Antes de dar início a uma breve crítica à série, já posso responder que SIM, vale a pena assistir Mindhunter, principalmente se você é fã sobre filmes, livros e séries que abordam sobre a psicopatia e as mentes criminosas. Baseado no livro Mind Hunter: Inside the FBI’s Elite Serial Crime Unit, escrito por John E. Douglas e Mark Olshaker, a nova série original da Netflix produzida por David Fincher e Charlize Theron vai nos contar a história dos agentes especiais do FBI, Holden Ford (Jonathan Groff) e William (Bill) Tench (Holt McCallany) que, em 1977, deu início a uma série de entrevistas com assassinos em série presos a fim de iniciar uma pesquisa para traçar perfis dos assassinos, além de resolver casos em andamento.
Mas o que torna essa série tão formidável e tentadora de assistir? Mindhunter tem como proposta uma visão acadêmica e científica em criar uma metodologia para entender o comportamento e a mente dos psicopatas. Ou seja, a série nos mostra como foi criado o “manual” dos termos para traçar o perfil de um assassino. Não vou enganar vocês: Mindhunter é uma série que merece sua atenção e um pouco de paciência devido a uma narrativa lenta que tem como foco o desenvolvimento dos personagens principais e não em nos apresentar um vilão que irá desafiar os agentes durante os dez episódios. Mas isso não significa que a trama é cansativa ou chata, muito pelo contrário, ela é instigante e sempre deixa um cliffhanger perfeito que te prende para o próximo episódio até o final da temporada. Eu levei uma semana para assistir, justamente para poder absorver bem essa trama complexa e pesada, afinal, falar de serial killer mexe com a cabeça e a série relata muito bem isso.
O primeiro episódio é longo, bem introdutório e essencial, pois ele cria uma espécie de base para nos mostrar o que a série irá desenvolver. Logo na season premiere, a série aborda os tipos de crimes que existem, mas sempre indagando em como, porque e quem fez. Além disso, inicia-se uma introdução à psicologia criminal dentro da polícia que, naquela época (década de 70) não era um assunto muito discutido e muito bem visto. “Se você estuda isso, você é um homem desencaminhado”. Entendem o que eu quero dizer? Infelizmente, há um grande preconceito por trás que tanto Holden quanto Bill têm como objetivo quebrar essa parede aos poucos para iniciar o estudo que responderá as seguintes perguntas: nasce um criminoso ou se forma um criminoso? O que leva uma pessoa a matar outra?
O roteiro de Mindhunter apresenta três arcos que caminham paralelamente, mas que em algum momento se encontram de forma sutil e no timing certo. O primeiro arco traz os agentes especiais entrevistando os assassinos; o segundo apresenta os casos isolados de assassinatos que acontecem nas cidades em que Holden e Bill vão para entrevistar os assassinos, além de dar aulas em outros departamentos da polícia; o terceiro arco apenas introduz sorrateiramente (sem apresentar com profundidade) os primeiros passos de um possível serial killer, interpretado por Sonny Vallicenti. Tudo indica que o ator dará vida ao BTK Killer, um assassino que aterrorizou os Estados Unidos por 30 anos. Acredito que o personagem será mais explorado na 2ª temporada e ainda desafiará bastante o FBI.
Outro ponto positivo da série são os excelentes diálogos que, além de complexos e intrigantes, são bastante pesados. Mindhunter detalha o trabalho de pesquisa e revela como surgem os primeiros termos para identificar e categorizar os tipos de assassinos e a razão que os levaram a matar suas vítimas. Aqui vamos ouvir pela primeira vez os agentes falar ‘serial killer’, ‘crime passional’, ‘crime sob efeito de estresse’, ‘crime organizado e desorganizado’ e assim por diante. Um dos diálogos que mais me chamou a atenção é quando explicam o termo “orelha a orelha” que, na verdade não é uma expressão, e sim uma instrução de como matar uma pessoa. Assim como eu achei formidável, tal diálogo assusta pelo fato de ensinar uma forma de executar uma pessoa.
Os famosos serial killers
Não quero entrar em detalhes a respeito dos assassinos que são apresentados, mas posso dizer que eles dão aquele gás na série. Em Mindhunter vamos conhecer um pouco da história de Ed Kemper (Cameron Britton), Monte Rissell (Sam Strike), Jerome Brudos (Happy Anderson) e Richard Speck (Jack Erdie). Aliás, até vale a pena pesquisar sobre esses serial killers e ver o que os da vida real fizeram. O mais interessante é que esses assassinos ajudam a abrir a mente de Holden e Bill e a bater de frente com o preconceito e o conservadorismo dessa época. De todos, os que mais me chamaram a atenção são Kemper e Brudos.
Os mindhunters
Interpretado por Jonathan Groff, Holden Ford é o protagonista e o que conecta tudo a todos. De todos, Holden é o que apresenta uma transformação radical do primeiro ao último episódio, mas que tal mudança ocorre de forma sutil e progressiva. No primeiro episódio, vemos um Holden mais conservador, tímido e trabalhando apenas como um negociante de sequestro. Assim que ele dá início ao estudo sobre a mente criminosa e passa a entrevistar os assassinos, sua personalidade muda, uma vez que ele veste a ‘carapuça do monstro’ para entender e falar a mesma língua que ele, o que choca tanto os demais personagens quanto quem está assistindo. Além disso, o telespectador também questiona até que ponto essas entrevistas estão afetando a mente do agente especial, uma vez que as coisas começam a mudar no seu relacionamento com Debbie (Hannah Gross) e a forma como ele discute com Bill e Wendy Carr, revelando um lado mais egocêntrico do protagonista.
Holt McCallany é Bill Tench, agente veterano do FBI que trabalha e dá aulas sobre o comportamento humano. Junto com Holden, ele passa a entrevistar os assassinos, mas de forma mais prática a nada maleável, para que o seu entrevistado não se sinta confortável demais a ponto de abusar de sua paciência. Ele é o responsável por puxar as rédeas de Holden quando o agente está prestes a ultrapassar certos limites dentro do FBI. Um ponto interessante é que Bill tem um filho adotivo que não fala e muito menos demonstra algum contato afetivo, o que levanta certas suspeitas com relação ao seu comportamento. A série não se aprofunda nesse plot, mas dá pequenas pinceladas que poderão ser exploradas em uma nova temporada.
Se vocês estavam com saudades de Anna Torv (da série Fringe), essa é a sua oportunidade de vê-la novamente. A atriz interpreta uma psicóloga criminal que ajuda e dá assistência a vítimas de abuso e outros traumas. Wendy é quem planta a semente na cabeça de Holden e Bill para iniciar o estudo sobre a mente criminosa, já que eles estão entrevistando famosos serial killers dos Estados Unidos. Wendy é bastante reservada, uma vez que sua vida pessoal pode causar algum tipo de atrito com o FBI. A série apenas pincela sobre a personagem fora do ambiente de trabalho, mas espero que Wendy ganhe mais espaço na próxima temporada. Aliás, algo muito intrigante acontece: toda noite, ela desce até o andar onde lava a roupa e deixa uma lata de atum para o gato comer. No entanto, não se sabe se é um gato que come, já que o bichinho nunca dá as caras. Seria o gato ou uma pessoa quem come o atum? Fica aí o mistério.
Considerações finais
Mindhunter é uma excelente série que tem como foco a origem e a análise da mente criminosa, mas mais do que isso, a série tem como objetivo de desenvolver seus ótimos personagens ao invés de nos dar um antagonista que os desafiará. A ausência de ação deixa o ritmo da série mais lento, mas não se deixe levar por isso. Assista Mindhunter com a ideia de que acompanhará um estudo formidável a partir dos pontos de vista de personagens bem estruturados e consistentes. Todos os elementos prenderão a sua atenção do primeiro ao último episódio e ainda vão te deixar com um gostinho de quero mais. Aliás, a 2ª temporada da série já está garantida e, de acordo com uma entrevista de David Fincher dada à Billboard, a nova temporada abordará os assassinatos de crianças em Atlanta que chocaram os EUA entre 1979 e 1981. Agora é esperar para saber quando será o lançamento. Enquanto isso, assista a primeira temporada porque ela não vai te desagradar.
Ficha Técnica
Mindhunter
Criado por: Joe Penhall
Direção: David Fincher, Asif Kapadia, Tobias Lindholm e Andrew Douglas.
Elenco: Jonathan Groff, Holt McCallany, Anna Torv, Hannah Gross, Cotter Smith, Cameron Britton, Sonny Vallicenti, Happy Anderson, Jack Erdie, Stacey Roca, Joe Tuttle, Alex Morf, Joseph Cross, Marc Kudisch, Michael Park, Sam Strike, George R. Sheffey, Duke Lafoon e Peter Murnik.
Duração: 1ª temporada – 10 episódios
Nota: 9,5