Babygirl traz uma Nicole Kidman como você nunca viu. Em cartaz nos cinemas, o filme apresenta um tema ainda tabu na sociedade: os desejos da mulher, desde os mais simples até os prazerosos sombrios. Uma trama sexy que cria o tesão no espectador com uma atmosfera sedutora e bem construída, desde a coordenação corporal, intenções dos personagens, jogos, cenários e trilha sonora.
Babygirl veio para expandir a mente sobre tal temática e se distanciar dos julgamentos, como vemos no andamento da história. Mesmo com uma cena ou outra que poderia ser descartada, vale a pena assistir e vou te dizer o porquê.
Com direção de Halina Reijn, Babygirl acompanha Romy, uma renomada CEO, casada e com duas filhas. Ela é uma empresária bem sucedida, com nome forte no mercado, firme em sua postura no trabalho e reconhecida por todo o esforço que a levou ao topo.
Mas entre quatro paredes, Romy é uma mulher com desejos carnais sinuosos, cujo prazer vem da submissão na cama. Romy gosta de obedecer e ser controlada, ainda que tal controle permaneça em suas mãos, já que direciona ao que quer para obter o ápice de seu prazer. Mas tal desejo sombrio e bruto não condiz com sua personalidade e postura de liderança. Mas fica o questionamento: por que não posso delegar o prazer ao outro para obter a satisfação?
Infelizmente, Romy não desfruta destes desejos ao lado do marido Jacob, com quem é casada há mais de 20 anos. Ela é apaixonada por ele e pela família que construiu. Até que, um dia, um novo estagiário da empresa, Samuel, chama a sua atenção pelo controle interno que exala nas atitudes.
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À medida que se aproximam e Samuel passa a entender tais gostos peculiares da chefe, ele e Romy iniciam uma relação extraconjugal, abrindo portas para tais descobertas prazerosas e possivelmente obscuras aos demais, iniciando um jogo submisso e delicioso de ‘gato e rato’, não só na cama. Mas até que ponto estes desejos podem atrapalhar Romy sobre quem ela é e o que construiu?
O primeiro ponto positivo é o fato de Babygirl ser dirigido por uma mulher, que explora com respeito e destrincha um tema voltado ao público feminino em especial. O filme não espera para chocar e já mostra em sua primeira cena o que a protagonista realmente quer: após a relação sexual com o marido, Romy vai ao escritório para assistir pornô e sentir o prazer que não foi alcançado.
E isso já deixa claro que Romy não obtém tal prazer que quer no casamento, mesmo insinuando e ensinando ao Jacob o caminho que ele poderia seguir para satisfazê-la. E mesmo com 20 anos de relacionamento, Romy sente vergonha de se expor desta forma, por acreditar que o marido não vá compreender seus desejos mais sombrios.
Em uma frase curta e direta: a protagonista gosta de ser tratada como submissa, de obedecer e ser controlada, desde as ordens mínimas até as mais promíscuas.
Aos poucos, quando ela realmente entende que seus desejos podem, de fato, ser realizados com Samuel, Romy fica receosa, especialmente por misturar trabalho e prazer – afinal, ela se relaciona com o seu estagiário – um ponto que balança o pedestal e a imagem que ela passa às demais mulheres do trabalho, como vemos com sua assistente que a admira ao abrir portas para aquelas que também desejam chegar no topo.
É aí que Babygirl inicia uma discussão sobre os desejos femininos reprimidos, o preconceito em torno disso, em meio a um ambiente que coloca a mulher em risco, seja no trabalho, na postura de líder, no casamento, na maternidade e como mulher.
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O filme caminha nesta linha tênue a fim de explanar o tabu, apresentar os riscos em volta e mostrar que é possível ter e realizar tais desejos carnais. Claro que a protagonista explora isso por caminhos controversos e facilmente julgáveis (muitos podem julgar), mas a história não permite ir por este desfecho.
A atriz Nicole Kidman entrega uma performance completamente diferente do que já foi visto e, acredite, é surpreendente em vários aspectos. Ela entrega uma postura firme e direta de uma Romy CEO, desejada pelos demais a sua volta. Em casa, ela tem mais malemolência, mas, ainda assim, mantém certa firmeza. Com o marido, ela tenta apresentar um lado mais fogosa, abrindo um possível caminho para que Jacob entenda os seus verdadeiros fetiches na cama, se retraindo com o possível julgamento vindo em sua direção.
Já com o estagiário, a atriz entrega uma atuação sexy sem ser vulgar, em que a direção de Halina toma o cuidado de colocar a câmera no rosto da atriz para entendermos o seu prazer apenas por suas expressões e respirações ofegantes, enquanto o seu corpo é, ocasionalmente, exposto com delicadeza nos momentos de submissão e fetiche total.
O ator Harris Dickinson não fica nada a desejar em Babygirl e entrega uma performance crescente que, pouco a pouco, vemos seu personagem entender e aprender como controlar a situação e dar exatamente o que Romy tanto quer.
O jogo de ‘gato e rato’ vai além do ‘entre quatro paredes’, quando Samuel passa a controlar sua chefe desde pequenos gestos, como o copo de leite que ela bebe durante um almoço de trabalho; os telefonemas sempre atendidos e acatados; até os maiores, como tratá-la como se estivesse a adestrando (ficar de quatro, deitar, lamber o leite do pires no chão, ficar nua enquanto admira seu corpo). Estar em uma postura total de submissão a deixa extremamente excitada.
Claro que o perigo caminha também nesta linha tênue, quando Samuel se aproxima da família de Romy, que não esconde o desejo e ciúmes misturados entre ela ser casada, sem aceitar de que Samuel possa ter outro relacionamento, o que de fato, acontece.
E tal situação se afunila quando a assistente de Romy, Esme, capta o que está acontecendo e a faz voltar aos trilhos, não permitindo que seus desejos destruam a carreira que abriu portas para que mais mulheres cheguem aonde ela chegou. Não existe um julgamento da parte de Esme, ela apenas relembra a chefe de que é preciso separar as coisas.
No entanto, o famigerado julgamento e preconceito a tais desejos sexuais chega pela perspectiva de Jacob, cuja atuação de Antonio Banderas é satisfatoriamente boa. A verdade aparece e, ciente da relação extraconjugal e dos desejos sombrios de sua esposa, Jacob até caminha para um lado machista e preconceituoso diante do tabu apresentado, mas logo o personagem é colocado em outra postura quando confrontado por Samuel, que lhe explica a situação e aponta que seu olhar é obtuso diante disso.
É aqui que Babygirl foge completamente de um desfecho convencional que, no caso, seria a traição e o término do casamento, algo que passa pela mente do espectador enquanto assiste, o que é até cabível.
Indo por este caminho, toda a construção sobre os fetiches femininos iria por água abaixo. Ao invés disso, o filme opta em fazer o marido abrir a mente e finalmente entender o que sua esposa deseja na cama, resultando em uma última cena deliciosamente prazerosa entre o casal, trazendo a primeira quebra do tabu.
Não posso deixar de falar que Babygirl entrega um ótimo trabalho de edição de som, cuja música de fundo afunila e aumenta a tensão sexual, em que o som casa perfeitamente com a respiração ofegante da protagonista.
Considerações finais
Babygirl é um suspense erótico que retrata o desejo feminino e quebra deste tabu ao transitar e mesclar o fetiche com outras áreas como trabalho, casamento, maternidade, feminilidade, com o intuito de desvencilhar tal temática de julgamentos e preconceitos. O filme acerta na história, elenco e tema, com destaque para Nicole Kidman como você ainda não viu. Mas agora verá.
Ficha Técnica
Babygirl
Direção: Halina Reijn
Elenco: Nicole Kidman, Haris Dickinson, Antonio Banderas, Sophie Wilde, Izabel Mar, Esther Rose McGregor e Vaughan Reilly.
Duração: 1h54min
Nota: 3,9/5,0