Tudo em Família (A Family Affair) é a nova comédia romântica da Netflix que, no geral, traz uma proposta interessante, com uma narrativa satisfatória e ótimo elenco. O conjunto da obra prende a atenção do espectador e é um filme legal de assistir. Porém, quanto mais pensamos sobre a história e as atitudes dos personagens, mais questionamentos são levantados, o que poderá dividir opiniões.
Com direção de Richard LaGravenese, Tudo em Família acompanha Zara, que trabalha como assistente pessoal do famoso astro Chris Cole. O seu objetivo é se tornar uma produtora, uma vez que este trabalho promete abrir portas à carreira profissional que tanto deseja.
O grande problema é que Chris é o maior chefe babaca, que age como uma ‘diva’ sensível, não mede as atitudes, muito menos as palavras. Ele coloca Zara em situações que a deixam de ‘saia curta’, desde comprar joias para que Chris termine o relacionamento da vez, até recolher os pertences dele na casa da parceira ou dela na casa dele.
Mas o pior de tudo é que Zara tem o seu emprego constantemente ameaçado por Chris, sendo que ela faz absolutamente tudo, deixando-o 100% dependente dela. Até que, um dia, depois de perceber que não será promovida, a última briga é a gota d’água para sua demissão.
Quando Chris percebe que Zara é a melhor assistente que tem, ele vai até a sua casa para pedir que volte ao trabalho, mas agora, promovida. No entanto, Chris conhece Brooke, mãe de Zara, viúva e autora de sucesso, mas que se encontra empacada no desenvolvimento do seu novo livro.
Em poucas horas, o clima entre Brooke e Chris acende, fazendo os dois perceberem a química inegável que tem, levando o chefe egocêntrico de Zara a conquistar a mãe, enquanto Brooke tem a chance de viver um novo amor depois de muitos anos sozinha e focada na maternidade. No entanto, o maior embate é se Zara vai aceitar ou não o relacionamento da mãe com o seu chefe cuja personalidade é questionável.
******CONTÊM SPOILERS******
Tudo em Família tem uma proposta interessante ao abordar romance em meio à maturidade multigeracional, com personagens que cativam à primeira vista.
Por um lado, vemos Zara (Joey King) lidar com um chefe tóxico enquanto tenta alcançar os seus objetivos profissionais em Hollywood. Mas ela também questiona quem realmente quer se tornar. Este último questionamento é levantado ao se comparar com o talento da mãe, o que faz Zara se diminuir por não saber se vai atender as expectativas da mãe.
Mas a verdade é que o talento da personagem é outro e ela destrincha isso com maestria. No entanto, o fato de Chris sempre menosprezar o trabalho da assistente, faz com que ela duvide de si mesma.
E isso faz ela bater de frente com a mãe que, inicialmente, era contra o trabalho dela, mas depois diz que a filha desiste fácil das coisas, o que é bem incoerente se pararmos para analisar. Além disso, Zara aceita a promoção no trabalho, caso o Chris não se envolva mais com a mãe dela.
Brooke (Nicole Kidman) é uma autora de sucesso, mãe maravilhosa, mas que vem de um casamento com altos e baixos, marcado pela perda do marido há 11 anos.
Ela deseja retomar sua vida e carreira, recebendo o total apoio da sogra. Quando Chris entra em sua vida, esta é chance de ela ter este recomeço, no entanto, o que realmente levanta dúvidas sobre o desenvolvimento do filme é a relação de mãe e filha em torno de tudo isso.
Tudo em Família aborda uma relação madura entre diferenças de idade, status e identidade, o que é uma proposta boa e diferente. No entanto, o filme poderia ter desenvolvido melhor a relação de mãe e filha, a fim de que o relacionamento de Brooke e Chris conquistasse melhor o público.
Digo isso, pois Brooke tinha consciência sobre o lado tóxico do chefe de Zara e, mesmo assim, decidiu esconder da filha e seguir em frente para viver este romance inesperado que iluminou o seu caminho. Do outro lado, é possível questionar o quanto Zara falou à sua mãe a respeito do seu chefe. Há uma lacuna que mostra a falta de comunicação entre mãe e filha.
Ao mesmo tempo que torcemos para que Brooke seja feliz, ela não leva em consideração os atos tóxicos de Chris com a Zara, o que seria interessante, pois ajudaria mais no desenvolvimento do personagem de Zac Efron.
É normal o espectador questionar isso, pois Brooke admite a relação de altos de baixos com o marido e o fato dele ter se incomodado com o seu sucesso, o que não deixa de ser tóxico. Então, porque ela aceita que Chris seja tóxico com sua filha?
Isso coloca a personagem de Joey King como a ‘vilã’ da história, a ‘do contra’, que não quer que sua mãe seja feliz. Enquanto Brooke conhece Chris apenas alguns dias, Zara convive com ele diariamente há 2 anos, o que lhe dá motivos para temer que ele possa magoar a mãe, assim como fez com as namoradas anteriores. Por que Brooke não enxerga isso?
Também não estou dizendo que Zara é 100% perfeita, afinal, ela deveria deixar às claras os seus sentimentos e frustações, entender melhor o lado da mãe como mulher e profissional, enquanto bate de frente com Chris a fim de que ele lide com as falhas. Trata-se de um astro do cinema sem amigos e conexões familiares, pontos importantes que ele acaba encontrando ao lado da família de Zara.
Além disso, Zara erra a mão com Genie (Liza Koshy), deixando a melhor amiga sempre em segundo plano, enquanto coloca seus problemas sempre à frente de tudo e todos. O fato de Zara não devolver a reciprocidade à amiga a torna uma pessoa egoísta, o que faz ela reconhecer a falha e ter uma percepção mais transparente sobre a mãe.
Um ponto que pode irritar em Tudo em Família é a intromissão da avó Leila (Kathy Bates). É interessante ver a cumplicidade de nora e sogra, especialmente após a morte do marido/filho, uma vez que Leila quer que Brooke seja feliz.
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No entanto, Leila admite que desconhecia dos problemas matrimoniais e como o filho agia com Brooke. Se ela mesma não conhecia 100% o próprio filho, como ela já pode conhecer e gostar do Chris em apenas poucos dias, ainda mais sabendo da forma como ele agia com a neta? São pequenos furos no roteiro que até podem passar batidos, caso o espectador faça vista grossa.
Mas é Zara e Chris quem salvam a história ao analisar suas falhas para corrigi-los, enaltecer suas qualidades e se abrirem, de fato, às oportunidades. Zara admite o amor que a mãe e o chefe têm um pelo outro e, finalmente, abraça o talento que tem, sem régua ou comparações.
Já Chris admite a forma tóxica que tinha com Zara, apesar do filme tratar as cenas como algo cômico, sem desmerecer sobre a temática. Ele não quer mais fugir do amor e, consequentemente, abrir espaço em sua vida para novas e permanentes conexões.
Considerações finais
A reta final de Tudo em Família se encerra satisfatoriamente bem, com recomeços e novos desafios que fazem os personagens darem um passo importante em suas vidas.
A verdade é que Tudo em Família é aquela comédia romântica para ser assistida de despretensiosamente. Se começar a pensar muito, vai encontrar falhas coerentes no desenvolvimento da história. Ainda assim, é possível assistir e gostar, mesmo questionando as atitudes dos personagens. Fica a critério de cada um em como assistir.
Ficha Técnica
Tudo em Família
Direção: Richard LaGravenese
Elenco: Nicole Kidman, Joey King, Zac Efron, Kathy Bates, Liza Koshy, Sherry Cola, Ian Gregg, Sarah Baskin e Brooks Ashmanskas.
Duração: 1h51min
Nota: 2,9/5,0