Já é de praxe acompanhar as adaptações das obras de Stephen King como o caso dos ótimos Carrie, a Estranha (1976), Louca Obsessão (1990) e It – A Coisa (2017 e 2019), mas nem todos os longas conseguem trilhar um bom caminho e, infelizmente, o novo Chamas da Vingança (Firestarter) é um deles.
Em 1984, o cinema recebeu a primeira adaptação do livro A Incendiária com Drew Barrymore no papel da garota com poderes pirocinéticos. Agora, em 2022, a obra ganha uma nova versão feita pela Blumhouse com Zac Efron e Ryan Kiera Armstrong nos papeis principais, além de um elenco honesto e uma produção até que bem feita. No entanto, o grande problema está no roteiro apático, sem energia e empolgação que perde boas oportunidades em dar ritmo e ação aos momentos que exigem tensão e ganchos mais fortes, o que despertaria a curiosidade do espectador em querer se importar com a história. No fim, a trama causa uma reação sonolenta dando aquela famosa sensação de ter visto mais um longa esquecível.
******CONTÊM SPOILERS******
Com direção de Keith Thomas, Chamas da Vingança apresenta Charlie, uma garota com poderes pirocinéticos extraordinários. Por mais de uma década, os pais Andy e Vicky estão fugindo desesperados para esconder a filha de uma agência federal que quer capturá-la para aproveitar o seu dom para estudos e pesquisas, mas com segundas intenções.
Charlie ainda não sabe controlar direito o seu poder e, aos 11 anos, encontrar este equilíbrio começa a ficar difícil, uma vez que o fogo é desencadeado pelas emoções da garota. Após um incidente revelar a localização da família, um agente misterioso é enviado para caçar Charlie, mas ela não está disposta a ser pega tão facilmente.
Como não li o livro, não irei fazer comparações entre a obra original e adaptação, focarei esta crítica apenas no filme. De um modo geral, Chamas da Vingança apresenta uma produção honesta com efeitos especiais satisfatórios que ilustram o poder de cada personagem e uma ambientação aberta, rústica e nublada para enfatizar uma vida carregada de segredos, fugas, esconderijos e o medo da descoberta, o que pode levar à separação da família e um destino infeliz.
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Outro ponto interessante é que o roteiro faz questão de retratar as origens dos pais, especialmente pelo fato de cada um ter um poder após participar de experimentos na época da faculdade: enquanto Vicky tem o dom de mover objetos, Andy consegue manipular e controlar a mente das pessoas. O fato deles terem sido cobaias de um soro altamente periculoso faz o espectador compreender a razão para Charlie ter nascido predisposta à pirocinese e, consequentemente, o trio ser observado e perseguido por estas autoridades, uma vez que eles são frutos de algo maior e perigoso.
Enquanto conhecemos sobre cada um, o filme também faz questão de relatar a dinâmica da família e as divergências com relação à Charlie, uma vez que a mãe deseja ensiná-la a controlar o próprio poder a fim de evitar catástrofes, enquanto o pai impede que Charlie tenha um conhecimento maior sobre si com o objetivo de também evitar o perigo, mas principalmente a atenção indesejada.
Chamas da Vingança prepara o terreno para um desenvolvimento que tinha o potencial de entregar cenas de ação bem feitas, um ritmo mais enérgico, decisões imprevisíveis e boas e reviravoltas mais intensas e surpreendentes que instigariam mais o espectador causando medo e angústia, afinal trata-se de um terror, mas que não necessariamente precisasse de jump scares, no entanto, nada disso acontece, o que é bem frustrante.
Por conta de um roteiro apático, a narrativa não tem um bom dinamismo e entrega momentos sem graça na qual o espectador não se importa, como por exemplo, com a primeira tragédia que abala a família. A fuga, que é um dos pontos importantes da trama, não é enérgica, muito menos tensa e intensa, perdendo a chance de injetar toques de horror que caberiam muito bem neste plot.
A ausência de dinamismo do roteiro traz consequências negativas também para as atuações. Zac Efron é um ótimo ator e acredito que ele até conseguiu fazer o que estava ao seu alcance ao entregar um Andy pronto para salvar a filha a qualquer custo, seja ativando seu dom e arriscando sua própria vida para protegê-la. Mesmo assim, a sagacidade nas ações e reações do personagem foi extremamente podado.
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Assim como ele, Vicky também é uma personagem cuja performance da atriz Sydney Lemmon é afetada, em que a mãe até tenta dar o seu melhor para Charlie, mas só está ali para servir para uma reviravolta triste, porém sem graça.
Já a atriz Ryan Kiera Armstrong é a que mais se esforça e carrega o filme nas costas ao entregar uma Charlie inteligente e disposta a controlar o poder, mas também a atingir aqueles que colocarem a sua vida ou daqueles que ela ama em perigo. Mesmo injetando a ação nas cenas da protagonista, ainda não é suficiente para tornar a história empolgante.
Se os personagens principais sofrem com tal apatia, o antagonismo é ainda mais atingido pelo roteiro fraco na qual entrega uma agência federal que foca somente em caçar a garota, cuja capitã Hollister (Gloria Reuben) se posiciona como vilã que não amedronta e o agente misterioso Rainbird (Michael Greyeyes) que caça a garota, mas o espectador fica sem entender direito quais são suas verdadeiras intenções quando ele se posiciona ao contrário do que vinha fazendo. O ator Kurtwood Smith interpreta um dos líderes deste experimento na qual aparece somente para explicar sobre a origem do soro, os poderes e o caos que pode acontecer, sem adicionar nada mais ao filme. Uma participação que poderia ser um acréscimo à trama, mas é mal aproveitada.
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Não posso deixar de mencionar a trilha sonora de John Carpenter que, isoladamente, é bem composta, mas não se encaixa com este longa, dando a sensação de que estamos ouvindo a trilha de Halloween no filme errado.
Considerações finais
A reta final até tenta salvar o resto da trama, mas não consegue, pois entrega reviravoltas em que o espectador não consegue saborear o esperado toque surpreendente, já que o filme não faz questão de trabalhar os elementos surpresas ou ações que poderiam empolgar.
Chamas da Vingança tem um bom elenco de protagonistas, boa produção e efeitos especiais satisfatórios, mas carece de um roteiro enérgico e dinâmico que renderia em boas cenas de ações, com toques de horror e reviravoltas que saberiam surpreender. O filme tem fogo de sobra, mas falta combustão nesta história sem graça e esquecível.
Ficha Técnica
Chamas da Vingança
Direção: Keith Thomas
Elenco: Zac Efron, Ryan Kiera Armstrong, Sydney Lemmon, Michael Greyeyes, Gloria Reuben, Kurtwood Smith, John Beasley, Tina Jung e Hannan Younis.
Duração: 1h34min
Nota: 2,0/5,0