A Grande Mentira (The Good Liar) é um drama que, aparentemente, revela ao público apenas um lado da trama, fazendo o espectador acompanhar um único ponto de vista e acreditar que tal desfecho será algo até previsível. No entanto, o tempero do filme fica por conta da reviravolta, tornando-a uma boa caixinha de surpresa, revelando novas facetas dos personagens que surpreendem. Apesar do roteiro ser bem extenso e repleto de detalhes e explicações que, talvez, seja cansativo para alguns, no fim das contas, o longa nada mais é que uma trama satisfatória sobre manipulação e vingança.
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Dirigido por Bill Condon e baseado na obra de Nicholas Searle, A Grande Mentira acompanha o golpista Roy Courtnay (Ian McKellen), que vive de grandes e bons golpes na praça. Um dia, em um site de encontros, ele passa a manter contato com Betty McLeish (Helen Mirren), uma doce senhora à procura de um parceiro. Nos primeiros encontros, Roy descobre que tirou a sorte grande ao tomar conhecimento da fortuna da viúva. Quando Betty abre sua casa e a vida para ele, Roy fica surpreso ao perceber que está se afeiçoando a ela, transformando o que deveria ser somente mais um golpe em uma corda bamba mais traiçoeira de sua vida.
A Grande Mentira ganha um roteiro extenso que, mesmo dividido em três atos no filme, dá a sensação de ter sido dividido em duas partes. Na primeira parte vamos conhecer detalhadamente a rotina de Roy e a forma como ele desenrola suas jogadas e aplica os seus golpes. No primeiro momento, o público acompanha o protagonista desenvolvendo sua estratégia para arrancar uma boa quantia de dinheiro de um grupo de empresários para aplicar em seu “investimento”. Os diálogos são explicativos não só para trazer compreensão à cena, mas também para fazer o público entender sobre o que esperar de um personagem como este e o que ele será capaz de fazer com os seus alvos.
À medida que Roy entra na vida de Betty é até difícil se afeiçoar por ele, pois a todo momento ele revela pequenos enganos, falcatruas e cartas na manga pronto para aplicar, o que faz o espectador duvidar do seu caráter a todo momento, mesmo que ele demonstre alguns sentimentos por Betty. Aliás, várias cenas mostram o quanto ele está disposto a entrar na vida da senhora a qualquer custo, seja fingindo um problema no joelho, a difícil rotina da velhice, o encanto que ele tem por Betty e sua força de vontade em querer estar ao seu lado em tempo integral.
Do outro lado, vemos Betty cair no conto do vigário de forma esplendorosa e é até possível compreender, uma vez que Roy consegue criar tal faceta com maestria, afinal, quem acreditaria que um idoso bom e singelo seria um verdadeiro golpista? Hellen Mirren entrega um lado doce e compreensível a ponto de ficar completamente contra o seu neto Stephen (Russell Tovey) e, até mesmo, de confiar toda a sua fortuna nas mãos de Roy.
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Mesmo com uma conexão tão forte, Betty não quer uma aproximação mais íntima, ficando apenas em uma amizade forte com o Roy, o que faz o público criar certas dúvidas. Mesmo não investindo em um relacionamento amoroso, Betty e Roy convivem como se fossem um casal, viajam por Londres e Berlim – que, por sinal, são cenários frios e bonitos e que trazem mais sentido à história – e fortalecem ainda mais essa conexão dúbia.
Assim que temos a primeira e pequena reviravolta, o público ganha mais detalhes sobre a vida de Roy e como ele se tornou quem é hoje, justamente por um passado sombrio durante a época do nazismo. Mas, mesmo com essas informações receosas, Betty não deixa de ter afeição pelo parceiro, o que a faz tomar uma decisão ainda mais radical.
É neste ponto que A Grande Mentira toma a grande decisão de tornar a sua história crucial e transformá-la na isca perfeita para o público. Já no terceiro ato, o filme sofre uma grande reviravolta revelando mais uma faceta de Roy e a grande jogada de Betty, em que muitos poderão ficar surpresos e até com certo repúdio do personagem. Mas é também neste ponto que, talvez, alguns espectadores possam não gostar, afinal, quando o plot twist é jogado na tela, o filme é “rebobinado” retornando não só ao passado de Betty como também a tudo o que vimos desde o início para explicar o que estava escondido nas entrelinhas. Na minha opinião, o roteiro é extenso, mas não fica a desejar e as explicações dessa reviravolta são coerentes. No entanto, pode ser que alguns achem as informações redundantes, excessivas e cansativas. Mas aí vai de cada ponto de vista de quem assistir.
É nesta reviravolta que vemos uma faceta extraordinária de Betty, que ganha uma ótima interpretação de Helen Mirren, enquanto Ian McKellen tem sua performance mantida em equilíbrio e bastante testada nesta reta final, o que fica ainda melhor.
O desfecho é frio e manipulador, enfatizando que o mundo sempre dá voltas, não importa quanto tempo passar. A Grande Mentira é um filme que aparenta ser previsível e dramático, mas é manipulador e vingativo em uma história que pode surpreender alguns com a boa interpretação e os jogos de Mirren e McKellen, ou entediar outros com tantas explicações mastigadas.
Ficha Técnica
A Grande Mentira
Direção: Bill Condon
Elenco: Helen Mirren, Ian McKellan, Russell Tovey, Jim Carter, Mark Lewis Jones, Laurie Davidson, Phil Dunster, Lucian Msamati, Jóhannes Haukur Jóhannesson e Spike White.
Duração: 1h49min
Nota: 7,0