Em novembro do ano passado, o Pipoca na Madrugada foi convidado pela Diamond Films Brasil a assistir, em primeira mão, Os 8 Odiados, oitavo filme do brilhante Quentin Tarantino. Além de o Brasil ter sido o primeiro país a prestigiar a nova obra do diretor, a imprensa teve a honra de participar de uma coletiva com o próprio Tarantino e o ator Tim Roth, que faz parte do elenco do filme. Posso dizer que fiquei muito feliz por ter tido essa oportunidade! Agora, vamos falar do filme?
Em Os 8 Odiados, Tarantino se aventura no gênero faroeste para contar a história de oito personagens e como suas vidas se cruzam. Durante uma nevasca, o carrasco John Ruth (Kurt Russel) transporta a prisioneira Daisy Domergue (Jennifer Jason Leigh) à cidade de Red Rock para ser enforcada e ganhar a recompensa de 10 mil dólares. No caminho, os viajantes aceitam dar uma carona para ao caçador de recompensas Major Marquis Warren (Samuel L. Jackson), que está de olho em outro tesouro, e o xerife Chris Mannix (Walton Goggins) que está prestes a ser empossado em sua cidade. Devido às condições climáticas, os homens decidem se abrigar no Armazém da Minnie, onde quatro outros desconhecidos também estão abrigados. Aos poucos, os oito viajantes no local começam a descobrir os segredos de cada um, levando a um grande confronto entre eles.
O que eu mais gosto é que quando eu leio a sinopse entendo uma coisa, mas, ao assistir ao filme, a história é completamente diferente do que eu tinha imaginado. Para mim, os oito personagens seriam inimigos uns dos outros, mas teriam que se juntar para enfrentar um novo inimigo à vista. Por que eu pensei nisso? Não sei! Minha imaginação é fértil e, às vezes, tento adivinhar qual será o desenrolar (somente por ler o título) da história antes mesmo de saber. Mesmo que a trama não tenha sido essa que eu tinha imaginado, no geral, Tarantino não me desapontou. Claro, todo filme tem suas controvérsias, falhas e erros, mas os acertos vistos em Os 8 Odiados falam muito mais alto.
Desenvolvido em uma narrativa não-linear, a trama é dividida em capítulos dando a sensação de que o espectador está lendo um livro. A cada capítulo, o público acompanha a evolução da história e a apresentação de cada personagem até o momento do ápice do filme. Tarantino é muito famoso por expor diálogos longos, ricos e muito, mas muito, tensos e fortes. Os três primeiros capítulos são introdutórios, apresentam os primeiros personagens e dão os primeiros passos da trama, sendo que o terceiro capítulo chega a ser bastante longo, o que pode dar sonolência em que está assistindo. Quem já conhece o trabalho de Tarantino, sabe que ele gosta desse ritmo um pouco mais lento em suas histórias, pois é uma forma de preparar o público para o que vai acontecer. Mas quem não conhece nada do diretor e for assistir Os 8 Odiados, talvez se sinta bastante incomodado com o começo da narrativa. O mais legal é que o título de cada capítulo dá um pouco a entender o que vai acontecer dali em diante.
Outro ponto é que a história pode ser vista de forma teatral. Filmado em um único cenário e ambientado em uma nevasca quase se fim, o público se vê diante de um palco onde os atores estão encenando uma peça filmada. Por ter essa característica, o espectador, muitas vezes, consegue se ver dentro da trama ao lado dos personagens e, até mesmo, pode sentir frio, devido à nevasca ser tão real. Além disso, toda essa absorção ganha a ajuda da brilhante trilha sonora assinada pelo mestre Ennio Morricone.
O ponto forte do diretor é a estética da violência utilizada em seus filmes. Em Os 8 Odiados não seria diferente. A narrativa tem o momento certo de chocar o espectador com a tortura, a raiva e, principalmente, a vingança, porém, esse choque anestesia os olhos de quem assiste, deixando que a violência passe de forma “não tão cruel”, mas visceral.
Os odiados: herois ou vilões?
Presos em uma pequena cabana, para fugir do violento frio, é difícil saber quem é bom e quem é mal, uma vez que conhecemos pouco a faceta de cada personagem. Mas, sabe o que eu gosto do Tarantino? É que ele deixa o público se enganar para surpreender a todos na hora certa. Pode ser que alguns achem a história bem previsível (por já conhecer outras obras do diretor), mas, mesmo assim, os personagens são peças imprevisíveis que garantem a surpresa final da trama. Antes de falar um pouco de cada um, cito que há um personagem elemento surpresa na trama. Não quero ir além para não dá spoiler e estragar o filme. Outro ponto que levanta dúvidas é o título. Por que oito odiados, sendo que são nove personagens? A resposta você encontra no filme.
No filme, quatro personagens ganham o maior destaque, a começar pelo Major Marquis Warren, interpretado pelo ator Samuel L. Jackson. O bom e velho contador de histórias conquista o espectador logo de cara. De todos, ele é o que mais sofre preconceito dentro da cabana e, para sua defesa e vingança, o ex-soldado e caçador de recompensas usa do diálogo forte e tenso como arma contra aqueles que o ataca. O diálogo entre ele e o general Sanford Smithers, vivido por Bruce Dern, sem dúvidas, é o melhor dessa trama. Samuel L. Jackson não deixa a peteca cair em nenhum momento, deixando seu personagem sempre em alta relevância do começo ao fim.
Kurt Russel também não fica para trás. Na pele do carrasco John Ruth, o ator consegue levar o personagem da atenção à violência extrema, principalmente quando está ao lado de Daisy Domergue. Ele é duro, desconfiado e categórico. Não dorme no serviço e está sempre de olho em quem está ao seu redor. Russel fez um ótimo trabalho aqui. Quer saber mais sobre ele? É só assistir ao filme.
Claro que não poderia deixar de falar da mulher mais badass desse filme: Daisy Domergue. Posso dizer que a atriz Jennifer Jason Leigh fez um excelente trabalho aqui. Com um olhar quieto e assassino e utilizando tons irônicos e jocosos, a personagem desafia os carrascos da cabana e desperta vários sentimentos no espectador. Na maior parte do tempo, ela é a personagem mais torturada (e a mais coberta de sangue) do filme, mas isso não faz dela uma vítima e muito menos inocente. Mesmo levando um soco a cada minuto, Daisy continua zombando da cara de todos. Não é à toa que a atriz foi indicada ao Globo de Ouro como melhor atriz coadjuvante. Merecido.
Walton Goggins também está brilhante. Quem assistiu a série Sons of Anarchy, vai se lembrar do excelente trabalho que ele fez na pele de um travesti. Agora, interpretando o xerife Chris Mannix, Goggins confirma que é um ótimo ator. Com seu jeito presunçoso ao se intitular xerife de Red Rock e sem medir as palavras que saem de sua boca, o personagem pode irritar (de forma positiva) bastante o público, mas, no decorrer da trama, ele surpreende a todos com suas ações.
O papel que era para ser de Christopher Waltz ficou para o ator Tim Roth, o odiado mais carismático do filme. A única ressalva que faço é que queria ter visto Tim Roth mais em ação, pois seu personagem tinha bons elementos para serem desenvolvidos na trama.
Assim como ele, outros personagens também ficaram um pouco ausentes, como o cowboy Joe Cage (Michael Madsen) e Bob (Demian Bichir). Em grupo, eles se destacam e brilham, mas quando o espectador acompanha cada personagem separadamente, esses dois acabam sumindo em cena, assim como Oswaldo Mobray.
Considerações finais
Afinal, quem é vilão e quem é heroi? Tarantino deixa claro que não há essa separação. As ações e o ápice da história acontecem com um único objetivo: cada um está ali lutando por sua sobrevivência. As conseqüências são inevitáveis. Por isso, o final de Os 8 Odiados é bom e surpreende.
Os 8 Odiados é um filme longo, com uma narrativa não-linear que pode incomodar algumas pessoas com o seu ritmo lento e previsível. Mas, não se prenda a isso. Quentin Tarantino faz excelente trabalho aqui em sua penúltima obra e, com certeza, vale muito a pena assistir. Durante a coletiva de imprensa, Tarantino revelou ter muita vontade em trabalhar com Johnny Depp e Kate Winslet. Já pensou? Se isso acontecer, será simplesmente épico! Espero que aconteça!
E aí, quem já viu Os 8 Odiados? Deixem nos comentários!
Ficha Técnica
Os 8 Odiados
Direção: Quentin Tarantino
Elenco: Samuel L. Jackson, Kurt Russel, Jennifer Jason Leigh, Tim Roth, Walton Goggins, Michael Madsen, Demian Bichir, Bruce Dern e Channing Tatum.
Duração: 2h48min
Nota: 9,0