Cherry – Inocência Perdida é a nova produção do Apple TV+ baseado em uma história real sobre um rapaz que se perde após os traumas vividos em uma guerra. O filme é protagonizado por Tom Holland que, novamente, sai da sua zona de conforto e entrega uma atuação crua, tortuosa e dramática do auge até o declínio de seu personagem. Vale a pena conhecer esta história e vou te dizer o porquê. Confira a crítica em texto ou vídeo.
Com direção de Joe e Anthony Russo (Vingadores: Guerra Infinita e Ultimato) e baseado no romance autobiográfico de Nico Walker, que escreveu enquanto estava na prisão, Cherry – Inocência Perdida acompanha o protagonista desde a adolescência, época em que era estudante universitário, até tomar a decisão de se alistar no exército e lutar no Iraque, o que o leva ao caminho das drogas e do roubo.
O ponto alto do filme é a narrativa dividida em capítulos, como se o espectador estivesse lendo um livro. Cherry contêm seis partes, junto ao prólogo em que vemos uma cena do futuro, fazendo o filme voltar e contar como tudo aconteceu para chegarmos até aquele momento específico. Cada parte se refere a uma época da vida do protagonista – de 2002 a 2021 – e como as ações e consequências influenciam e desenham o destino do personagem e de quem está à sua volta.
Além disso, o filme é narrado pelo próprio protagonista que, em alguns momentos, utiliza a técnica da quebra da quarta parede para conversar e fazer comentários diretamente com o espectador, o que torna a trama interessante. Em contrapartida, um ponto que fica um pouco maçante é o uso da câmera lenta que, no início do filme, é utilizada em cenas para trazer mais intimidade e demonstrar certa atração física e sentimentalismo, no entanto, o excesso da técnica torna-se um pouco cansativo e até desnecessário.
O protagonista
Cherry – Inocência Perdida (a trama faz completo jus ao subtítulo do filme) acompanha as fases de Cherry desde estudante até viciado em drogas e ladrão. No primeiro momento temos um protagonista considerado fraco e inocente, tentando encontrar o caminho certo da sua vida. É na faculdade que ele conhece Emily, que se torna o seu grande amor e também peça-chave para suas grandes decisões que, um dia, mudaria radicalmente sua vida, mas não positivamente.
O filme faz questão de trabalhar bem a intimidade de Emily e Cherry a fim de que o espectador seja conquistado por este amor adolescente. Apesar de algumas decisões precipitadas, o público mergulha nessa atmosfera romântica, mas que logo é cortada por atitudes bruscas e mal pensadas, já que ambos acreditam que possam sair machucados dessa relação, mesmo sabendo que estão apaixonados.
Tom Holland e Ciara Bravo entregam uma química muito boa, que começa inocente e apaixonante, caminha para a selvageria e o egoísmo e termina em redenção, ainda com o sentimento vivo entre eles. Mas mesmo com todo o amor envolvido, não é suficiente para livrá-los da má influência e do caminho das drogas, levando-os a uma sucessão de conflitos e erros que beiram ao perigo.
Guerra
As consequências deste amor fazem Cherry tomar decisões que mudariam a sua vida para sempre, como se alistar ao exército depois do 11 de setembro e servir no Iraque. Esta segunda parte do filme é uma das minhas favoritas, que trazem uma grande produção e direção dos irmãos Russo. Nesta fase, o filme acompanha todo o processo de treinamento e o choque com a realidade que aguarda o personagem. Cherry serve ao exército como paramédico, colocando-se sempre no meio do confronto para prestar socorro, o que faz ele enxergar e vivenciar momentos catastróficos, horríveis e viscerais, desde bombas explodindo até colegas de guerra que perdem partes do corpo e a vida em um estalar de dedos.
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Tudo isso vai criando uma nuvem trágica e um ruído enlouquecedor na cabeça do protagonista, que vê a fome, destruição e a morte caminharem juntos. São cenas bem-feitas, impactantes e que vão resultar problemas ainda maiores ao personagem.
Essa transição entre a fase da guerra para o início do vício do personagem é importante, pois mostra como a sociedade não abraça e não oferece apoio e suporte suficientes aos que serviram à pátria, que sofreram traumas diante de tanta tragédia e catástrofe como a guerra no Iraque, refugiando em drogas e outros problemas para abafar todo o caos dentro da mente, como o próprio Cherry faz.
Inocência perdida
A terceira parte do filme é a maior, uma vez que a trama desenvolve todas as consequências da guerra em Cherry que, para fugir dos pesadelos, da ansiedade e das lembranças da carnificina que testemunhou, ele mergulha em um vício de opióides que o leva ao fundo do poço. Tom Holland entrega uma atuação genuína do seu personagem em completo declínio e ruína, vivendo um ciclo angustiante: para alimentar o vício, ele precisa de dinheiro, assim, ele começa a assaltar bancos a fim de ter grana apenas para as drogas.
A caracterização do ator é ótima e piora à medida que ele se afunda nessa espiral de vício, o que gera cenas cômicas como os assaltos junto com o amigo James (Forrest Goodluck) e o traficante (Jack Reynor) e cenas lamentáveis que faz o público pensar que o pior (a morte) vai chegar a qualquer momento. Esta terceira parte é bem desenvolvida, mas poderia ter sido um pouco mais enxuta se não fosse algumas barrigadas que o filme dá neste momento.
Redenção
Devo dizer que Cherry – Inocência Perdida trabalha bem a transformação do protagonista, porém a redenção não é tão aprofunda como o esperado. De fato, o filme relata a salvação do protagonista, que é encontrada na prisão, e algumas cenas citam o que o ajudou nessa caminhada de recuperação por anos. Já a redenção de Emily não é mostrada, mas o filme dá a entender que ela fica bem.
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Talvez, se o filme tivesse equilibrado melhor as duas últimas partes, teríamos a trama da redenção um pouco mais desenvolvida. É ruim o que foi mostrado? Não, mas dava para melhorar.
Considerações finais
Cherry – Inocência Perdida mostra o auge e o declínio do protagonista, que mergulha na guerra, encontra o refúgio nas drogas e nos assaltos e enxerga uma luz no fim do túnel para sua redenção. A intimidade entre os personagens é bem trabalhada e as cenas da guerra ganham uma ótima produção. Mas a cereja do bolo, sem dúvidas, é a atuação de Tom Holland que, novamente, entrega uma ótima performance fora da zona de conforto.
Ficha Técnica
Cherry – Inocência Perdida
Baseado no livro de Nico Walker
Direção: Joe e Anthony Russo
Elenco: Tom Holland, Ciara Bravo, Jack Reynor, Micahel Rispoli, Jeff Wahlberg, Forrest Goodluck, Michael Gandolfini, Suhail Dabbach, Daniel R. Hill e Fionn O’Shea.
Duração: 2h22min
Nota: 7,5