Acredito que a palavra que melhor define Mulheres Alteradas é identificação. O filme dirigido por Luís Pinheiro é um ótimo e verdadeiro retrato dos anseios, medos e responsabilidades da mulher moderna. É quase impossível você (especialmente se for mulher) não se enxergar em alguma das situações vividas pelas quatro protagonistas.
Em resumo, Mulheres Alteradas é uma adaptação dos quadrinhos da argentina Maitena que acompanha a vida de Keka (Deborah Secco) que enfrenta uma crise no casamento; a rotina em alta pressão de Marinati (Alessandra Negrini), uma workaholic que só se importa com o trabalho, mas é surpreendida por uma arrebatadora paixão; a insegurança de Leandra (Maria Casadevall), uma mulher que no auge dos 30 anos mergulha em uma neurose por não ter constituído uma família ainda; e a rotina mega exaustiva de Sônia (Mônica Iozzi), cansada dos afazeres domésticos e maternais e com saudade da liberdade da vida de solteira.
No geral, o longa discute os questionamentos comuns que povoa a mente feminina em diferentes fases da vida em uma narrativa inteligente e bem estruturada, dividida em quadros em que o espectador acompanha o arco de cada personagem, passando para as tramas em dupla para, finalmente, conectar todas as histórias. Quer dizer, quase todas.
Outro ponto positivo é que Mulheres Alteradas convida o público a entrar na mente das personagens para entender detalhadamente cada sentimento, ação, reação, anseio, medo, riscos e felicidade. Essa técnica fica nítida quando a câmera fecha o close no rosto da personagem para ampliar ainda mais suas expressões e enfatizar os sentimentos. As cenas em que Marinati se sente empoderada no trabalho, no instante em que ela se apaixona e, até mesmo, quando ela tem um orgasmo, são ótimos exemplos. Não dá para negar que essas cenas são caricatas e fantasiosas, mas se você parar para pensar é mais ou menos isso que a gente (mulheres) sente internamente. A diferença é que não há público para nos observar ‘por dentro’, a não ser que você demonstre.
O filme traz uma visão imagética de quatro perfis femininos estereotipados e que têm muito a dizer, fazendo a identificação com a história ser espontânea. Das quatro, a interpretação de Alessandra Negrini é a minha favorita. Ela traz uma Marinati que representa explicitamente a mulher do século XXI, que prioriza a carreira, independência e o crescimento pessoal. Ela respira trabalho dia e noite e arranja tempo para os deveres essenciais da casa. Namorados? Relacionamentos? Comprometimento? Tudo isso está fora de cogitação. Mas no instante que seu coração a engana e a paixão atinge com força, Marinati enxerga tudo cor-de-rosa, sem se importar com os defeitos do parceiro e ainda coloca freios no trabalho, quebrando completamente o seu lado racional. O mais legal é que o filme faz uma metáfora da vida da personagem com a reforma da casa. À medida que todas as paredes são quebradas e a casa é dominada por cimento, martelo e muito barulho, significa que a vida da personagem torna-se um caos em todas as áreas, seja no amor ou no trabalho.
Keka é uma mulher que preza o trabalho, mas também o casamento e a família, o que deixa a sua vida um pouco conturbada por achar que não dá conta de atender todas as demandas. Enquanto ela tenta tirar alguns dias de folga do trabalho e dos filhos com o objetivo de reacender a chama da relação, o marido Dudu não colaborada em nada e ainda reclama e acha defeito em tudo e todos, fazendo o tesão da relação ir por água abaixo. As cenas de Deborah Secco e Sérgio Guizé fazem o público rir de nervoso, uma vez que a gente torce loucamente pela libertação de Keka de uma vida chata e claustrofóbica.
Leandra e Sônia são irmãs e o arco em dupla funciona super bem no filme, uma vez que ambas apresentam personalidades e estilos de vida bem contraditórios. Enquanto Leandra entra em um looping de anseio e receios por levar uma vida despretensiosa, sem tanta responsabilidade e, muito menos, sem ainda ter constituído uma família no auge dos seus quase 30 anos, Sônia é casada, mãe e tenta encontrar um jeito de fugir da rotina puxada em que o seu mundo gira em torno de fraldas, deveres da casa e inúmeras noites sem dormir. De um lado você tem a mulher independente, mas insegura por não ter uma estabilidade familiar; por outro, você tem a mulher que constituiu a família, mas grita por um pouco de liberdade, a fim de pensar e cuidar de si própria. Até as características das personagens destacam isso. Leandra é despojada e estilosa; Sônia nem se quer tem tempo para pentear o cabelo e compreendemos o seu pedido de socorro. Isso não quer dizer que ela não gosta da vida que leva, pelo contrário, ela ama o marido e os filhos, mas ela também se ama e precisa de um tempo somente para ela. Entendem o que eu quero dizer? Quando vocês assistirem vão captar melhor a mensagem.
Considerações finais
Mulheres Alteradas é um escaneio da mente feminina, retratando pontos principais das fases da vida da mulher, desde a jovem louca por baladas até a mulher que cuida da casa, se dedica de corpo e alma ao trabalho e ama seus filhos. É um filme que não só faz a gente refletir e se identificar, como também se divertir. Vale a pena conferir essa história.
Ficha Técnica
Mulheres Alteradas
Direção: Luís Pinheiro
Elenco: Alessandra Negrini, Deborah Secco, Mônica Iozzi, Maria Casadevall, Sergio Guizé, Daniel Boaventura, Stepan Nercessian, Suely Franco, Augusto Madeira, João Vicente, Patrycia Travassos e Carol Melgaço.
Duração: 1h35min
Nota: 8,0