Beasts Of No Nation é o primeiro e exclusivo filme da Netflix que chegou, simultaneamente, em seu serviço de streaming e, aos poucos, nos cinemas dos Estados Unidos no dia 18 de outubro de 2015. Vítima de boicote das grandes redes de distribuição de filmes, como Cinemark, AMC, Regal e Carmike, o longa ocupou apenas 31 salas de cinemas independentes nos estados norte-americanos, arrecadando um pouco mais de 50 mil dólares, ficando em 33º lugar, numa posição de 44 filmes lançados na semana.
Tal ação foi executada pelo fato dessas mesmas distribuidoras alegarem que é desleal o processo Netflix de distribuir, pois permitindo o telespectador assistir em streaming o mesmo filme numa mesma data de lançamento no cinema, tal recurso faria com que as salas se esvaziassem bruscamente. Mas o fato é que, tais salas de cinema não são comandadas por amantes deste, uma tristeza, neandertais que estão desesperados por não conseguirem inovar como a dita cuja que aqui comento.
Deixando a ‘novela’ de lado e voltando ao filme, Beasts of No Nation foi dirigido e escrito por Cary Joji Fukunaga, diretor que ficou conhecido por seu trabalho com a HBO em sua primeira temporada de True Detective. Toda a sua técnica e maestria está melhor no longa, também pelo fato da gloriosa Netflix permitir algo que muitos estúdios não permitem: liberdade criativa.
Baseado no livro (de mesmo nome) do autor nigeriano-americano Uzodinma Iweala (lançado em 2005), Beasts Of No Nation conta a história de Agu (Abraham Attah), que vive numa cidade africana que, aos poucos, vai sendo atingida por uma guerra. Após a morte do pai, por militantes, e a separação de sua família, Agu é obrigado a virar parte do conflito, tornando-se um soldado e tendo sua instrução vinda do Comandante (Idris Elba). Em seu primeiro ato, o filme nos apresenta Agu em toda a sua inocência e, em poucas cenas, já estamos totalmente nos importando com seu personagem que, ao progresso da obra, vai se desconstruindo.
Diante disso, uma característica a ser destacada é: não é um filme fácil. Ele é bom (e muito), mas pode se mostrar pesado para alguns. Sua violência não é apelativa e, sim, ‘necessária’, pois ela não está ali para chamar a atenção, como em muitos títulos, mas para contextualizar.
Outra coisa interessante que a película faz, sem dificuldade alguma, é expor os dois pontos de vista da guerra e não tomar partido em nenhum deles, ou seja, as interpretações de lados ‘’certos ou errados’’ (se é que há) fica a par de quem assiste. Não há lição de moral ou banalidades, é a violência nua e crua magnificamente exposta pela direção com câmeras em lugares poucos pensados e uma fotografia que expõe cores muito bem executadas para, praticamente, todas as cenas.
Com atuações que merecem palmas, Abraham Attah, apesar de ser mirim e estar em seu primeiro filme, mesmo com poucas falas, consegue se manter não ofuscado por Idris Elba, que está monstruoso. Se por um lado o pequeno tem feições marcantes, não necessitando sempre expor seus sentimentos para entendermos ele, Idris Elba nos entrega uma ambiguidade de personagem fantástica, com um trabalho de voz que reverbera em nossas mentes e nos instiga e seduz como seu personagem Comandante também seduz inocentes crianças a puxar gatilhos. Se está cansado de elogios, pare por aqui, pois todos merecem.
A trilha sonora, composta por Dan Romer, junto com a mixagem e montagem de som, aparece e toca em momentos oportunos, tornando toda aquela atmosfera criada mais pesada ainda.
Sobre a composição do filme em si, há cenas de se tirar o chapéu. Com uma câmera centralizada e nenhum pouco tremida, a fotografia (também de Cary Joji Fukunaga) como dita, nos expõe momentos de pura admiração, com intensidades de vermelho que narram uma cena violenta e ambientes escurecidos que ‘tornam literal’ a psique dos personagens. Resumindo: dê pause em qualquer um dos 133 minutos possíveis que você irá se deparar com um quadro em sua televisão.
Percorrendo entre a dramaticidade, ação e até doses de suspense e momentos de curtas risadas, Beasts Of No Nation nos entrega uma obra completa, magnífica e incrível em todas as suas características. A aposta do Oscar 2016 da Netflix.
Ficha Técnica
Beasts of No Nation
Direção: Cary Joji Fukunaga
Elenco: Idris Elba, Abraham Attah, Jude Akuwudike, Ama K. Abebrese e Richard Pepple
Duração: 2h16min
Nota: 9,5