Heartstopper é a nova série da Netflix que chega para aquecer os corações com um romance entre dois jovens que descobrem o passo a passo sobre a construção do amor, em uma narrativa simples e sem rodeios que não deixa também de discutir temáticas importantes em meio a ambientação escolar e as amizades que moldam esta história que dosa bem o drama com pitadas de comédia. É uma maratona leve e sensível para fazer. Vale a pena assistir e vou te dizer o porquê.
Com apenas oito episódios, Heartstopper é uma adaptação das HQ’s da autora Alice Oseman e, de antemão, já aviso que não li os livros, por isso não farei comparações. No entanto, pela minha experiência, posso dizer que é possível entender e apreciar a produção da Netflix sem ter conhecimento da obra original, o que faz o espectador criar a curiosidade de ler os quadrinhos para se aprofundar ainda mais na trama, o que já é um ponto positivo para a série.
Outro ponto considerável de Heartstopper é a entrega de uma temporada curta, com apenas oito episódios de até 30 minutos, o que rende uma maratona rápida e gostosa de se fazer em um único dia, na qual o público não sente o tempo passar. E nestes poucos episódios, nota-se uma narrativa direta ao ponto, seja no desenvolvimento dos personagens individualmente, a conexão e construção do amor entre os protagonistas, a dinâmica fluída e divertida com os personagens coadjuvantes, além da discussão de temáticas de acordo com a atmosfera da trama que soa leve sem diminuir o peso de sua importância dentro deste cenário.
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Dito tudo isso, Heartstopper não te conquista por um roteiro complexo ou um desenvolvimento que “explode cabeças” e, sim, pelos personagens e a sensibilidade em criar suas conexões, especialmente pela fase da juventude em que todos os sentimentos são vividos com intensidade.
Além disso, a série acerta ao explorar cada personalidade tanto individualmente quanto em dupla ou grupo, o que deixa a história ainda melhor. Nesta trama conhecemos Charlie Spring e Nick Nelson, dois garotos que não têm quase nada em comum. Charlie é um aluno dedicado e bastante inseguro por conta do bullying que sofre no colégio desde que se assumiu gay. Já Nick é popular e querido por ser um ótimo jogador de rúgbi. Quando os dois passam a sentar um ao lado do outro toda manhã, uma amizade intensa se desenvolve e eles ficam cada vez mais próximos.
Charlie logo começa a se sentir diferente a respeito do novo amigo, apesar de saber que se apaixonar por um garoto hétero só vai gerar frustrações. Mas o próprio Nick está em dúvida sobre o que sente — e talvez os garotos estejam prestes a descobrir que, quando menos se espera, o amor pode funcionar das formas mais surpreendentes.
Como disse, Hearstopper sabe introduzir e se aprofundar em cada personagem para que, assim, o público aprecie a construção do amor e o dinamismo com os demais em volta. De um lado, temos um Charlie (Joe Locke) que ainda sofre bullying na escola por conta de sua sexualidade. Além disso, ele mantém uma relação tóxica com Ben, que o coloca em segredo, uma posição desconfortável como se Charlie fosse alguém para ter vergonha ou não merecesse ser desejado, amado e querido por uma pessoa que lhe desse as mãos.
Por conta deste bullying e a diminuição à sua autoestima, Charlie é quieto e tenta, a qualquer custo, evitar brigas e discussões, um ponto que faz ele avaliar, questionar e lutar por seu espaço e amor próprio. E isso acontece graças ao sentimento que nasce entre ele e Nick, além dos amigos que estão ao seu lado para o der e vier.
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Já Nick (Kit Connor) é o queridinho da garotada, não é aquele garoto popular chato e consegue transmitir doçura, simplicidade e humildade a qualquer momento. É o início da amizade com Charlie que faz Nick questionar o tipo de sentimento que tem, quem realmente é, qual é a sua sexualidade, se é obrigado a se rotular e como as pessoas reagirão às suas mudanças, uma vez que o preconceito ronda esta ambientação.
À medida que Heartstopper explora as camadas de cada protagonista, fica cada vez mais fácil acompanhar a construção deste romance que ganha uma sensibilidade leve e dócil, seja nos inúmeros ‘Oi’ que Nick e Charlie dão; as tentativas de enviar a mensagem certa e perfeita na troca de palavras via DM do Instagram; os encontros aleatórios na escola, o convite para jogar no time de rúgbi, uma vez que Charlie é um ótimo corredor; o primeiro encontro e, é claro, a primeira faísca do flerte que acontece entre os dois.
As cenas românticas de Nick e Charlie são extremamente fofas, gerando aquela timidez da primeira paixão que acontece na fase da adolescência, em que tudo fica intensificado, seja as trocas de olhares e palavras, as reações e os primeiros toques. Aliás, a série faz questão de dar um toque especial a estes momentos com inserções animadas ao redor dos personagens, seja um coração ou um raio animado para ilustrar o abstrato, o que pode ser apenas sentido e não visível. Além disso, a trama também faz questão de trazer aquela típica falha na comunicação e situações mal interpretadas, seja numa reação, uma frase, um olhar ou uma cena em que nada parece ser o que é. O público sabe o que é, mas os personagens não. Entendem o que quero dizer?
Outros personagens
Heartstopper consegue dividir os holofotes entre o casal de protagonistas e os demais personagens coadjuvantes, sem que um ofusque o outro, garantindo um drama mais expansivo e com alívios cômicos dosados, além de trazer à história temáticas importantes a serem discutidas como o peso da amizade, o amor jovem, sexualidade, representatividade, preconceito, bullying e relacionamento tóxico.
Dos personagens coadjuvantes os maiores destaques são Tao e Elle, meus favoritos desta série. Ambos são amigos de Charlie, formando o quarteto com Isaac, aquela amizade forte e sustentável para o que der e vier, não importa as circunstâncias que os distanciem em algum momento.
Todos são melhores amigos, mas Tao (William Gao) é o nerd divertido e bem sarcástico nas palavras, tornando-se aquela pessoa fiel aos rituais tradicionais do grupo, seja na reunião para assistir algum filme, para conversar e até para defender. De todos, Tao é quem mais se impõe, não abaixa a cabeça e bate de frente com aqueles que tentam lhe diminuir ou fazer bullying, especialmente com Charlie. Isso faz com o que o espectador compreenda o ciúme que Tao sente quando o amigo se afasta no momento em que se apaixona por Nick, acreditando ser uma grande cilada, o que irá machucar ainda mais os sentimentos de Charlie. Ver esta leve rixa entre os três traz gás e mais momentos dramáticos à trama, o que é ótimo.
Elle (Yasmin Finney) é uma garota trans que agora estuda na escola só para garotas. Aliás, o colégio é dividido entre garotos e garotas, e isso para Elle é uma mudança um pouco assustadora por não saber o que esperar, mas também é boa por garantir aquele alívio em não sofrer bullying e maus tratos por quem lhe julga. A conexão com Tara e Imogen é crescente e funciona muito bem, típico início de amizade no primeiro dia de escola, em que o medo de ficar sozinho fala mais alto, mas as coisas começam a se encaixar com naturalidade e o medo vai desaparecendo aos poucos.
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Já o Isaac (Tobie Donovan) é o personagem mais apagado da série, fazendo pequenas participações em uma figuração em que aparece segurando um livro ao lado dos amigos.
O lado B do drama fica por conta dos personagens Harry e Ben que enraízam o preconceito, bullying e a relação tóxica abordadas na série. Harry (Cormac Hyde-Corrin) é aquele garoto que provoca o tempo todo, independentemente de ser amigo ou não, não poupa ninguém, tem o rei na barriga e não esconde o preconceito com relação a sexualidade das pessoas. Já o Ben (Sebastian Hope) é o garoto que usa da toxicidade para esconder quem realmente é, diminuindo Charlie nas oportunidades que tem quando, na verdade, almeja ter um amor livre de julgamentos também.
Outro ponto que gostaria de ter visto mais é interação de Nick e Charlie com os pais, especialmente pela série mostrar um apoio forte do pai com o Charlie, enquanto Nick divide, aos poucos, os sentimentos com sua mãe.
Considerações finais
A reta final de Hearstopper sabe criar um clima positivo de expectativa sobre o desfecho do casal de protagonistas, junto com os arcos dos demais personagens que complementam bem este drama, rendendo um futuro promissor à série que, pode sim, garantir a renovação para uma 2ª temporada.
Heartstopper é uma série sobre amor, o romance jovem e a busca da liberdade para amar, na qual aborda temáticas importantes e envolventes com um ótimo desenvolvimento dos personagens que segura a trama do início ao fim. É uma série fofa e sensível que sabe atingir o seu público alvo, além de atrair e envolver até quem não faz parte deste público.
Ficha Técnica
Heartstopper
Criação: adaptação das HQ’s de Alice Oseman
Elenco: Joe Locke, Kit Connor, Sebastian Croft, Yasmin Finney, Chetna Pandya, William Gao, Fisayo Akinade, Joseph Balderrama, Cormac Hyde-Corrin, Alan Turkington, Rhea Norwood, Corinna Brown, Kizzy Edgell e Tobie Donovan.
Duração: 1ª temporada (8 episódios 30min)
Nota: 3,5/5,0