The Morning Show chegou com força não só pela divulgação que despertou muitos seriemaníacos e curiosos, como também é comandada por um trio do alto escalão de Hollywood e o carro-chefe do catálogo da estreia do streaming Apple TV+. Com um elenco de peso e uma premissa com alta potencialidade, a nova série criada por Kerry Ehrin e dirigida por Mimi Leder, David Frankel, Roxann Dawson, Tucker Gates e Lynn Shelton começa com alguns tropeços, mas pode ser considerada um diamante bruto da televisão, cujo processo de lapidação precisa se acelerar.
Inspirado no livro Top of the Morning: Inside the Cutthroat World of Morning TV, de Brian Stelter, a série revela os bastidores de um programa matutino de TV em um cenário competitivo. A trama apresenta Alex Levy (Jennifer Aniston), apresentadora do Morning Show, um dos programas de grande audiência e visibilidade dos EUA. O grande plot twist acontece nos minutos iniciais, quando todos recebem a notícia de que Mitch Kessler (Steve Carell) é demitido, após 15 anos na bancada ao lado de Alex, devido às acusações de assédio sexual e o movimento #MeToo. Com tal bomba, tudo vira de ponta cabeça dentro e fora do programa. De um lado, temos Alex em uma situação angustiante em que precisa noticiar o fato sobre seu colega de trabalho ao mundo. Além disso, sua carreira entra em jogo, uma vez que diretores e executivos do canal querem abafar o caso a fim de reverter a queda de audiência com uma nova roupagem e um novo rosto a frente do programa.
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Do outro lado, além das reações do público diante do escândalo, The Morning Show logo introduz a personagem Bradley Jackson (Reese Witherspoon), repórter de um pequeno canal de televisão conservador de West Virgínia, uma mulher fervorosa, um pouco impaciente e que preza pelo jornalismo sério, informativo e de qualidade. Mas quando as circunstâncias a levam diretamente para Nova York, Bradley se torna o rosto escolhido para a bancada do programa, um plano orquestrado por Alex afim de salvar sua carreira, além de firmar seu posicionamento diante dos chefões e mostrar que sua voz também dará ordens nos bastidores.
O primeiro episódio de The Morning Show apresenta um roteiro com muitas informações ao mesmo tempo e uma narrativa acelerada, ainda que o episódio tenha a longa duração de 1 hora e 3 minutos. O grande problema é que a série não sabe qual percurso irá seguir. Em um único episódio temos o escândalo, o caos nos bastidores do programa, a apresentação dos personagens, discussões sobre o que é jornalismo de qualidade, a chegada de Bradley ao Morning Show e o confronto entre as protagonistas. A partir do segundo episódio, a série dá uma freada para encontrar o seu tom e passa a explorar mais as mudanças no programa, as táticas de Alex para se manter no comando e a chegada de Bradley como a descoberta do Morning Show.
Um ponto positivo da série que, por sinal, é um dos meus favoritos, é o mergulho que se dá nos bastidores do programa matutino, revelando como cada função tem sua importância, seja um produtor, o câmera man, a maquiadora, o produtor executivo, o chefe de reportagem, entre outros. Mais do que isso, é interessante ver a correria de produzir um programa matinal que inicia na madrugada com a Alex acordando as 3h30min, com compressas nas olheiras, produção de cabelo e maquiagem, além de ficar por dentro de todas as pautas que serão abordadas no dia até o instante em que ela diz ‘Good Morning’. Junto ao caos do escândalo, os bastidores ganham um temperamento ainda mais aflorado, em que a cada dez palavras, onze são de baixo calão. Mas, sinceramente? Para aguentar um dia pesado na produção de um programa, somente muitos palavrões conseguem ajudar.
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Além disso, é interessante notar a forma como os executivos (homens) lidam com todo o escândalo, se apoiando em abafar o caso e dar um up no programa para salvar a audiência, e sem interesse em saber, de fato, o que realmente aconteceu com Mitch Kessler diante das acusações de assédio sexual. Tal demissão foi porque se importam mesmo com o movimento #MeToo? Ou porque sabem que isso irá afetar todo o conjunto próspero do programa e canal? Sabemos muito bem qual é a resposta.
Protagonismo em dose dupla
Após 15 anos do término de Friends, Jennifer Aniston volta com tudo para a televisão em uma série de grande potencial. Sua interpretação está fabulosa que faz a gente sentir falta dela nas cenas em que não está. Aniston entrega uma Alex prepotente, mas que entendemos tal prepotência, uma vez que ego masculino é tóxico e visceral no campo profissional. Ela sabe que tem nome e presença na América do Norte e usa da força da sua imagem para se manter firme diante do escândalo e amparar sua carreira que corre riscos. Alguns podem até achar estereotipado, mas os diálogos de Alex são simplesmente sensacionais e afiados, com destaque para a cena da reunião com os diretores e executivos em que ela mostra qual é a sua verdadeira posição dentro do programa.
Reese Witherspoon chega sorrateira, fazendo o público questionar como ela chegará ao lado de Jennifer Aniston dentro da trama. Mas a resposta vem de imediato. Durante a cobertura de um protesto, Bradley perde a cabeça, enquanto é gravada por um anônimo. Tal vídeo viraliza levando-a diretamente para os corredores do Morning Show, que ficam interessados nesta figura forte e espontânea. Diferente de Alex que já está moldada ao perfil do programa, Bradley é mais conservadora, preza pelo jornalismo sério, político e de minorias, mas diante da oferta que recebe, como ir contra todos os seus princípios? Aliás, uma coisa que a série força é fazer a Bradley bater de frente para que um programa mude a seu modo. Com uma proposta que poucos podem receber, será que Bradley não poderia acatar mais ao perfil do programa sem perder a sua essência que, de fato, fará a diferença nas manhãs do povo americano?
Um questionamento que a série poderá discorrer nos próximos episódios é: até que ponto Alex e Bradley ficarão em seus respectivos pedestais sem cair? Até quando Alex conseguirá manter o cargo e o poder consigo diante dos executivos? Bradley mudará por completo ou aceitará a proposta e manterá sua essência, trazendo uma nova perspectiva ao programa? Será que Bradley fica e Alex sai? Ou as duas vão bombar no Morning Show? Só aguardando para saber.
E o #MeToo?
O escândalo sobre as acusações de assédio sexual e a demissão de Mitch Kessler é o estopim que faz The Morning Show deslanchar. No entanto, o personagem de Steve Carell permanece em segundo plano, sem que ele tenha a chance de se explicar. Mais do que isso, a série ainda não explorou a fundo este importante arco que dá forma à história, o que pode ser um tiro no pé se não souberem desenvolver.
A ideia é que com a entrevista de uma das acusadoras de Mitch, a série se aprofunde nesta trama e, junto, possa trazer informações condizentes sobre as acusações e dar mais espaço para Mitch, mostrando sua vida pessoal e flashbacks de como ele era na bancada ao lado de Alex e nos bastidores do programa. É um plot que merece e precisa ser explorado.
Considerações finais
The Morning Show é uma série com força, potência e um excelente elenco que está em forma para interpretar o que há de melhor do programa. O assunto é intrigante e a atmosfera dos bastidores de um programa matutino encanta e hipnotiza. Lapidando e explorando mais e melhor os pontos certos, The Morning Show tem tudo para dar certo.
Ficha Técnica
The Morning Show
Criação: Kerry Ehrin
Direção: Mimi Leader, David Frankel, Roxann Dawson, Tucker Gates e Lynn Shelton
Elenco: Jennifer Aniston, Reese Witherspoon, Steve Carell, Billy Crudup, Mark Duplass, Gugu Mbatha Raw, Neston Carbonell, Karen Pittman, Deasean Terry, Jack Davenport, Bel Powley, Janina Gavankar, Ian Gomez, Joe Marinelli, Adina Porter, Joe Tippett, Fred Melamed, Natalia Warner e Embeth Davitz.
Duração: 1ª temporada (10 episódios)
Nota: 7,7 (3 primeiros episódios)