Mais uma temporada da antologia American Crime Story chega ao fim após contar sobre o assassinato de Gianni Versace, afinal esse é o título, certo? Lá no texto em que dou as minhas primeiras impressões, eu disse que a série apresentaria uma narrativa focada no assassino e não no estilista, ou seja, eu já esperava um conteúdo mais inchado sobre o personagem de Darren Criss. No entanto, acredito que muitos estejam desapontados com o rumo que a série tomou, afinal, vimos muito mais sobre a trama do criminoso do que a tragédia com Versace que, aliás, foi exibida nos dois primeiros episódios que são sensacionais. Também disse que a narrativa dessa temporada seria não linear e ACS Versace acertou em cheio ao construir uma história regressiva bem detalhada, sem deixar grandes buracos. Disso eu não tenho do que reclamar. Mas afinal, o que teve de bom e de ‘mais ou menos’ nesses nove episódios que se perdurou?
Muito Cunanan e pouco Versace
Durante uns quatro episódios, a série ficou completamente voltada para os assassinatos que antecederam a morte de Gianni Versace. No decorrer dos episódios de quase uma hora de duração, vimos o que realmente aconteceu com as vítimas Lee Miglin, Jeff Trail e David Madson, desde a primeira vez que Andrew entrou no caminho de cada um até o instante em que essas vidas foram tiradas friamente. Quem conhece a história original, pode dizer que a série conseguiu ser bem fiel aos fatos, mudando apenas algumas coisas na tentativa de amenizar a violência – como é o caso da morte de Lee que é extremamente chocante.
A série também teve como objetivo mostrar como começou o relacionamento de Andrew com David e Jeff, seguido de muitas mentiras e manipulações, afinal, um dos pontos fortes do antagonista é ser o centro das atenções, saber o que os outros estão pensando a seu respeito e, é claro, ser amado por todos eles. Rejeição é uma palavra que está fora do vocabulário de Cunanan, mas que rodeia a sua vida constantemente e molda, aos poucos, a psicopatia do personagem. Aliás, são esses episódios que constroem a personalidade estranha e o lado doentio de Cunanan, o que eu achei formidável e não me cansou nenhum pouco. Se você gosta de histórias sobre seriais killers e psicopatas, American Crime Story: O Assassinato de Gianni Versace pode entrar para a sua lista, pois neste quesito a série não fica a desejar.
Outro ponto que também achei legal é quando a série foca na época em que Andrew passa a ser um garoto de programa e se envolve com dois senhores mais velhos e muito ricos. Aqui, o espírito de grandeza, riqueza e ambição é ainda mais alimentado no vilão, uma vez que ele tem a oportunidade de sentir o gosto do poder do dinheiro e conquistar as pessoas que ele deseja ter ao seu lado. Mas, por pensar somente em si e em seus desejos, Andrew cutuca e fere todos aqueles que estão ao redor, como é o caso de Norman (Michael Nori) que se sente usado pelo rapaz após a morte de seu companheiro Lincoln (Todd Waring); Jeff que é traído após Andrew revelar à família que o ex da Marinha é homossexual; e David que se sente sufocado e pressionado por não poder corresponder ao amor doentio de Andrew. Ao se cruzarem, todos esses pontos moldam um grande ápice trágico da série, fechando muito bem esses arcos.
ACS Versace: saiba quem são as pessoas que deram origem aos personagens da série
Enquanto o telespectador acompanha todo esse emaranhado da vida de Andrew Cunanan, infelizmente a série deixa de lado o arco da família Versace. A presença dos atores Edgar Ramirez, Penélope Cruz e Ricky Martin é reduzida drasticamente e, talvez, seja isso que tenha decepcionado o público, afinal, um elenco forte como esse deveria ser bem mais explorado. Eu entendo perfeitamente que o objetivo da temporada era contar a história sob o ponto de vista da vida do antagonista, mas será que não havia a possibilidade de aumentar o arco de Gianni, Donatella e Antonio?
Há muitos pontos que a série poderia ter abordado mais e melhor (junto com a de Andrew), mas que ficaram apenas na superficialidade, como por exemplo, a relação de Gianni e Antonio. Em um dos episódios, Gianni quer deixar claro para o mundo que é gay e tem uma relação de 13 anos com o seu parceiro. Porém, o que apenas mostram é a discussão com Donatella e uma entrevista em que o estilista fala sobre o seu relacionamento e sua sexualidade, mas de forma bem rasa.
Outro ponto que poderia ter mais camadas complexas é a relação fraternal de Gianni e Donatella. As poucas cenas dos dois são ótimas, mas não passa de um aperitivo na série. A temporada poderia ter mostrado mais sobre a infância dos irmãos e como eles se apaixonaram pela moda e costura (até mostra, mas é pouquíssimo).
Origem do psicopata
O episódio Creator/Destroyer mostra que graças à fraqueza mental da mãe, Mary Ann Cunanan (Joanna Adler) e a ambição e a grandeza desenfreada do pai, Modesto Cunanan (Jon Jon Briones) foram os principais gatilhos que moldaram Andrew. Lembra quando o rapaz conta para as pessoas que sua mãe trabalhava em uma editora e o seu pai era corretor de bolsas na famosa empresa Merrill Lynch? Tudo leva a crer que a história não passa de uma grande mentira criada pelo antagonista, mas a verdade é que Modesto é o responsável por alimentar essa ilusão na mente do filho. Desde pequeno, Andrew é tratado como uma criança rica, tendo tudo do bom e do melhor, muito mais que seus irmãos. A história de ficar com o maior quarto da casa é a pura verdade e a maneira como Modesto cuida da educação e do comportamento do filho chega a ser absurda e completamente fora do normal. A forma de conversar, se reportar às pessoas e conquistá-las por meio da lábia não passa de um ensinamento um tanto quanto estranho do pai. Aliás, a figura paterna é o grande ponto fraco de Andrew.
Considerações finais
O episódio Alone traz um desfecho bom e satisfatório, pois mostra o final trágico de Gianni que ressalta o grande amor e reconhecimento do estilista pelo mundo. Em contrapartida, o final de Andrew (como todos sabem) culmina com a solidão, tristeza e o declínio de tudo o que ele tentou conquistar. Andrew ganha um desfecho perfeito: o de chamar a atenção de todo mundo e ser rejeitado por todos.
American Crime Story: O Assassinato de Gianni Versace é uma temporada boa e que vai agradar mais as pessoas que gostam de histórias sobre psicopatia. Darren Criss está excelente na pele de Andrew e acredito que o ator concorra em futuras premiações com o seu personagem. Agora, quem espera mais sobre a história do estilista Gianni Versace, sinto dizer que a série decepciona justamente por não criar um arco mais forte à família Versace e por não explorar os personagens, muito menos os talentos de Penelope Cruz, Edgar Ramirez e Ricky Martin. Mesmo com essas ressalvas, é uma história que vale a pena acompanhar.
Ficha Técnica
American Crime Story: O Assassinato de Gianni Versace
Criado: Ryan Murphy, Larry Karaszewski e Scott Alexander
Elenco: Édgar Ramirez, Darren Criss, Penélope Cruz, Ricky Martin, Max Greenfield, Dascha Polanco Judith Light, Finn Wittrock, Cody Fern, Mike Farrell, Joanna Adler, Jon Jon Briones, Michael Nori, Annaleigh Ashford, Todd Waring, Terry Sweeney, Edouard Holdener, Isa Briones e Carlin James.
Duração: 1ª temporada – 09 episódios
Nota: 8,0
Fotos: IMDB