O que você faria se soubesse que morreria no dia seguinte? O que faria se tivesse a opção de morrer sem sofrer? Estes são apenas as primeiras de muitas questões levantadas em A Última Noite (Silent Night), um suspense natalino ambientado em um apocalipse à vista, repleto de humor ácido que faz tanto o espectador quanto os personagens refletirem sobre vida e morte, ciência e política e a forma como as pessoas lidam com esses conceitos e uma aceitação frente à morte premeditada. É um filme que faz o público rir, analisar, debater, emocionar e surpreender com o desfecho desta trama.
Dirigido e roteirizado por Camille Griffin, A Última Noite acompanha personagens que estão prestes a vivenciar a destruição iminente de uma tempestade que se aproxima com a promessa de acabar com todas as formas de vida do planeta. Assim, o casal Nell e Simon reúne seus amigos mais próximos e filhos para celebrarem o Natal em sua propriedade no interior da Inglaterra. A noite tem alegria, presentes, bebidas e uma única certeza: não haverá amanhã.
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Tanto a premissa quanto o trailer instigam a curiosidade do espectador para dar o play nesta história de 1h32min que simplesmente passa voando, uma vez que a trama sabe prender a atenção com uma narrativa que ganha tons que oscilam entre humor ácido, drama e suspense em uma atmosfera pré-apocalíptica que desperta o interesse em saber mais sobre o que se trata.
A primeira parte de A Última Noite apresenta os personagens e estabelece uma dinâmica ácida, provocativa e intimista entre os amigos, seja pelas indiretas que cada um dá, os comentários que fazem com relação às respectivas namoradas que chegaram depois ao círculo desta amizade longínqua, os diálogos sinceros e, é claro, o fatídico momento em que algumas verdades são colocadas na mesa, afinal, mesmo sendo o fim do mundo, o Natal é o tradicional momento em que amigos e familiares não perdem a oportunidade de realizar uma boa discussão calorosa.
E por se tratar do último dia de vida para todos, o filme faz questão que os personagens não meçam as palavras mesmo que a intenção seja passar a última noite com alegria, felicidade e união. Assim, tanto os adultos quanto as crianças não perdem a oportunidade de falar palavrões e jogar pitadas de insultos naquela pessoa que ninguém gosta, como é o caso da Kitty (Davida McKenzie), ou na amiga cujo ‘jeitinho’ pode ser irritante, como é o caso de Sandra (Annabelle Walis). Todos aproveitam para colocar lenha na fogueira ou plantar a semente da discórdia, mesmo que involuntariamente, como é o caso de Bella (Lucy Punch), uma das minhas personagens favoritas do filme. Além disso, o espectador também acompanha a dinâmica entre casais e como as discussões crescem e refletem uns aos outros. Ou seja, além do apocalipse batendo na porta, o filme ainda faz questão de levantar as problemáticas de cada um não só para dar um gosto a mais na trama, como também para apresentar e analisar o comportamento humano e seus sentimentos diante da morte.
Todos os personagens ganham destaque, seja o casal Sandra e Tony (Rufus Jones) e como lidam com os problemas do relacionamento que batem de frente com a dupla James (Sope Dirisu) e Sophie (Lily-Rose Depp) que engatilham os primeiros questionamentos sobre o apocalipse e a forma como cada um está lidando com esta situação, especialmente com as crianças; Nell (Keira Knightley) e Simon (Matthew Goode) tentam apaziguar todo o calor do momento até o instante em que a verdade já não pode ser mais omitida, o que faz ambos terem atitudes radicais e sensíveis com os filhos e os demais; Já Bella e Alex (Kirby Howell-Baptiste) são mais aproveitadas individualmente do que em dupla, deixando até Alex mais de escanteio em alguns momentos, como se a personagem estivesse fora da sua zona de conforto e com reflexões solitárias sem poder dividir com certa liberdade o que, ao meu ver, o filme faz isso propositalmente.
À medida que as notícias aumentam e o apocalipse devasta várias regiões, o filme ganha uma boa transição em que a narrativa ganha mais seriedade, drama e momentos de tensão quando o jovem Art começa a questionar sobre o problema mundial e o fato de ter que tomar a fatídica pílula vermelha que fará todos morrerem sem sofrer com os efeitos colaterais do gás.
Sem dúvidas, o ator Roman Griffin Davis é o maior destaque do elenco e entrega uma ótima atuação ao apresentar um garotinho que questiona as decisões governamentais e científicas mediante a decisão dos pais de acatar a simples ideia de tomar uma pílula que, por sinal, não será para todos, uma vez que os menos favorecidos – socialmente e financeiramente – não têm o direito de receber o remédio. Por que as pessoas não cuidaram melhor do mundo? Por que deixaram chegar a este ponto? Por que alguns acreditam ser um ataque de outro país quando o apocalipse matará mundialmente? O que os cientistas disseram a respeito deste gás? É realmente mortal? Quais são os efeitos colaterais? Quem inventou a pílula e porque nem todos têm o direito de tomar, deixando-os sofrer mais uma vez diante de um fim premeditado? E se alguém sobreviver ao suposto fim do mundo?
Todas estas questões surgem dos diálogos entre os personagens que, naturalmente, saem do tom ácido e iniciam momentos de suspense quando é chegada a hora de ingerir a pílula. Art fica irredutível com tal decisão, especialmente ao saber que Sophie não tomará do remédio e há um motivo para isso, que só assistindo ao filme você descobrirá.
Crítica: Noite Passada em Soho
A reta final de A Última Noite ganha mais intensidade quando alguns pontos não saem como o planejado enquanto outras circunstâncias (até mesmo engraçadas) são colocadas a fim de aumentar a tensão tanto para realizar os últimos desejos quanto para ter uma despedida, no mínimo, decente. Assistir a chegada do apocalipse é impactante e o desfecho deste filme surpreende de tal forma que faz o público criar mais dúvidas diante de tudo o que viu. A última cena é simplesmente formidável e, até mesmo, cínica.
Considerações finais
A Última Noite entrega uma história sobre a chegada premeditada do apocalipse em uma narrativa que desenrola as expectativas finais do comportamento humano diante da morte, questionando as decisões políticas frente ao fim do mundo em um tom ácido, dramático e de suspense que transitam naturalmente na trama até chegar ao ótimo e irônico desfecho. Vale a pena assistir.
Ficha Técnica
A Última Noite
Direção: Camille Griffin
Elenco: Keira Knightley, Matthew Goode, Roman Griffin Davis, Annabelle Wallis, Lucy Punch, Lily-Rose Depp, Sope Dirisu, Kirby Howell-Baptiste, Rufus Jones, Davida McKenzie, Hardy Griffin Davis, Gilby Griffin Davis, Trudie Styler e Holly Aird.
Duração: 1h32min
Nota: 7,0