E se você pudesse deletar alguém da sua vida literalmente? E se um simples clique de uma câmera fizesse qualquer pessoa desaparecer, quem você escolheria? Uma pergunta intrigante que revela o lado mais sombrio da natureza humana.
Esta é a premissa de Delete, a nova série tailandesa da Netflix, que chama a atenção com uma proposta instigante, desafia a atenção do espectador com uma narrativa um pouco lenta, cujas respostas são surpreendentes e aparecem aos poucos, entregando um desfecho aberto e arrebatador para uma futura 2ª temporada. Dei a chance, gostei e, agora, digo o porquê vale a pena assistir esta produção.
******CONTÊM SPOILERS******
Com direção e roteiro assinados por Oh-Parkpoom Wongpoom, Delete acompanha Aim e Lily, que são amantes e estão cansados e infelizes em seus originais relacionamentos. Um dia, ao entrar em um supermercado, Lily é surpreendida por uma garota que pede para que tire uma foto sua. Ao apertar o botão, Lily vê a menina literalmente sumir da sua frente como um passe de mágica.
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Ao ver o que este celular é capaz de fazer, Aim e Lily começam a pensar na possibilidade de usá-lo para “apagar” os parceiros e começar uma vida juntos. Mas as coisas não saem exatamente do jeito que eles querem e, para deixar tudo ainda pior, Lily desaparece misteriosamente. Fica a pergunta: será que Lily foi deletada? E quem a apagaria?

Delete tem oito episódios de 45 a 50 minutos e até a metade da temporada, a série apresenta uma narrativa mais lenta, na qual apresenta as primeiras peças deste quebra-cabeça a fim de que o público tenha a primeira visão da construção narrativa e compreenda os primeiros parâmetros da história e como ela será guiada. A partir do 5º episódio, a série engrena de vez e deixa o desenvolvimento mais dinâmico ao entregar as respostas que preenchem as lacunas do que foi apresentado no início. Ou seja, nem tudo o que vemos é exatamente como é. A desconfiança é o principal elemento desta história, cujo caráter de cada personagem é provocado e testado a todo o momento. Aliás, a forma como a narrativa é montada faz lembrar da minissérie Clickbait, também da Netflix.

De um lado, conhecemos a relação extraconjugal de Aim e Lily, que desejam ficar juntos. Paralelamente, vemos o relacionamento de longa data de Aim (Nat Kitcharit), um escritor de sucesso, com Orn (Chutimon Chuengcharoensukying), uma fotógrafa promissora que sempre apoiou o namorado e construiu uma vida ao seu lado, enquanto cuida da mãe que tem Alzheimer. Posso dizer que, da parte de Orn, seus sentimentos sempre foram limpos e verdadeiros, enquanto que o de Aim são duvidosos, o que o leva a ter atitudes bastante julgáveis na qual o espectador não consegue passar pano. É um personagem sonso e irritante até o último minuto, que vai testar a paciência do público. Mesmo sendo completamente errado, Aim ainda consegue ter um pouco de razão sobre certos pontos.
Do outro lado, conhecemos o casamento de Lily (Sarika Sartsilpsupa) e Too (Natara Nopparatayapon), em que o marido apresenta camadas bem misteriosas. Ora ele demonstra ser frio, calculista e possivelmente violento, mesmo nunca encostando um dedo na esposa; ora ele demonstra amor, carinho e muito afeto mesmo quando a situação o encurrala, premeditando quem ele pode perder e ter que aceitar tal destino. E se tem um personagem que transborda desconfiança é o Too.
Lado sombrio da natureza humana

A trama engata de primeira quando o celular ‘mágico’ aparece em cena e faz suas primeiras vítimas, apresentando mais personagens que complementam esta narrativa espiral e complexa a cada volta que dá. Quando a Lily desaparece misteriosamente, os principais se tornam suspeitos sob o olhar do policial encarregado da investigação (Nopachai Chaiyanam), que não hesita em interrogar marido e amante, que têm motivos para deletar alguém.
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O tempo todo, Delete coloca o seu toque de terror não somente no ato de deletar alguém, mas sim na capacidade de uma pessoa ter a coragem de apagar outra literalmente, o que coloca em jogo a natureza humana e o caráter de cada um. É normal o espectador ficar dividido com os personagens, sendo que a cada momento eles dão um motivo plausível ou não para tomar esta decisão, seja para acabar com algum sofrimento cíclico; apagar quem faz o mal aos outros; tirar do caminho algo ou alguém considerado um empecilho; ou, até mesmo, para recuperar ou salvar a vida de alguém em um momento de desespero.
O ato de deletar faz a história ganhar mais camadas diante da ação dos personagens, que deixa suas atitudes mais dúbias até o último minuto. Ou seja, o público saberá quem realmente está está dizendo a verdade apenas no final da temporada.

Outra personagem que ganha um bom destaque na série é a June (Charlette Wasita Hermenau), irmã de Too e cunhada de Lily. A jovem é uma estudante de um internato que se vê muito isolada e solitária. Ela nutre sentimentos por Lily, enquanto gosta de roubar objetos alheios. A série não confirma, mas acredita-se que June é cleptomaníaca, o que a faz colocar as mãos no celular e criar um caos ainda maior na história, ao mesmo tempo que ela descobre segredos sombrios que jamais imaginou que estaria lhe rodeando.
Já a Orn é uma personagem que aparece bem pouco, apenas no primeiro episódio e no final, uma vez que ela é deletada pelo namorado Aim. À medida que a série entrega mais informações e flashbacks sobre a Orn, mais o público fica ciente do quão esta personagem é injustiçada, enquanto a raiva e a repulsa por Aim cresce cada vez mais. A partir daqui, é até possível relevar qualquer atitude de Orn diante do que ela sofreu.
Verdadeiro caos

Um ponto que Delete não explica nesta 1ª temporada é a origem deste celular capaz de apagar as pessoas. De onde veio? Como este aparelho foi parar nas mãos da garota do supermercado, Claire? Onde ela o encontrou? Quem, de fato, foi a primeira vítima a ser deletada?
A partir do 5º episódio, as primeiras respostas começam a surgir, uma vez que descobrimos que Lily não foi deletada e, sim, sequestrada pelo policial encarregado da investigação. Na verdade, ele é o pai de Clare, a garota deletada por Lily no primeiro episódio. Desesperado para recuperar a filha, o policial sabe que se deletar a pessoa responsável por ter apagado a outra pessoa, a mesma volta à vida real. Ou seja, para Claire retornar, Lily terá que ser deletada.
Os pais de Claire descobriram como faz as pessoas deletadas retornarem, pois a mãe – que trabalha em um hospital – viu a filha deletar pacientes desenganados que já não queriam mais viver. Ao ver o erro que cometeu e sua consciência muito pesada, Claire toma a decisão de ser deletada, o que faz o espectador entender a cena do supermercado no 1º episódio, quando Lily a deleta, originando esta rede de segredos caótica.
Para salvar a Lily, Too inicia uma caçada desenfreada pelo policial, especialmente depois de descobrir toda a verdade. Ao ver que Lily, de fato, foi deletada (e ela está grávida, mas o filho é do Aim), Too não hesita e, durante uma briga acirrada e com a ajuda do Aim, deleta o policial. E para não deixar vestígios, ele deleta a mãe, enquanto Claire consegue fugir.
Ao ver todo o esforço e o amor de Too, especialmente quando ele faz tudo isso e diz que quer criar o filho que Lily carrega, a protagonista faz a sua escolha e decide dar continuidade ao casamento e termina o relacionamento com Aim, que insiste que a amada está fazendo a escolha errada.
Desolado e inconformado, Aim percebe o grande erro que cometeu ao deletar Orn, especialmente quando descobre que ela ia pedi-lo em casamento. Assim, ele decide revelar toda a verdade à imprensa sobre a origem de seu livro (que é tudo mentira) e, logo em seguida, pede para Too deletá-lo. Lily tenta impedir tal atitude, mas chega tarde demais ao ver que Aim foi deletado e a Orn voltou.
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Sem entender o que realmente aconteceu, Orn lembra que havia instalado uma câmera na casa para flagrar o marido com Lily. Ao assistir a gravação, ela descobre que Aim a deletou, o que faz Orn sentir raiva e mágoa pelo ex-namorado. Se depender dela, Aim não volta mais. Ela pode se vingar de Lily e, até mesmo, fazer algum acordo com Too em uma possível 2ª temporada.
O verdadeiro vilão

Afinal, quem é o verdadeiro vilão desta história? O celular que apaga as pessoas ou quem manuseia tal objeto? Delete mostra que as camadas desta história são mais profundas do que o espectador imaginava e o último episódio entrega um gancho arrebatador e com mais perguntas a serem respondidas.
A série deixa claro desde o início que outras pessoas desapareceram ao longo dos anos, como é o caso de Tong, uma amiga de Lily que frequentava a casa deles, e é irmã do amigo de June e filha da diretora da escola.
Quando tudo está aparentemente bem, a série entrega mais uma grande revelação: Lily descobre um porão que fica no estábulo de sua casa. Ao entrar no local, ela se depara com um forte odor e se choca ao encontrar vários corpos em decomposição. Um deles é o de Tong, cuja cena faz paralelo ao momento em que June descobre que ela é amiga da família, como mostra a foto.
Ao ouvir passos, Lily se esconde, enquanto assiste Too usar o celular pare deletar os corpos, como ele havia prometido ao pai que daria um jeito nesta situação. Mas ao detectar um barulho, Too vai em direção ao esconderijo da Lily e, assim, a temporada é finalizada com este grande gancho.
A série deixa alguns pontos importantes a serem respondidos em uma futura 2ª temporada: por que há corpos escondidos na casa de Lily e Too? Por que Too apagou esses cadáveres? Quem matou Tong e por quê? Quem são as outras vítimas? O pai de Too é o verdadeiro responsável por estas mortes misteriosas? Com o Too encarregado de deletar as últimas vítimas, será que Lily teria a coragem de deletá-lo para trazer Aim, o policial, a esposa e demais vítimas de volta? Será que Orn pode se tornar uma vilã na nova temporada?
Delete é uma série tailandesa que apresenta uma história completamente envolvida em uma atmosfera de suspense, misturando drama e ficção científica, enquanto o terror fica por conta das ações que provocam e expõem a natureza humana e moralidade, revelando um lado perverso e desesperador do ser humano.
É uma série que exige um pouco de paciência no início, mas que se torna gratificante em seu resultado final.
Ficha Técnica
Delete
Direção e roteiro: Oh-Parkpoom Wongpoom
Elenco: Sarika Sartsilpsupa, Natara Nopparatayapon, Nat Kitcharit, Chutimon Chuengcharoensukying, Nopachai Chaiyanam, Jinjett Wattanasin e Charlette Wasita Hermenau.
Duração: 1ª temporada (8 episódios de 45 min.)
Nota: 3,9/5,0