Os bastidores da maior investigação contra a corrupção e lavagem de dinheiro da história do Brasil, a Operação Lava Jato, ganha sua versão cinematográfica dirigida por Marcelo Antunez e produzida por Tomislav Blazic. Inspirado no livro homônimo de Carlos Graieb e Ana Maria Santos, a trama desenvolve o passo a passo da investigação e os esforços para conectar quem está por dentro e desvendar o esquema e desvios para o pagamento de propina para executivos de uma estatal de petróleo, empreiteiras, partidos políticos e parlamentares. Além disso, o filme também traz o papel decisivo da justiça para que a investigação não fosse destruída pelas forças políticas envolvidas.
Antes de dar início à crítica, gostaria de deixar bem claro que falarei APENAS do filme, da parte técnica e as semelhanças com o caso real. NÃO irei debater quem é a favor ou não da Operação, quem acha isso justo ou não, quem é de direita ou de esquerda. Este texto será meramente voltado para o longa. OK? Tomo essa decisão justamente em respeito às distintas opiniões.
Polícia Federal – A Lei É Para Todos é a primeira parte que mostra o início da investigação desde a polícia apreendendo o caminhão com palmitos cheio de drogas até o interrogatório do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Baseado na história real na qual estamos acompanhando, a trama apresenta os seguintes pontos semelhantes ao que já se passou na Operação Lava Jato: Apreensão do caminhão com carga de palmitos recheados de cocaína; A prisão do doleiro Alberto Youssef; O mandato de prisão do ex-diretor de Abastecimento da Petrobrás, Paulo Roberto Costa; Busca na mansão e ordem de prisão para Marcelo Odebrecht; Presença do famoso japonês da Federal, interpretado por um ator muito parecido; Uma pequena passagem sobre a reeleição da ex-presidente Dilma Rousseff em 2014; A condução coercitiva do ex-presidente Lula, sua nomeação para o cargo de ministro da Casa Civil na época do governo da ex-presidente Dilma Rousseff e o famoso áudio que cita “Bessias”.
De um modo geral, o filme é bom justamente para aqueles que não acompanham com afinco a Operação Lava Jato na televisão ou em qualquer outra mídia. O diretor se preocupa em aplicar uma narrativa em off que explica o passo a passo de cada fase da operação, narrado pelo ator Antonio Calloni, além de mostrar os personagens sempre dialogando e escrevendo item por item, pista por pista sobre a investigação. Achei a ideia boa e bem aplicada no filme, mas para quem está completamente ciente da situação e já sabe tudo o que se passou até agora na Lava Jato, talvez a narração torne-se repetitiva e não atinja esses espectadores como é o esperado. No entanto, por se tratar de um público amplo, a narrativa é bastante cabível aqui.
Na minha visão, o filme mostrando tanto o lado da polícia, mas também a dos manifestantes questionando a operação e a investigação. Mesmo assim, é possível que muitos também achem que o filme seja parcial, retratando apenas um lado. Isso vai da visão de cada um. Durante a coletiva de imprensa, que aconteceu em São Paulo, o diretor Marcelo Antunez explicou que a ideia do longa é apresentar os fatos reais em forma de arte para promover um debate saudável entre as pessoas. “No filme, tentamos mostrar os dois lados: a imprensa a favor das prisões e da operação; e a imprensa que questiona e defende os que estão sendo investigados”.
Deixando de lado a parte política, o filme apresenta boas cenas de ação, como perseguições entre corredores, escadarias e elevadores, além da famosa perseguição de carro. Além disso, o filme acerta ao apresentar as locações originais nas cenas, como a sede de corporação em Curitiba e o Salão Presidencial anexado ao Aeroporto de Congonhas, local onde Lula foi levado para ser escutado pela policia.
Há heróis e vilões na história?
Outro ponto importante a ser discutido aqui é se há heróis ou vilões. Em Polícia Federal – A Lei É Para Todos o diretor deixa claro que essa divisão não existe, mas como o público é amplo e as opiniões são divergentes, alguns vão achar que há heróis e vilões, enquanto outros não. Na minha opinião, em nenhum momento enxerguei os personagens como os típicos heróis dos quadrinhos; eu enxerguei a realidade dos bastidores da operação e tentei levar essa visão até a última cena. Mas, repito: isso vai de cada espectador e como sua posição política irá influenciar enquanto estiver assistindo ao filme.
A trama apresenta os personagens representando tanto as verdadeiras figuras da investigação e quanto do lado investigado. No entanto, o diretor optou em dar outros nomes para a polícia e permanecer os verdadeiros nomes dos investigados. Na coletiva de imprensa, os atores explicaram como foi o trabalho de pesquisa para interpretar os seus personagens. “Nós fomos até Curitiba conhecer aqueles que estão por trás da investigação com o intuito de humanizá-los no filme. Eu tentei não só interpretar uma, mas representar todas as delegadas que fazem parte da Operação Lava Jato”, comentou a atriz Flávia Alessandra.
“O contato com a polícia e os operantes da Lava Jato nos mostrou que eles são apenas pessoas comuns, que também erram e que estão a serviço da lei”, disse o ator Bruce Gomlevsky.
“Durante a pesquisa, nenhum deles tentou mostrar uma verdade absoluta. Várias vezes eu provoquei bastante para extrair o máximo de informações e, mesmo assim, a pessoa quem eu representei no filme não demonstrou uma posição autoritária, pelo contrário, ela utilizou um tom criterioso, assim como toda a equipe”, explicou o ator Antonio Calloni.
Afinal, quem é quem em Polícia Federal – A Lei É Para Todos? Flávia Alessandra é Bia, personagem inspirada na delegada Érika Marena; Antonio Calloni é Ivan, coordenador da Lava Jato, inspirado no delegado Igor de Paula; e Rainer Cadete interpreta Ítalo, que representa o procurador Deltan Dallagnol. Outros, como o personagem Júlio Cesar, interpretador por Bruce Gomlevsky foi criado não só para reforçar a trama, mas também para trazer mais humanização à história e conflitos dramáticos, como nas cenas em que Júlio se preocupa com o estado de saúde de sua mãe e discute a investigação com o seu pai.
Talvez o personagem mais esperado seja o de Sérgio Moro que, por sinal, é bem interpretado pelo ator Marcelo Serrado, que traz traços físicos e de personalidade bastante semelhantes ao juiz. No entanto, por se tratar do início da investigação, não espere várias cenas com esse personagem. Sérgio Moro apenas dá pinceladas de participação especial na investigação, além de mostrar como é o seu dia a dia em casa com o seu filho e sua esposa e o seu trabalho como professor em uma universidade. Talvez ele ganhe um espaço maior no próximo filme. Vamos aguardar.
Já Ary Fontoura interpreta Luiz Inácio Lula da Silva. O que mais chama atenção não é nem sua semelhança com o ex-presidente (até porque não tem), mas a entonação que ele dá ao representá-lo no filme, especialmente na cena em que ele conversa com a polícia.
Considerações finais
Polícia Federal – A Lei É Para Todos retrata o início da Operação Lava Jato que começa com a apreensão de um caminhão de palmitos e ganha uma dimensão que jamais premeditada. O filme apresenta uma narrativa explicativa que será boa para aqueles que não acompanham as notícias regularmente pela mídia, e repetitiva e cansativa para aqueles que já estão por dentro do assunto. As cenas de ação são boas e os personagens estão bem interpretados no filme. Por atingir um público amplo, o filme trará várias opiniões divergentes, mas a ideia é que essa discussão seja saudável para todos. O final fica em aberto para a continuação, que deve chegar aos cinemas em breve.
PS: Não saia correndo do cinema, pois há uma cena pós-crédito.
Ficha Técnica
Polícia Federal – A Lei É Para Todos
Direção: Marcelo Antunez
Elenco: Antonio Calloni, Flávia Alessandra, Bruce Gomlevsky, Rainer Cadete, João Baldasserini, Marcelo Serrado, Ary Fontoura, Roberto Birindelli, Leonardo Franco, Adélio Lima, Samuel Toledo, Sandra Coverloni, Laura Proença, Juliana Schalch, Roney Facchini e Leonardo Medeiros.
Nota: 7,5