O thriller psicológico Lizzie impacta não só por ser baseado em uma história real, mas também por explorar os bastidores de um dos assassinatos que chocou os Estados Unidos na Era Victoriana. Dirigido por Craig William Macneill, o filme relata o estrondoso assassinato da família Borden, ocorrido em 1892, em Massachusetts.
A trama acompanha Lizzie Borden, uma mulher de 32 anos, solteira e antissocial, que vive uma rotina claustrofóbica sob o controle frio e dominador de seu pai (Jamey Sheridan). Por viver assim, Lizzie sofre de epilepsia, tem contato ameno com a irmã Emma (Kim Dickens), recebe o descaso e a falta de amor de sua madrasta Abby (Fiona Shaw) e ainda lida com o tio John Morse (Denis O’Hare), que está atrás da herança da família. A situação ameniza com Bridget Sullivan (Kristen Stewart), que chega para trabalhar como criada na casa da família. Assim, Lizzie encontra alguém em quem confiar e uma intimidade inquietante surge entre ambas. Mas é a junção de todos esses problemas que culminam na morte trágica do pai e da madrasta, levando Lizzie a julgamento que, no final das contas, é inocentada. No entanto, o grande mistério permanece até hoje devido às falhas da polícia ao ignorar “pistas”, trazendo a grande dúvida sobre a identidade do assassino. Ainda assim, Lizzie é vista como a causadora de toda a tragédia.
Aparentemente, o roteiro apresenta uma história que irá demorar a se desenvolver, mas a trama ganha um ritmo dinâmico relatando os bastidores da família Borden até o ápice do filme. Interpretada por Chloë Sevigny, Lizzie sofria justamente pela figura feminina ter tantas restrições em uma época extremamente machista, em que a mulher era assediada, julgada por trabalhar, sair sozinha, ter opinião própria e se impor. O fato de ser solteira também pesa, ainda mais com a chegada de Bridget, que culmina no início de uma relação homossexual, um tabu fortíssimo na época. Todos esses pontos são explorados em cenas cortantes e brutas entre Lizzie e o pai, Andrew Borden, o descaso da madrasta, o medo de Emma e o sofrimento às escuras de Bridget com o patrão.
A relação entre Lizzie e Bridget é corriqueira, justificável e aceitável na trama devido à situação e a atmosfera que elas se encontram. O público compra o relacionamento e chega a torcer para que ambas tenham um final “feliz” longe daquela casa. É possível até notar a mudança no semblante das personagens quando estão juntas e, até mesmo, no cenário, que ganha tons claros e mais reluzentes, dando um toque de esperança e alívio dentro de uma casa conturbada e infeliz. Chloe e Kristen possuem química e a dupla funciona bem na tela. A interpretação de Stewart até que não fica a desejar, mesmo que falte um pouco mais de energia e expressão em sua interpretação.
Aprofundando de maneira satisfatória, o filme pontua as motivações citadas – tanto do lado dos pais quanto do lado de Lizzie e Bridget – que levam ao momento crucial. O assassinato é minucioso nos detalhes que se reverbera em uma cena fria, crua e macabra, revelando a identidade do assassino ao público, mesmo que na história real esse mistério ainda permaneça.
O final culmina no julgamento e absolvição de Lizzie, o desfecho para Bridget, o afastamento de Emma, o destino da herança e os novos olhares da sociedade diante desse caso.
Considerações finais
Com boas interpretações e uma atmosfera claustrofóbica e triste, Lizzie retrata bem os bastidores e as motivações que levam a um dos marcos da criminologia dos Estados Unidos. A trama pontua bem o machismo, assédio, agressão verbal e física e o descaso contra a sociedade feminina na Era Victoriana, que culmina em uma tragédia sem um desfecho coerente à justiça.
Ficha Técnica
Lizzie
Direção: Craig William Macneill
Elenco: Chloë Sevigny, Kristen Stewart, Kim Dickens, Jamey Sheridan, Fiona Shaw, Denis O’Hare e Jay Huguley.
Duração: 1h45min
Nota: 7,5