Confissões de uma Garota Excluída é a nova produção brasileira da Netflix que traz uma história fofa e um pouco brega que surte um efeito positivo no espectador ao falar sobre bullying, autoaceitação e outras questões da adolescência, uma fase em que as situações cotidianas oscilam e impactam variavelmente por conta dos sentimentos aflorados.
É uma trama que traz com leveza lições tanto para o público jovem quanto adulto em um roteiro divertido e adaptado da obra Confissões de Uma Garota Excluída, Mal Amada e (Um Pouco) Dramática de Thalita Rebouças com personagens carismáticos e cativantes, enquanto outros chamam a atenção por sua personalidade difícil, mas que absorve a mensagem principal mostrando uma transformação positiva. Apesar de certas cenas um pouco forçadas e algumas decisões convenientes, a história é agradável, divertida e emocionante na medida certa.
Com direção de Bruno Garotti, Confissões de uma Garota Excluída conta a história de Teanira, conhecida por Tetê (Klara Castanho), uma garota sem amigos, solitária e reclusa por não se sentir aceita na escola e em casa, por conta da sua personalidade introvertida e aparência.
Quando seus pais, desempregados, precisam se mudar da Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro, para a casa dos avós em Copacabana, a adolescente é obrigada a recomeçar em outro colégio. Agora, Tetê vai tentar de tudo para não sofrer bullying novamente e, quem sabe, fazer amigos e ter uma vida social. No entanto, as populares Valentina e Laís não vão facilitar, mas os igualmente excluídos Davi e Zeca podem se tornar aliados de Tetê, inclusive, ajudar a abrir o caminho para os crushes.
Confissões de uma Garota Excluída traz uma narrativa visualmente agradável que interage com o espectador à medida que acompanhamos o dia a dia da protagonista, como ela lida com as preocupações cotidianas que se tornam gigantes em sua mente fértil, enquanto trabalha sua personalidade e a forma como as pessoas a enxergam e podem lhe aceitar (ou não) como é de verdade.
Conforme Tetê conhece os novos colegas de classe, o filme faz questão de mostrar visualmente a personagem interagindo nas redes sociais para saber quem é quem na escola, quem tem chances de se tornar seu amigo ou amiga, qual pessoa é menos apto para a amizade e as relações entre eles para não cometer nenhuma gafe ou um mal entendido. Isso torna o ritmo do filme mais dinâmico e as cenas mais interessantes de acompanhar sem tornar a narrativa cansativa ou entediante.
Obviamente o elemento principal que constrói toda a história de Confissões de uma Garota Excluída é a protagonista que ganha uma interpretação doce, inocente e espontânea da atriz Klara Castanho. Tetê aflora qualquer situação por conta da sua imaginação fértil, ações e reações extremamente dramáticas, revelando o medo e a insegurança de mostrar quem ela é por conta do julgamento alheio, ao mesmo tempo que demostra desejo em revelar uma personalidade que a torna única e formidável, sem precisar mudar a sua essência apenas para agradar aqueles que estão a sua volta.
Para exemplificar, o filme entrega cenas engraçadas em que a protagonista se encontra em situações em que imagina dizendo ou fazendo algo que ela jamais diria ou faria, mostrando o seu subconsciente construindo um desejo seu que pudesse se tornar realidade. Em outras palavras, é o famoso “pensar alto”, em que, às vezes, dizemos o que pensamos sem perceber. Isso é ilustrado nas cenas em que Tetê conhece e nutre uma paixonite por Erick, o garoto bonito e popular da escola, em que ela imagina diálogos e situações românticas ao lado do crush. Quem nunca passou por esse tipo de situação na adolescência, não é mesmo?
Enquanto o filme constrói tais momentos divertidos, a narrativa abraça assuntos pertinentes como o bullying e a autoaceitação que sofrem vertentes mais fortes dentro da adolescência, deixando tudo muito nítido e dramático na forma como são vistos e absorvidos por quem sofre tais ataques. Aqui, vemos como Tetê sofre tal constante em seu cotidiano, seja nos comentários feitos pela avó e a mãe, que alimentam o bullying indiretamente a fim de fazer a personagem se abrir mais ao mundo, adquirir novas experiências sem levar em consideração os seus sentimentos e quem ela é, o que faz Tetê questionar se sua personalidade e aparência são suficientes para si e para os outros, aumentando mais a sua dor e os conflitos internos.
Apesar das cenas entre mãe e filha e avós e neta terem um fundo cômico e diálogos irônicos, tal sinceridade aguda aponta para o emocional machucado da protagonista que bate de frente com os ataques sorrateiros e indiretos da família, que acreditam fazer o bem para Tetê. A química dos atores é ótima, com destaque para Júlia Rabello, Rosane Gofman e Stepan Nercessian. No entanto, a empatia maior com as dores da filha parte do pai (Alcemar Vieira), um ponto que o filme poderia ter desenvolvido melhor na relação dos dois para fortalecer tal apoio e carinho.
Além do ambiente familiar, o bullying também ganha força no cenário escolar, onde a aceitação se torna um grande desafio para a protagonista que constantemente se vê numa atmosfera de insegurança cuja bolha é estourada com os ataques de Valentina e, que usa da popularidade para diminuir os outros. Interpretada por Júlia Gomes, a personagem traz uma personalidade esnobe e antipática que faz os outros terem desprezo e medo de bater de frente, ao invés de afeto e carinho por Valentina, alimentando sua ousadia negativa e a audácia para falar e fazer o que bem entender. Ela tem a cumplicidade de Laís (Fernanda Concon) que, no fundo, não concorda com as atitudes da amiga e carrega um segredo que traz a reviravolta da trama.
Para ajudar a lidar com esses problemas e a controlar o seu lado dramático, Tetê faz amizades formidáveis na escola que a ajudam na transformação, no crescimento e amadurecimento sem mudar a sua verdadeira essência. De um lado, temos Davi (Gabriel Lima), um jovem romântico e nerd que também se abre ao mundo ao iniciar a amizade com Tetê. Ele tem um vínculo muito forte com os avós que faz o espectador entender a sua personalidade doce e disposição para conhecer os outros.
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Do outro lado temos Zeca (Marcus Bessa), o mais espontâneo deste trio com uma personalidade forte, honesta e extrovertida que traz representatividade à comunidade LGBTQIA+ em que o filme debate certos conflitos deste personagem com relação sobre sua identidade aos amigos e ao mundo. Ele ajuda na transformação de Tetê e na forma ela se enxerga, trazendo o equilíbrio perfeito em que os três ajudam, evoluem juntos e gradativamente na história.
Claro que os crushes não poderiam faltar e o filme faz questão de divertir o público com as situações engraçadas e sentimentais em que Tetê que se dividida entre Erick (Lucca Picon) e Dudu (Caio Cabral), irmão de Davi. Claro que certos contratempos, atitudes, pensamentos e opiniões de cada um vão ajudar a protagonista a enxergar a razão para nutrir tal sentimento por ambos a fim de que faça a escolha certa sem abalar sua autoestima, colocando-se em primeiro lugar.
Considerações finais
O terceiro ato do filme ganha uma atmosfera de investigação cômica por conta do mistério que envolve um vídeo flagrante, trazendo à tona as verdades por trás de cada personagem, suas intenções e a razão para alimentar tais maldades e conflitos que machucam.
O filme traz um desfecho em que as intenções sobre a mensagem desta história são boas, porém certas decisões acabam soando forçadas e um pouco fora da realidade a fim de trazer um final feliz para todos. Mesmo assim, isso não diminui a trama construída e as lições aprendidas pelos personagens e transmitidas ao público.
Confissões de uma Garota Excluída é um acerto doce da Netflix ao trazer uma adaptação ilustre da obra Thalita Rebouças para a tela, apresentando uma história leve sobre bullying e autoaceitação que encoraja a conversar sobre tais questões com o público jovem, além de trazer boas lições para os adultos também.
Ficha Técnica
Confissões de uma Garota Excluída
Adaptação da obra de Thalita Rebouças
Direção: Bruno Garotti
Elenco: Klara Castanho, Júlia Gomes, Fernanda Concon, Marcus Bessa, Gabriel Lima, Lucca Picon, Cario Cabral, Kiria Malheiros, Júlia Rabelo, Rosane Gofman, Stepan Nercessian e Alcemar Vieira.
Duração: 1h31min
Nota: 7,0