Uma das séries mais aguardadas de 2024 finalmente chegou na Netflix. Senna é a nova produção brasileira que retrata a história, de forma ficcional, do maior piloto brasileiro de Fórmula 1, tornando-se um grande ídolo do automobilismo mundial, especialmente ao brasileiro, que viu sua paixão pela corrida surgir quando Ayrton da Silva construiu sua jornada na pista.
Esta será uma das suas melhores maratonas de 2024 e vou te dizer os mais variados motivos.
Com seis episódios, a proposta da série era dar vida a história de Ayrton Senna nas telas. Fugindo dos tradicionais documentários, a ficção injeta os mais variados sentimentos ao espectador a cada episódio como sensibilidade, força, determinação, amor, paixão, amizades, rivalidades, foco, raiva, reconhecimento, persistência, dor e tempo.
A série não hesita em começar com o momento mais doloroso e impactante de todos: a morte de Ayrton Senna, o abalo que parou o Brasil e o resto do mundo no dia 01 de maio de 1994. Mas a vida de Senna não se resume a somente isso, e assim, a narrativa é rebobinada e o público é levado para 1964, quando tudo começou.
Cada episódio apresenta um recorte importante da vida de Ayrton da Silva, muito antes de se tornar Ayrton Senna: o amor à primeira vista pelo kart; a conquista ao entrar na competição da Fórmula Ford, que o engatou de vez, levando-o para a tão sonhada Fórmula 1; a ambição crescente e o extremo foco em se tornar o melhor piloto, passando por diversas equipes, atraídos pelo seu dom nato na pista; a conexão, apoio e o amor da família, algo fundamental para Ayrton sempre seguir em frente; os amores e como cada paixão marcou sua vida; a grande rivalidade de Senna com Alain Prost; brigas e discussões em busca de segurança aos pilotos na pista; a preocupação com o Brasil e a ideia de fazer algo para reduzir a pobreza generalizada de seu país; e a despedida que ninguém queria.

Mesmo com episódios longos (1 hora ou mais de duração), o espectador não sente o tempo passar, pois a narrativa prende a atenção por meio do sentimento e a vibração e torcida dá a sensação de que estamos assistindo a uma corrida de verdade, devido a tamanha veracidade e perfeição na execução destas cenas.
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Outro ponto positivo de grande excelente da minissérie é a construção das sequências automobilísticas, e não estou só falando das cenas em que vemos a corrida acontecer.
A câmera leva o público para o interior do carro junto ao protagonista, em que vemos os movimentos constantes e rápidos dos pés de Ayrton nos pedais; a mão firme no volante, repleta de curativos devido ao esforço extremo; o olhar do personagem, representando confiança e o longínquo foco na pista, ciente de cada curva, reta e qual movimento será necessário a se fazer para se tornar o mais rápido e, consequentemente, o melhor.
E isso é emoldurado pela excelente edição de som que faz o público imergir nestas cenas, como o rugido inconfundível dos motores de F1 dos anos 80 e 90, e o rugido do motor do carro de Senna, que era único. É impossível não ficar hipnotizado com estes momentos e a série executa isso com perfeição.
Quem é Ayrton Senna?

Quem é Ayrton Senna? Uma pergunta complexa a ser respondida. A série traz na tela toda a verdade possível sobre o piloto, mas ainda assim, há detalhes que, talvez, nunca saibamos.
Acompanhamos as versões de um garotinho apaixonado por kart; um jovem disposto a mergulhar no universo das corridas e iniciar a realização de seu grande sonho; um piloto ambicioso e determinado a se tornar no melhor na profissão que escolheu; fragilidades e sentimentos que, às vezes, escorriam para todos verem; um filho amado que sempre teve o apoio da família; um homem apaixonado que viveu amores que marcaram sua vida de alguma forma; um Ayrton decidido a realizar as mudanças necessárias para tornar o universo automobilístico mais seguro aos pilotos; um brasileiro que deseja fazer algo para tornar as condições de seu país melhores.

O espectador acompanha cada faceta de Ayrton Senna graças a atuação magistral de Gabriel Leone, que caiu como luva para este protagonismo. As expressões, os gestos e trejeitos são realizados com respeito, sensibilidade e carinho, desde um Ayrton filho, amigo, irmão, tio, marido, namorado, piloto, rival e ídolo número. Isso sem falar na caracterização que deixa o ator o mais parecido possível com o Senna. É impossível não se apaixonar por Leone nesta minissérie e não tirar os olhos dele por um minuto.
Aliás, o que mais surpreende é a forma como o ator consegue levar o público para dento da mente de seu personagem, especialmente quando está correndo. A cena em que ele explica a forma como se sente quando está pista e como seu foco muda, o levando para outra dimensão, é o exemplo que faz a gente entender a razão para se tornar no ‘Rei de Mônaco’, ‘Chefe’, ‘Rei da Chuva’ e, é claro, ‘Beco’ para os mais íntimos.
Ayrton Senna é um homem completo na pista, mas para se tornar completo e chegar aonde chegou, ele recebeu o maior amor e apoio que alguém poderia de receber: a família. E a série faz questão de abordar esta conexão singela e natural, que faz o espectador se emocionar com tal conectividade.

Marco Ricca é o pai Maurão, quem incentivou o sonho do filho desde o kart, mas com a promessa de que ele voltaria para trabalhar ao seu lado. No entanto, ele já sabia que o talento de Ayrton era na pista.
Assim como o pai, a mãe Zaza (Susana Ribeiro), os irmãos Viviane (Camila Márdila) e Leonardo (Nicolas Cruz) também deram este apoio e todo o amor para que Ayrton sempre seguisse em frente, desde as luvas costuradas pela mãe; as visitas na Europa para não se sentisse sozinho; os conselhos para tomar as melhores decisões sobre o próximo passo na carreira, entre outras coisas. Não dá para negar, a família Senna foi fundamental para que ele pudesse se tornar na figura única e mundial, como se tornou.
E quando vemos Ayrton Senna sendo uma grande referência no mundo automobilístico, tal apoio e carinho se amplia aos amigos de infância, companheiros de equipe e corrida, imprensa e, é claro, a vasta torcida dos brasileiros, o maior carinho que alguém já recebeu.
Rivalidades na pista

Outro ponto genial de acompanhar na série Senna são as rivalidades que, consequentemente, expõe as vulnerabilidades de Ayrton, que não fechava os olhos ao ver os erros, negligências e injustiças.
Ayrton teve uma profunda e crescente jornada como piloto, passando por grandes equipes de Fórmula 1 como a Toleman, Lotus, McLaren e Williams. E em todos, ele deixou a sua excelente marca de melhor piloto, até alavancando a própria equipe, seja nas referências, benefícios e qualidade técnicas dos carros. Ayrton não ficava somente atrás do volante, muito pelo contrário, ele atuava nos bastidores, especialmente no quesito em ter o melhor carro para o melhor piloto.
Além disso, a série faz questão de retratar a maior rivalidade já vista, adorada, odiada e repleta de torcida que a história do automobilismo já teve: Ayrton Senna e Alain Prost (Matt Mella). O espectador sente um mix de sentimentos entre raiva, deboche, indignação e a contemplação de ver os dois em uma disputa acirrada na pista, com os carros paralelamente colados, criando a expectativa sobre quem vai passar na frente.

Tal rivalidade, além de outros problemas pelos bastidores e os comandantes que ditam as regras da Fórmula 1 são guiados pela imprensa, cujo protagonismo fica para Kaya Scodelario no papel da jornalista Laura Harrison, uma personagem ficcional e muito bem desenvolvida na história. É ela quem escreve sobre a jornada de Senna, bate de frente, vai atrás de informações e furos, erra, acerta. Sua presença é constante e marcante. Mais do que uma jornalista, Laura também é torcedora e não nega a sua fascinação pelo talento de Ayrton Senna, tornando-se também sua torcedora.
Senna também traz outras figuras importantes que fizeram parte da vida e carreira de Ayrton Senna: Ron Dennis da McLaren (Patrick Kennedy); Jean-Marie Balestre (Arnaud Viad), presidente da Fia, quem Ayrton batia de frente; Frank Williams da Williams (Steven Mackintosh), o último a trabalhar com Senna; Sid Watkins (Tom Mannion), médico-chefe da Fórmula 1, quem atendeu Ayrton no fatídico dia do acidente; o fotógrafo Keith Sutton (Joe Hurst); Peter War (Richard Clothier), o primeiro a dar a oportunidade à Senna na Fórmula Ford; os pilotos Nikki Lauda (Johannes Heinrichs), Nelson Piquet (Hugo Bonemer), Rubens Barrichello (João Mestri) e Roland Ratzenberger (Lucca Messer); e o icônico narrador Galvão Bueno (Gabriel Loucchard).
Os amores de Senna

Os três grandes amores de Ayrton Senna também são retratados na série. Lilian Vasconcellos (Alice Wegmann), foi o seu primeiro amor. Amigos desde a infância, Lilian aceita ir com Ayrton para Inglaterra, selando o relacionamento ainda jovens em um matrimônio. Após um ano morando na Europa, o público nota o apoio e a torcida de Lilian pelo marido, ao mesmo tempo em que se torna desgostosa pelo local e longe de realizar os seus próprios sonhos.
Infelizmente o amor não conseguiu superar os objetivos, as expectativas e prioridades de cada um, fazendo ambos seguirem os seus próprios caminhos. A série dá a entender que Ayrton ficou magoado com o término de seu casamento. Mas na vida real, a verdadeira Lilian já revelou que foi ela quem terminou, colocando a carreira como o seu primeiro amor. E isso a deixou deprimida, mesmo ciente de que tal decisão era certa a se seguir.

Anos depois, já no ápice do sucesso e se destrinchando nas pistas de corrida, Ayrton Senna começa a namorar Xuxa (Pâmela Tomé), que também estava no auge da carreira como a ‘Rainha dos Baixinhos’. Aqui, a série também retrata uma paixão tórrida de ambos os lados, pois os dois se encontravam apaixonados, mas suas profissões não permitiram que esse amor continuasse.

Por fim, a série deixa apenas para o último episódio, o último amor de Ayrton Senna com Adriane Galisteu (Julia Foti). Infelizmente, há apenas uma cena dos dois juntos e duas outras com eles conversando ao telefone, em que ele promete ir vê-la ao final da corrida em Ímola; e a cena de Adriane assistindo ao trágico acidente de Senna.
E sim, esta redução da participação da personagem na série se deve ao fato da polêmica da família Senna com a Adriane Galisteu. Como o buraco é mais embaixo, é melhor para por aqui. Pelo menos, dá para entender o motivo de Adriane aparecer tão pouco na série.
A dor, o luto e o tempo

O último episódio de Senna não é uma surpresa para ninguém e, ainda assim, a emoção bate forte no espectador ao relembrar o dia 01 de maio de 1994. O público acompanha dias antes e o atual momento da corrida de San Marino, no circuito de Ímola, na Itália, em que vemos um olhar distante e reflexivo de Ayrton, além das discussões sobre a falta de segurança aos pilotos na pista, seguido pelos acidentes de Barrichello e Ratzenberger, que o levou a morte, assustando a todos, mas não impedindo a corrida de continuar.
E assim, temos o acidente, o anúncio da morte que abalou o Brasil e o mundo e a comovente despedida de Ayrton Senna, encerrando a série com imagens reais de Senna, além de uma mensagem linda sobre seguir os seus objetivos e sonhos com amor, garra e determinação.
Pois esta é uma das maiores inspirações que Ayrton Senna deixa em seu legado, e a série desenha cada detalhe com transparência e fervor, tornando-se uma injeção de perseverança ao público que conheceu o maior piloto de Fórmula 1 ou vai conhecer a partir desta produção.
Considerações finais
Senna é mais uma excelente produção que marca o audiovisual brasileiro em 2024. Tudo é impecável, mas o que realmente marca é a emoção de assistir a história de alguém que soube deixar sua marca registrada de forma magistral, única e irreverente. O tempo passa, mas a saudade será para sempre.
Ficha Técnica
Senna
Direção geral e showrunner: Vicente Amorim
Direção: Julia Rezende
Roteiro: Álvaro Campos, Gustavo Bragança, Rafael Spínola, Thais Falcão e Álvaro Mamute
Elenco: Gabriel Leone, Alice Wegmann, Camila Márdila, Christian, Gabriel Louchard, Hugo Bonemer, Julia Foti, Marco Ricca, Nicolas Cruz, Rodrigo Veloso, Susana Ribeiro Pâmela Tomé, Matt Mella, Kaya Scodelario, Arnaud Viard, Patrick Kennedy, Joe Hurst, Johannes Heinrichs, Keisuke Hoashi, Leon Ockenden, Richard Clothier, Steven Mackintosh, Tom Mannion, João Mestri e Lucca Messer.
Duração: 6 episódios (60 minutos aprox.)
Nota: 4,5/5,0