Um Lugar Silencioso: Dia Um (A Quiet Place: Day One) leva o público de volta ao universo apocalíptico para mostrar como este silêncio inquietante foi imposto à sociedade. Enquanto os dois primeiros longas criam uma excelente atmosfera aterrorizante e angustiante, este spin-off de origem caminha para uma catástrofe inicial, com momentos sufocantes e bons sustos, em uma narrativa que se bifurca entre o horror e o drama com sentimentalismo em meio ao desastre iminente.
É um filme que caminha de forma independente e apresenta uma vertente autêntica dentro deste universo já construído. Há sustos e uma boa dose de tensão, guiados pela emoção inesperada ao final. Talvez isso possa dividir as opiniões, mas é um filme que consegue ser respeitar o universo, dando um toque especial à fórmula já conhecida.
Um Lugar Silencioso: Dia Um se passa em Nova York, no primeiro dia em que o silêncio dominou. Os acontecimentos ocorrem paralelamente ao flashback inicial de Um Lugar Silencioso 2, onde vemos tudo começar com a família Abbott em uma pacata cidade do interior dos EUA.
Com a trama do spin-off situada dentro do universo dos filmes, a história acompanha Samira, que passa os seus dias em uma clínica. Ela não é a maior fã do local, muito menos gosta de compartilhar seus pensamentos e sentimentos nas rodas de grupo, mas se esforça para participar. Ela tem o gato de estimação Frodo, seu amigo inseparável que lhe ajuda emocionalmente, além do apoio do amigo Reuben (Alex Wolff).
Quando a clínica leva o grupo para um passeio em Nova York, o que era para ser um momento descontraído e relaxante, se torna o início de um pesadelo sem fim, quando todos assistem ao bombardeio no céu e a chegada dos monstros alienígenas. A cidade barulhenta torna-se o prato cheio para estes seres horripilantes.
Crítica: Um Lugar Silencioso 2
Agora, resta para Samira sobreviver em meio ao caos, em que o silêncio se torna a mais importante arma e regra. Mas no meio do caminho, ela conta com a ajuda de algumas pessoas, como é o caso de Eric e Henri, enquanto aprendem a se adaptar e lidar com o novo e cruel. Mas resta saber se a sociedade também conseguirá enfrentar este horror que só está começando.
Um Lugar Silencioso: Dia Um é o início de tudo, portanto, esqueça as regras e táticas estabelecidas nos filmes anteriores, uma vez que aqueles personagens são veteranos neste universo pós-apocalíptico. Aqui, o amadorismo é a maior atmosfera e isso é feito de forma proposital, afinal, não se sabe com o que está lidando, de onde veio estes alienígenas e como derrotá-los.
Por isso, não espere por respostas sobre a origem destes seres ou explicações mais coerentes. A única e imediata resposta que tanto o público quanto os personagens têm é que o silêncio é o remédio para se salvar, uma vez que a audição é o sentido mais agudo para estes seres atacarem o que estiver pela frente.
Outro ponto bem estabelecido neste início apocalíptico são os constantes barulhos, desde acidentais, até choros e gritos abafados forçadamente até não aguentarem mais. Há táticas diferentes e aplicadas, como o barulho da chuva usada para que os poucos diálogos aconteçam, assim como outros tipos de sons, afim de não atrair os monstros. Além disso, a água é outro método de proteção às pessoas, que geram efeitos irreversíveis aos alienígenas.
Por fim, temos a presença iminente e nítida dos monstros com o intuito de desenhar a atmosfera de horror e angústia sobre o desconhecido. Digo isso, pois nos longas anteriores, a presença destes alienígenas é reduzida, afim de aumentar a tensão e o medo sobre o que está prestes a acontecer, caso o silêncio seja quebrado.
Aliás, o trabalho de som neste spin-off continua bom e vai se refinando à medida que o mundo vai entendendo as táticas de como agir e reagir a partir deste “novo”, ou seja, há momentos caóticos, barulhentos diante do desespero e amadorismo, cujo som vai se reduzindo, sofrendo algumas recaídas quando o medo fala mais alto ou a coragem move o personagem a ter uma atitude mais radical com o objetivo de evoluir a história.
Um Lugar Silencioso: Dia Um respeita o universo criado, assim como a fórmula já vista, mas ousa na narrativa ao entregar drama e emoção em meio ao horror iniciante. É comum vermos em histórias pós-apocalípticas – como The Walking Dead, Fallout, – o mal sucumbir o ser humano, enquanto o monstro deixa de ser o maior problema. O egoísmo, a violência, o poder e controle se tornam as válvulas principais para guerras que levam a uma sociedade fragmentada, fraturada ou dizimada.
Aqui, o spin-off cria a sua autenticidade ao ir ao contrário do que já foi visto em tramas pós-apocalípticas. O filme mostra que em meio ao mal, desconhecido, descontrole e medo do que pode acontecer, é possível encontrar sentimento e gentileza vindas de lugares ou pessoas que nunca vimos ou conhecemos.
Boa parte do filme é protagonizado por Lupita Nyong’o que entrega uma atuação crua, forte e genuína como Samira. Mesmo vulnerável à sua condição, ela encontra forças para se proteger, ajudar quem encontra no caminho e ainda a realizar o seu tão esperado desejo de comer pizza, afinal, ela não sabe se o amanhã nascerá. E sim, há um significado forte e lindo em torno da pizza e o fato da protagonista correr o risco de ir até o local desejado para ter a sua específica refeição.
A parceria de Samira e Eric é outro grande acerto que faz o filme caminhar em uma desenvoltura sensível mesclando medo, gentileza, carinho, respeito, apoio e poucos e bons alívios cômicos. Enquanto Samira mostra coragem e até tenta seguir sozinha, Eric estampa em suas camadas o medo crescente diante do horror, além da solidão. Joseph Quinn entrega uma atuação singela em que nada fica a desejar.
Quando cada um entende a vulnerabilidade do outro, ambos estendem as mãos em nome da gentileza e da chance de sair desta situação, seja para continuar vivendo ou para ter o seu desejo realizado. O espectador se sensibiliza com a construção da coragem de Eric, que quebra a barreira do medo que lhe paralisa; e a desconstrução do “escudo” que protege Samira, que tinha tudo para ser egoísta (e ela tinha este direito), mas escolhe não seguir por este caminho.
Outra grande estrela de Um Lugar Silencioso: Dia Um é o gato Frodo – interpretado por dois gatos – que se torna o apoio emocional dos personagens, que lutam e se arriscam para manter o bichinho de estimação em segurança. Frodo rouba a cena e aprende as táticas do silêncio mais rápido que o homem.
Dijmon Houson é Henri, o personagem que conecta os filmes deste universo. Enquanto em Um Lugar Silencioso 2, vemos ele ajudando Evelyn e Lee, no spin-off, vemos sua primeira aparição ao ajudar Samira e, consequentemente, entendemos como ele sobreviveu até os dias atuais do segundo filme.
Considerações finais
A reta final de Um Lugar Silencioso: Dia Um vai ao ápice da emoção e tensão, que caminham paralelamente, em uma sequência de decisões difíceis e altruístas que abrem portas ao recomeço neste novo mundo, ou ao destino já escrito.
Um Lugar Silencioso: Dia Um se conecta ao universo compartilhado, respeita a ambientação e fórmulas construídas nos filmes anteriores, mas ganha autenticidade ao trazer uma perspectiva mais dramática e emocionante em meio ao cenário aterrorizante e angustiante. Você recebe uma proposta de suspense e horror, e se surpreende ao ganhar emoção na medida certa.
PS: Não há cena pós-créditos
Ficha Técnica
Um Lugar Silencioso: Dia Um
Direção: Michael Sarnoski
Elenco: Lupita Nyong’o, Joseph Quinn, Alex Wolff e Djimon Hounson.
Duração: 1h40min
Nota: 3,9/5,0