Hereditário (Hereditary) é mais um filme que foge completamente do terror estereotipado. É aterrorizante sim, mas também é inteligente por trazer uma trama instigante que obriga o público a pensar e ligar os pontos para entender a proposta sugerida. O fato de elaborar uma história quebra-cabeça torna o filme peculiar e até formidável. No entanto, Hereditário não é o tipo de terror que cai no meu gosto. E se você espera um filme que te dê sustos e sequências terríveis que vão fazer você pular da cadeira, este filme não é a melhor opção e eu vou explicar o porquê.
Na trama dirigida por Ari Aster, após a morte da reclusa avó, a família Graham começa a desvendar alguns mistérios da família. A presença da matriarca ainda permanece entre os familiares, como uma sombra, especialmente sobre a solitária neta Charlie, por quem ela sempre teve uma fascinação nada usual. Com um crescente terror tomando conta da casa, a família explora lugares mais escuros para escapar do infeliz destino que herdaram.
Como disse anteriormente, eu não faço parte do público deste filme, uma vez que prefiro filmes de terror mais imaginativos, dinâmicos e sugestivos, que mexem com o nosso medo e utilizam de bons jump scares – como é o caso de Invocação do Mal e Quando As Luzes Se Apagam. No entanto, isso não faz de Hereditário um filme ruim. Pelo contrário, a trama consegue prender a atenção por saber costurar bem uma narrativa intrigante que, aos poucos, entregam pistas que tornam a história horripilante no instante em que o espectador passa a decifrá-la. Um pouco aleatório, o primeiro ato é simples, apresentando os personagens e a premissa. A família precisa lidar com uma recente perda que culmina em uma série de eventos estranhos que contaminam as ações dos personagens, sem que o público entenda de imediato o que está acontecendo.
Logo neste primeiro ato, há uma reviravolta que, para mim, é bastante inesperada, mas que desencadeia circunstâncias macabras, mexendo com o psicológico de cada membro da família. A partir desse plot twist, Hereditário começa a deixar mensagens subliminares por meio de atitudes e diálogos que, a princípio, podem não fazer muito sentido. No entanto, é preciso saber que nada no filme é por acaso, pois cada frase dita há uma dica para que você entenda o que está acontecendo no ambiente. Ao juntar as peças, o espectador compreende com nitidez a razão de tudo o que aconteceu, tornando o filme bem interessante.
Além da proposta de montar o quebra-cabeça para desvendarmos o que está por trás da trama, o filme nada mais é do que uma história sobre luto, perda, inconformidade, aceitação, vulnerabilidade, escolha e destino traçado. Há cenas boas e pesadas ao estilo “sessão de descarrego” e “terapia” em que os personagens colocam para fora suas angústias, medos e frustrações, além do que a própria casa reflete sobre eles.
O filme faz questão de enfatizar o trabalho da personagem Annie, criadora de maquetes. Em alguns momentos você a verá montando algumas cenas do próprio filme. Talvez você pergunte: “O que significa essas maquetes?”. Seria uma força maior manipulando tudo o que acontece em volta? Uma pegadinha? Um sonho? Apenas uma loucura? Assim que a última peça do quebra-cabeça é encaixada, até o título do filme fará um sentido melhor.
Personagens
Toni Collette mergulha de cabeça na personagem, entregando uma Annie inflexível ao lidar com o luto. Ela sabe o que está acontecendo, mas ao mesmo tempo não sabe ou não quer acreditar. Os melhores diálogos são dela, isso sem falar nas expressões extraordinárias que a atriz faz com o rosto e o corpo, dispensando qualquer tipo de explicação.
Alex Wolff e Milly Shapiro são presenças marcantes e enigmáticas no filme que, à medida que você mergulha na história, uma nova descoberta é feita sobre Peter e Charlie, personagens estranhos e peculiares. Não posso dizer muita coisa sobre eles, pois seria spoiler.
Considerações finais
Hereditário entrega uma premissa que instiga e angustia o espectador. A narrativa é crescente e, aos poucos, oferece pistas para decifrar o que está por trás de tudo o que acontece na tela. É um terror que sabe criar uma atmosfera densa de medo e suspense, sem a utilização de jump scares ou outros gatilhos baratos para amedrontar. O medo é relativo, por isso não espere tanto de Hereditário nesse quesito, que está mais para um longa diabólico em suas camadas do que, de fato, um filme apenas para assustar.
Hereditário é bom, inteligente e voltado para um público mais específico do gênero terror. Pense nisso antes de ir assistir para não se sentir tão decepcionado.
Ficha Técnica
Hereditário
Direção: Ari Aster
Elenco: Toni Collette, Alex Wolff, Milly Shapiro, Gabriel Byrne e Ann Dowd.
Duração: 2h06min
Nota: 7,0