Infidelidade, paranoia, loucura e vingança são os elementos principais de Acrimônia (Acrimony), uma trama que instiga o público a prestar a atenção do começo ao fim, mas que apresenta ressalvas que, se fossem corrigidas, tornaria o filme melhor. Dirigido e roteirizado por Tyler Perry, a história é apresentada em uma narrativa não linear em que conhecemos os personagens em flashbacks até culminar ao ápice exagerado e divertido, mas que perde a energia por não explorar mais os pontos essenciais que lapidariam melhor a história.
No filme somos apresentados a Melinda (Taraji P. Henson), uma mulher raivosa, áspera, mal-humorada, rancorosa e repleta de sentimentos negativos. A princípio não sabemos a razão dela estar em um tribunal, muito menos a manter distância de duas pessoas, mas assim que ela inicia a sessão obrigatória de terapia, o espectador fica ciente do que realmente se passa com ela e em sua cabeça. Com um mistura de raiva e ressentimentos, Melinda revela que jogou anos de sua vida fora para cuidar da casa, especialmente do marido. Enquanto ela deixa de lado a sua própria vida e autoestima e passa a trabalhar em dois empregos a fim de sustentar a relação e não dar motivos para que sua família a critique por suas escolhas, Robert Gayle (Lyriq Bent) simplesmente foca em seu projeto (bateria sustentável) sem ao menos se importar em procurar um emprego ou, simplesmente, manter um casamento saudável e uma esposa feliz. Os anos se passam, e depois de ver muita luta e pouco resultado, Melinda tentar seguir em frente. No entanto, o que ela não esperava era ver o marido dar a volta por cima e ficar rico com o projeto e, para piorar, casar com a mulher com quem traiu na época da faculdade. Todos esses motivos são suficientes para tornar Melinda uma mulher ameaçadora, vingativa e irada, já que a vida perfeita que lhe foi prometida foi dada para outra.
Com uma mistura de Obsessiva (2009) e Paixão Obsessiva (2017) é possível compreender o tipo de trama que Acrimônia quer entregar que, por sinal, prende a atenção do público justamente por vender pontos de vista misteriosos e cheios de indícios dos dois personagens principais. No primeiro e segundo atos, acompanhamos toda a jornada da protagonista desde a faculdade, onde conheceu Robert e iniciou uma relação cheia de paixão e raiva. O público passa a enxergar pelo olhar traumático da personagem, que se dedicou de corpo e alma ao companheiro, mesmo sabendo que aquilo lhe fazia mal. No entanto, tal temperamento explosivo de Melinda faz o público questionar até que ponto ela está dizendo a verdade, uma vez que passamos a acompanhar a história por um olhar embaçado de Robert. Em nenhum momento, o filme escolhe quem está certo ou errado, cabendo ao próprio espectador analisar a situação, as atitudes e os fatos de cada um para saber quem tem culpa e quem não tem. De um lado, é possível se perguntar por que Melinda aguenta essa situação por tanto tempo. Será que o amor é tão forte a ponto de engolir os sapos e a falta de reconhecimento pelo que fez e ainda faz? Será que ela vive uma relação tóxica e abusiva? Será que não era hora de cortar esse laço e ser feliz sozinha?
No entanto, o filme nos apresenta outra vertente, uma que faz a gente questionar a saúde mental da personagem, dando crédito ao marido. Será que, no final das contas, ele errou, admitiu e jogou limpo, deixando-a partir (por livre e espontânea vontade) para seguir em frente? Será tudo isso é uma fantasia de Melinda? Ou será que em algum momento, ele realmente manipula seus sentimentos para atender aos seus interesses? Afinal, é bem fácil levar uma vida em que o cônjuge trabalha e sustenta tudo e todos, enquanto você somente foca naquilo que quer, sem ao menos enxergar as prioridades, muito menos para as vontades e os desejos da parceira. Pra piorar, ainda dá à outra pessoa tudo aquilo que havia prometido para a companheira, aumentando ainda mais o clima de ódio. Não vou negar: em muitos momentos, dei mais crédito às ações de Melinda do que de Robert.
O que faz Acrimônia perder um pouco o ritmo e a energia é que o roteiro foca em desenvolver todo o passado do casal, mas esquece em desenhar o momento presente, o instante em que Melinda está no auge da loucura, uma excelente oportunidade em detalhar uma trama psicológica, entregar uma performance insana de Taraji P. Henson e um desfecho surpreendente.
No fim das contas, Acrimônia entrega um final explosivo, dramático e bem exagerado, uma mistura de novela mexicana com terror. Chega a ser um pouco brega a última cena e pode ser que alguns ainda fiquem frustrados por não obterem certas respostas.
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Acrimônia não chega a ser um thriller, mas é um filme com mistério, exagero e insanidade que perde a energia por esquecer de explorar o presente, focando apenas no passado que, por sinal, poderia ser ter sido menor e mais direto. Taraji P. Henson até entrega um bom papel, mas o seu potencial é maior e poderia ter sido melhor trabalhado.
Sinceramente? O filme não é até divertido por ser um entretenimento que instiga bastante. Mas não assista esperando uma obra-prima, muito menos um thriller complexo e bem desenvolvido.
Ficha Técnica
Acrimônia
Direção e roteiro: Tyler Perry
Elenco: Taraji P. Henson, Lyriq Bent, Ajiona Alexus, Danielle Nicolet, Jazmyn Simon, Tika Sumpter, Jason Vail e Ptosha Storey.
Duração: 2h
Nota: 5,5