Them (Outros) é a nova série antológica do Amazon Prime Video que chamou a atenção por apresentar uma temática forte e interessante que se desenvolve no gênero terror lembrando muito o estilo do diretor e roteirista Jordan Peele, e caso você já conheça os filmes Corra e Nós, você lembrará dele imediatamente. Será que vale a pena assistir? Vale sim e vou te dizer o porquê.
Them se passa na década de 1950 que, durante a Grande Migração, muitas famílias negras migraram para regiões que prometiam uma vida melhor e bons empregos em grandes fábricas. Assim, a trama acompanha a família Emory, que se muda para East Compton, na Califórnia, em um bairro predominantemente branco. O que era para ser o início de um sonho e uma grande mudança de vida, torna-se um pesadelo pelos ataques racistas da vizinhança, comandada por Betty, e piora ao perceber que a casa amaldiçoada é capaz de despertar os piores traumas de cada personagem.
A 1ª temporada da série antológica tem 10 episódios de 35 a 50 min, ou seja, a cada temporada vamos ter uma história diferente. Assim, nesta primeira leva de episódios, a série nos apresenta uma história que constrói uma atmosfera sobrenatural e terror psicológico sobre o racismo estrutural de forma visceral, forte e bem chocante. Caso você já tenha assistido aos filmes Corra e Nós do diretor Jordan Peele, e também o filme O Que Ficou Para Trás (Netflix), conseguirá enxergar certas similaridades com relação à temática e a forma como é desenvolvida dentro do gênero horror. No entanto, a série não se intimida ao desenvolver a história de uma forma bem mais pesada e impactante, o que faz o espectador optar em assistir aos poucos a fim de absorver e digerir melhor o que foi visto.
Inicialmente, a narrativa ganha um ritmo lento, mas a partir do 3º episódio, a história se engrandece e instiga não só sobre o que os personagens sofrem neste bairro, mas também sobre o passado trágico cujo mistério cria um bom suspense e se conecta ao terror psicológico em que vemos figuras assustadoras que simbolizam tanto o racismo quanto os traumas de cada um.
O passado
Ao longo dos 10 episódios, Them entrega uma narrativa não linear que nos conta o que aconteceu no passado e como antigas circunstâncias influenciam no presente. Assim, no decorrer da temporada, o espectador descobre que Henry Emory (Ashley Thomas) carrega cicatrizes e traumas da guerra, enquanto sua esposa Lucky (Deborah Ayorinde), uma mulher forte, ficou marcada pela perda do filho mais novo Chester. Mesmo com essas feridas, eles precisam seguir em frente em busca de uma vida melhor para eles e suas filhas Ruby (Shahadi Wright Joseph) e Gracie Jean (Melody Hurd).
Tal tragédia familiar se torna o maior mistério até a metade da temporada que faz o público ficar interessado em saber o que realmente aconteceu com esta família para atormentá-los. A série não mede esforços e entrega um 5º episódio extremamente forte ao relevar o que aconteceu com eles, culminando na morte do filho. São cenas difíceis de assistir, fortes e impactantes, um fator que a série trabalha bem do início ao fim.
Assim que parte do mistério é revelado, a série começa a conectar com outros pontos da trama para o público entender e se chocar com o racismo estrutural e como isso desperta os traumas dos personagens que ganham formas sobrenaturais assustadoras e interessantes.
Figuras sobrenaturais
É possível não entender de imediato o que significa cada figura sobrenatural, mas não se preocupe, pois à medida que os mistérios são revelados, as respostas vão surgindo e o terror psicológico ganha forma fazendo o espectador compreender o significado destes símbolos aterrorizantes que expõe os medos e traumas de cada membro da família.
A primeira a aparecer é Sra. Vera (Dirk Rogers), que ganha uma forma assustadora de uma mulher extremamente alta e medonha, que assombra tanto a filha caçula Gracie Jean quanto Lucky, na tentativa de destruir a relação de mãe e filha.
Já a estudante Doris (Sophie Guest), uma garota branca e loira, aparece para assombrar Ruby, que tem medo de enlouquecer como a mãe (por conta do passado) e deseja ser aceita por todos. Assim, a personagem fica obcecada por conta da cor de sua pele, almejando ser branca, o que a faz despertar os piores sentimentos, destruindo a sua essência e se afastando de quem ela é de verdade.
Outra figura que faz parte deste terror psicológico é o Homem do chapéu preto (Christopher Heyerdahl) e este é um dos mais misteriosos da série, afinal, esta entidade sobrenatural destrói famílias negras e faz de tudo para Lucky enlouquecer e cometer os piores atos possíveis. No início, é possível não entender a razão desta figura aparecer, porém suas motivações e sua história de origem são contados no 9º episódio em preto e branco, trazendo grandes revelações de como a maldição começou e afeta a família Emory nos dias atuais. Novamente temos um episódio bom, forte e impactante.
Por fim, temos um dos maiores destaques deste terror psicológico que é o ‘Black Face’ ou ‘Sapateador’ (Jeremiah Birkett), uma figura com a cara pintada da cor preta fazendo referência quando brancos pintavam o rosto da cor preta para representar os negros no cinema e nos palcos de forma pejorativa. Este ser representa todos os sentimentos ruins de Henry, que sofre racismo não só no lugar onde mora, como também no trabalho onde é humilhado e ignorado. Black Face desperta o pior lado de Henry que faz não só ele ter ações impulsivas e irremediáveis como também o faz sofrer pela culpa por não ter protegido a esposa e o filho quando eles mais precisavam, o que faz o público entender os traumas que Henry carrega e o desejo de livrar deles.
A série Them constrói ótimos momentos aterrorizantes com direito a bons jump scares, no entanto, há momentos em que estes sustos fáceis são exagerados e criam uma atmosfera de suspense desnecessária em alguns pontos.
Vizinhança do mal
Todo o terror psicológico é construído em cima do racismo estrutural nos Estados Unidos da década de 1950, em que famílias negras eram torturadas a fim de que fossem embora dos lugares onde tentavam construir suas vidas. E é dessa forma que Them relata exatamente o que a família Emory passa no bairro Compton, desde o momento em que eles compram a casa, a desconfiança com relação ao contrato, os olhares julgadores, o tratamento da polícia e a tortura diária cometida pelos vizinhos.
Deste plot, o grande destaque é Betty que ganha uma interpretação incrível da atriz Alison Pill. Betty é uma mulher branca, vinda de uma família rica. Ela mantém as aparências, enquanto em casa as coisas desandam, como a relação com o marido (e assistindo você entende o porquê) e a razão para eles não terem filhos. Betty representa a dona de casa perfeita que deseja que a família de negros vá embora para não destruir o ‘legado branco’ construído por sua e demais famílias.
A personagem ganha uma personalidade repulsiva, escondendo a maldade em um sorriso forçado e irritante. Betty representa o racismo puro e desperta nos demais personagens o mesmo sentimento, resultando em cenas desconfortáveis e torturantes. O desfecho de Betty é triste e irônico, fazendo a personagem beber de um veneno que ela jamais imaginou que respingaria em sua pele.
Considerações finais
Them ganha um desfecho que vemos a família Emory destruindo a maldição dentro da casa e finalmente lidando com os traumas para seguir em frente com suas vidas. No entanto, a série deixa o final em aberto para mostrar que o mal é uma guerra em que a primeira batalha foi vencida, mas outras ainda serão enfrentadas.
O que acharam da série Them?
Ficha Técnica
Them
Criação: Little Marvin
Elenco: Deborah Ayorinde, Ashley Thomas, Alison Pill, Shahadi Wright Joseph, Melody Hurd, Ryan Kwanten, Christopher Heyerdahl, Liam McIntyre, Jeremiah Birkett, Sophie Guest, Dirk Rogers, P.J Byrne, Kim Shaw, Dale Dickey, Latarsha Rose e Brooke Smith.
Duração: 1ª temporada (10 episódios)
Nota: 8,9