não há uma profundidade maior em cada um, exceto no relacionamento de Christine e a mãe e a decisão de ir embora da cidade. Há excelentes plots no filme que, infelizmente, não foram bem aproveitados, como é o caso de Danny (Lucas Hedges) e a difícil decisão que ele precisa tomar; e a primeira vez de Lady Bird, uma boa pauta, mas não tão aprofundada na história. Aliás, há a participação de Timothée Chalamet (Me Chame Pelo Seu Nome) na pele de Kyle, um personagem que nem é tão desenvolvido na trama e consegue ser mais chato que a protagonista, o que faz o espectador não ter o menor interesse por ele.
Saoirse Ronan encarna perfeitamente a típica adolescente chata, que não faz nada por merecer, não se esforça, não mede suas palavras, não liga para os problemas da casa e não reconhece o esforço que os pais fazem por ela e o irmão. Na escola, ela tem notas médias a baixas, uma boa amizade com Julie (Beanie Feldstein) que torna a protagonista mais verdadeira; e uma amizade forçada e “falsa” com Jenna (Odeya Rush), que eleva um lado fútil da personagem. Ao se aproximar da garota popular da escola, Christine demonstra vergonha de sua família, sua casa e sobre quem ela é a ponto de mentir sobre suas raízes.
Talvez, esse seja o ponto que tenha me incomodado um pouco. Eu sei que na adolescência, somos chatos (quase insuportáveis) e não damos tanto valor ao esforço dos nossos pais. Lady Bird ressalta muito bem isso, mas entra em contradição ao mostrar o desejo ardente da personagem em querer ir para uma ótima faculdade longe de casa. Além da chatice, Christine não se esforça para conseguir o que quer, apenas enche o saco do pai e da mãe para apoiá-la a estudar do outro lado do país. O espectador não a vê pegando um livro, estudando de verdade, sendo mais ativa nas atividades escolares (ela começa a fazer aulas de teatro e só), ajudando dentro de casa, se responsabilizando por tarefas mais construtivas. Ela até consegue um trabalho, mas, em muitos momentos, ela se coloca como vítima diante das situações, o que até a ajuda a dar seus primeiros passos para sua realização pessoal. Ela crítica o irmão diversas vezes – o que o faz mudar radical e positivamente – antes de se olhar no espelho. Talvez, a minha visão de hoje (uma mulher de quase 30 anos) critique mais essas atitudes. Talvez, se eu fosse adolescente, entenderia melhor essa personalidade forte da protagonista.
Quem consegue bater de frente e equilibrar Christine é sua mãe Marion que, por sinal, é muito bem interpretada por Laurie Metcalf (tá aí a razão dela ter sido indicada ao Oscar). Por também ter uma personalidade extremamente forte, as discussões e brigas entre mãe e filha são constantes, afiadas e até cômicas – uma vez que elas estão brigando e, repentinamente estão concordando em algo. Enquanto Christine sonha, a mãe mostra que a realidade é outra, que é preciso ter os pés nos chão e aceitar melhor as condições reais que vivem. Por mais que ela deseja o melhor para Lady Bird, a mãe sabe que será difícil pagar uma faculdade em outro estado. Aliás, diversas vezes, Marion joga na cara de Christine que a garota não faz por merecer o que tanto quer (o que é um ponto bem positivo na trama), gerando mais discussão entre as duas. Mesmo com tantas trocas de farpas, o amor entre mãe e filha está sempre presente em cada gesto, em cada frase, em cada palavra dita e não tem como dizer o contrário.
Considerações finais
A reta final mostra o destino reservado a Christine e, finalmente, a redenção da garota ao reconhecer o amor, o carinho e a dedicação dos pais, especialmente de sua mãe. Porém, o final termina abruptamente, sem um desfecho redondo ou um happy end como estamos acostumados. O filme apenas deixa aquela reticência de que muito mais ainda vai acontecer na vida da protagonista.
Lady Bird – A Hora de Voar é um filme legal por pontuar situações do cotidiano na qual muitos irão se identificar. No entanto, o longa não é tão pomposo como a nota dos críticos retrata, pois o roteiro pincela em boas situações, mas não as aprofunda direito, alguns personagens são bons e outros são bem chatinhos a ponto de você não se importar muito ou não simpatizar por eles. Até vale a pena assistir (quem sou para dizer o contrário), mas não crie tantas expectativas.
Ficha Técnica
Lady Bird – A Hora de Voar
Direção: Greta Gerwig
Elenco: Saoirse Ronan, Laurie Metcalf, Tracy Letts, Lucas Hedges, Timothée Chalamet, Beanie Feldstein, Odeya Rush, Stephen Henderson, Lois Smith e Jordan Rodrigues.
Duração: 1h34min
Nota: 7,0